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Opinião
Sexta - 22 de Janeiro de 2010 às 02:37
Por: Lourembergue Alves

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Não é a primeira vez que um político tem sua trajetória transformada em filme. Nem será a única. Pois o cinema pode ajudar a fortalecer o mito e consolidar o herói. A despeito das críticas que, de certo modo, foram bastante condescendentes. Não foram duras quanto deveriam ser, pois o dito filme extrapola o seu limite de entretenimento para imortalizar o personagem-político, em pleno final de mandato presidencial. 

Foi feito por Lula da Silva exatamente aquilo que Fernando Henrique Cardoso quis fazer por ele próprio em “A arte da política”. As duas obras supervalorizam as ações de cada um deles. Bem mais feliz, no entanto, foi o primeiro. Isso porque o cinema atinge um público maior que o do livro, sobretudo em um país como o Brasil, onde a leitura da palavra escrita continua sendo tarefa de uma parcela pequenina da população.

Baseado em uma tese de doutorado, também transformada em livro, o filme conta a vida do ex-metalúrgico, desde o seu nascimento até a sua ascensão a presidência do sindicato. Vista de um ângulo onde a fantasia se mistura com a utopia. Pior ainda, subestima-se a capacidade de reflexão do telespectador, quando procura vender a imagem de alguém dotado de extrema sensibilidade, comprometido e muito com que faz e dono de uma inteligência rara. Três cenas resumem, e bem, isso, a saber: a da menina morta durante a viagem de “pau-de-arara”, somada a de um trabalhador assassinado por ocasião de uma greve, a que retrata a perda de um dos dedos da mão esquerda do herói e a conversa sobre o garoto prodígio entre a mãe e a professora. Até mesmo o “tu vai se chamar Inácio Luiz da Silva”, em situação anterior, dito pela mãe ao segurá-lo ainda bebê deixa transparecer algo sobrenatural, encantador, surrealista. Talvez, por isso, o filme trata de desaparecer com os seus irmãos, deixando-os a um plano além do secundário. A ponto, por exemplo, de todas as atenções maternas se voltarem tão somente para o filho especial que, com menos de oito anos, se postara a sua frente, a defendê-la contra as ameaças do pai, completamente embriagado e dominado pela ira.
 Cada cenário mostrado é de uma grandeza extraordinária. Razão, certamente, pela qual as filmagens tenham custado tão caro. Acima dos padrões do cinema da terra. Por isso contou com a ajuda financeira de um grupo de empresas bastante ligada ao governo, e que ganha muitíssimo com tamanha ligação. 

Uma pena, no entanto, que os atores principais, os que fizeram os papéis da mãe e o do próprio Lula adulto tenham tido desempenhos pífios, que são uma constante quase permanente nas carreiras desses artistas. O filme só não foi um desastre total porque contou com passagens das manifestações dos trabalhadores, que fazem parte do passado do atual presidente. Porém, tais passagens surgem desconectadas, fora dos momentos ideais. Falhou, portanto, o seu diretor. Assim como também pecou quando trocou a bebida preferida do “biografado”, a cachaça pela cerveja.

Apesar disso, valeu à pena ter assistido a esse filme em função da casa de espetáculo. Cine Odeon, erguido no coração na Cinelândia, no Rio. Diante de tantos cinemas desaparecidos, essa casa continua ali, firme, a desafiar os obstáculos, oriundos de uma modernidade que tenta enjaular um montão de coisas em um único local.

No mais, é preciso dizer, o referido filme se encontra entre os piores já produzidos no país. Muitíssimo distante de O Quatrilho, também dirigido por Fábio Barreto, e igualando-se 2 Filhos de Francisco, dirigido por Breno Silveira. Isso em termos de qualidade, se é que se pode encontrar qualidade alguma nesses dois filmes.

Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br


Autor

Lourembergue Alves

LOUREMBERGUE ALVES é professor universitário e articulista

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