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Opinião
Sábado - 07 de Março de 2015 às 09:14
Por: Luiz Henrique Lima

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Se o amigo leitor atrasar o pagamento de uma conta de luz ou água ou de uma prestação de um eletrodoméstico, com certeza vai ter prejuízo e dor de cabeça.

Na melhor hipótese, pagará multa e juros pelo atraso. Na média, viverá uma experiência purgatória, até ver seu nome reabilitado. Na pior, é bom nem falar.

Situação semelhante ocorre com estados e municípios. Se atrasarem o pagamento de um empréstimo ou a contrapartida de um convênio, ficam proibidos de receber novas transferências voluntárias, entre outras sanções.

O governo federal, no entanto, coloca-se acima do bem e do mal. Veja-se o caso da Lei Kandir. Criada em 1996, essa lei isentou de ICMS - imposto de competência estadual - os produtos destinados à exportação. "Os municípios também perderam receita, pois recebem 25% do ICMS arrecadado. O objetivo era nobre: melhorar as contas nacionais e a competitividade dos produtos brasileiros. "

Os municípios também perderam receita, pois recebem 25% do ICMS arrecadado. O objetivo era nobre: melhorar as contas nacionais e a competitividade dos produtos brasileiros.

A título de compensação, criou-se uma regra mediante a qual a União repassaria a estados e municípios valores fixados no seu orçamento, distribuídos conforme determinados coeficientes. Desde logo, observamos vários problemas.

Primeiro: o valor da compensação sempre foi ínfimo diante da renúncia fiscal imposta.

Segundo: os coeficientes de distribuição são fixos desde 2003, desconsiderando a dinâmica de desenvolvimento regional e as alterações estruturais na economia brasileira. Terceiro: o governo federal não honra sua obrigação legal, atrasando repasses.

Com isso, os objetivos da lei são subvertidos, fazendo com que os estados que mais contribuem para a saúde do comércio exterior sejam os maiores prejudicados.

Em 2014, a balança comercial do Brasil foi negativa em US$ 4 bilhões e a de Mato Grosso foi positiva em US$ 13 bilhões.

Se não fosse MT, o déficit no comércio exterior brasileiro teria quadruplicado. Anote-se que em 2000, o superávit comercial de MT era inferior a US$ 1 bilhão, ou seja, cresceu mais de 13 vezes.

entanto, Santa Catarina teve um déficit de US$ 7 bilhões sem 2014, mas recebeu repasse da Lei Kandir 87% superior a MT. O déficit de São Paulo foi de US$ 33 bilhões e o estado recebeu mais de 15 vezes o montante de MT.

Entre 2010 e 2013, as exportações de MT cresceram 87% em dólares, a inflação (IPCA) cresceu 24,16%, mas o repasse da Lei Kandir não aumentou um centavo.

Pior: o repasse de março de 2014 foi pago somente em dezembro, sem nenhuma correção. Em 2013, o pagamento só começou em abril. Em 2015, até março o governo federal não repassou nada.

Reconhecendo as distorções da Lei Kandir, a partir de 2004 a União improvisou uma gambiarra orçamentária, denominada auxílio financeiro para fomento às exportações - FEX, instituído por medidas provisórias anuais e que dependem, para sua efetivação, de inclusão de dotações nas leis orçamentárias anuais.

No caso do FEX, os valores são maiores que os da Lei Kandir, mas sua incerteza também. Os valores de 2012 foram pagos somente em novembro, os de 2013 apenas em 2014, e os de 2014 até agora nada.

Soberba, a União entende que o FEX é uma transferência discricionária e que pode ou não acontecer, quando, como e no valor que lhe for conveniente.

Sem compreender o espírito da Federação que caracteriza nossa República, comporta-se como se governadores e prefeitos fossem vassalos da presidência, diante da qual devem implorar trocados, de pires na mão.

Mesmo que a alíquota do ICMS sobre exportações fosse de apenas 1%, MT recolheria em 2014 R$ 372 milhões a mais que a soma dos repasses do FEX e da lei Kandir!

Em 2003, a Emenda 42 constitucionalizou a desoneração das exportações e previu a edição de uma lei complementar que estabelecesse critérios para repasses compensatórios da União para os estados. Doze anos depois, nunca mais se ouviu falar dessa lei!

O início de nova legislatura no Congresso e de mandatos da presidente e dos governadores é ocasião bem oportuna para essas autoridades se entenderem e fixarem uma regra permanente para o tema.

O calote federal não é justo, republicano ou democrático.

LUIZ HENRIQUE LIMA é conselheiro substituto do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT).



Autor

Luiz Henrique Lima

LUIZ HENRIQUE LIMA é conselheiro substituto do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT)

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