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Opinião
Quinta - 17 de Abril de 2014 às 10:01
Por: Roberto Boaventura

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Enfim, uma polêmica! E não se trata de saber se carne tem nome ou não! Digo isso porque, há algum tempo, estamos assistindo à “briga” entre duas empresas do setor alimentício. Para sustentar a estúpida polêmica, recursos milionários estão sendo canalizados a um famoso cantor – aliás, vegetariano – e a alguns atores renomadíssimos. 

Então, qual é a polêmica de verdade, que não deveria sair rapidamente das rodas e redes de debate?

Saber se a Popozuda é ou não uma “grande pensadora” da contemporaneidade, como foi dito em uma questão de prova de Filosofia. Isso ocorreu em Brasília há alguns dias; e não era brincadeira, como o professor quis fazer crer quando viu o merecido estardalhaço que a mídia fez em torno disso. 

Nesse sentido, eventuais dúvidas ficam dirimidas por meio da entrevista do professor à Folha de São Paulo (09/04/2014; C3). Ali, lançando mão do discurso de autoridade, ele reforçou o que havia dito na prova, ao afirmar que, “De acordo com os filósofos contemporâneos franceses, todo aquele que consegue construir conceitos é um filósofo, é um pensador. Se a Valesca constrói conceitos com a sua música, não tem por que ela não ser uma pensadora”.

Na verdade, quando o professor expõe essa ridícula justificativa, ele está se ancorando no arcabouço didático-metodológico-conceitual que sustenta a pós-modernidade e o construtivismo. Em minha opinião, opções desastrosas à qualidade do ensino formal. 

Mas para exemplificar esse arcabouço teórico, recorro à educadora Tolchinski. Ela, em seu livro Construtivismo em educação: consensos e disjuntivas, ao criticar a corrente filosófica do Iluminismo, pela sua tentativa de aproximar o conhecimento do cotidiano, declara-se pós-moderna da seguinte maneira: 

“Nós pós-modernos, estamos nos perguntando se a solução não deveria ser o contrário: aproximar os filósofos do ponto em que está a sabedoria popular. No caso de comunidades multiculturais, incluindo a privação cultural como um caso específico de diferença cultural, a proposta é incorporar a escola à sabedoria popular”.

Foi o que tentou fazer o professor, questionando o seguinte a seus alunos: 

“Segundo a grande pensadora Walesca (sic.) Popozuda, se bater de frente...”. 

Como a prova era de “marcar com um ‘X”, o aluno tinha de escolher a letra “A”: 

“É só tiro, porrada e bomba”.

Bomba é esse tipo de pensamento predominando em nossa educação. Bomba é um professor submeter seus alunos a esse tipo de situação. Bomba é a agressão que os pós-modernos/construtivistas fazem com toda a elaboração intelectual dos grandes pensadores da humanidade, como Heráclito de Éfeso, Aristóteles, Hegel, Marx, Engels...

"Vou ali ler um Machado de Assis e ir treinando pra quem sabe um dia conseguir ser uma pensadora de elite!"

Mas o infortúnio do professor não parou por aí. Na mesma matéria jornalística, há a reprodução do que a própria cantora postou na rede sobre sua nova condição de “grande pensadora”: 

“...Isso eu vou ter que recusar porque é um título muito forte... mas prometo que vou trabalhar isso... Vou ali ler um Machado de Assis e ir treinando pra quem sabe um dia conseguir ser uma pensadora de elite!”

Virei fã de Popozuda!

De forma honesta, ela, à lá Sócrates – “só sei que nada sei” – tem a plena consciência de seu lugar e de seu papel na sociedade: “Diva, diva sambista, lacradora...”, mas nunca uma “grande pensadora”. 

Com esse depoimento, ela ensina o professor/filósofo – atolado nas tolices conceituais e metodológicas da pós-modernidade e do construtivismo – a não mais confundir grande pensador com uma artista popular, que – em seu caso – sempre beira o chulo, o banal.



Autor

Roberto Boaventura

ROBERTO BOAVENTURA  é doutor em jornalismo e professor de Literatura da  UFMT

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