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Opinião
Sexta - 30 de Abril de 2010 às 10:59
Por: Eduardo Pocetti

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Ao decidir elevar a taxa de juros em XXXX%, o Banco Central respondeu à crescente preocupação com o possível desencadeamento de uma onda inflacionária, que poderia colocar em xeque o projeto nacional de ter um crescimento econômico sustentável.

Em nome dessa preocupação, aliás, vale a pena retroceder um pouco e relembrar como, em 1998, o Brasil decidiu fixar metas de inflação. Em um primeiro momento, os índices estabelecidos foram de 8%, 6% e 4%, para os anos de 1999, 2000 e 2001, respectivamente. Admitia-se, nos três casos, uma variação de 2% para mais ou para menos.

Ao optar pela fixação de metas, o Brasil estava seguindo o exemplo de economias maduras como Canadá, Inglaterra, Nova Zelândia e Suécia. Na época, ficou acordado que o guardião das metas seria o Banco Central.

Cabe ressaltar que a política de fixação de metas é um regime bastante sofisticado, que exige grande disciplina por parte dos agentes econômicos. Sob esse sistema, todos têm um papel a desempenhar – se, por exemplo, os fornecedores de insumo sobem demais os preços dos seus produtos, eles comprometem o desempenho da indústria, que terá de repassar o aumento de custo para o varejo, e este, por sua vez, terá que onerar o consumidor final. Ao fim do processo, as metas pré-estabelecidas ficam seriamente comprometidas.

O exemplo acima é simples e até superficial, mas ilustra bem o fato de que toda a sociedade tem que estar disposta a arcar com sua parcela de responsabilidade na manutenção da estabilidade econômica. Isso inclui os trabalhadores, que, se passarem a forçar demais as negociações salariais de suas respectivas categorias, acabarão por se tornar, eles também, agentes desencadeadores de instabilidade.

O sistema de metas de inflação impõe, portanto, um autocontrole de todos segmentos da sociedade brasileira, no sentido de formar uma convergência que coloque em primeiro plano a preservação do bem maior. Trata-se de uma espécie de compromisso ético, necessário a um objetivo maior.

Tentar privilegiar os interesses de um grupo em detrimento dos demais redunda em um tiro no pé. Afinal, como bem se lembra quem viveu no Brasil da inflação galopante dos anos 70 e 80, não há nada de positivo quando se vive sob a ponta da espada da desvalorização da moeda e perda do poder de compra.

Claro que é muito mais fácil teorizar sobre todas estas questões do que adotar, de fato, as práticas ideais. Internalizar, e sobretudo, agir conforme o conceito de que cabe a cada indivíduo e a cada grupo realizar eventuais sacrifícios em nome do bem comum, são atitudes que requerem extrema sofisticação. É um enorme desafio disseminar tais princípios em um país onde, a despeito dos avanços das últimas décadas, ainda vicejam a sonegação de impostos, a corrupção e a crença na tal Lei de Gerson (“o que importa é levar vantagem, certo?”).

Deve-se salientar que o regime de metas baseia-se em credibilidade, algo que, nos últimos anos, o Brasil vem ganhando cada vez mais, dentro e fora do País. Se começarmos, justamente agora, a perder o controle sobre diretrizes autoimpostas, estaremos maculando de forma desnecessária a imagem positiva construída com grande esforço. Por isso, em nome da estabilidade, o Banco Central tem sido muitas vezes obrigado a lançar mão de aumento da taxa Selic, o que gera muito descontentamento em parcelas importantes do setor produtivo, mas é o tipo de remédio amargo do qual não se pode abrir mão. E é provável que o uso desse elixir nada palatável continue sendo necessárias enquanto não forem realizadas as tão propaladas (e adiadas) reformas tributária, previdenciária e trabalhista, que se tornam cada vez mais urgentes e imprescindíveis para a construção do nosso futuro.

 
* Eduardo Pocetti é CEO da BDO, uma das cinco maiores empresas do mundo em auditoria, tax e advisory services.



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