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Opinião
Sexta - 25 de Janeiro de 2019 às 21:08
Por: Vilson Pedro Nery

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Entre os diversos episódios envolvendo a República do Brasil, e que ocorreram durante a última semana, chama a atenção a resposta de uma autoridade política dada a um repórter, quando respondeu que “isso não é da sua conta”, referindo-se a um tema que o inquirido possui desconforto em tratar, e é obrigação jornalística do repórter elaborar a pergunta.

Outros dois casos assombrosos se referem à transparência das ações públicas, da Lei de Acesso à Informação, e da lista de pessoas públicas que podem ser monitoradas preventivamente contra corrupção, desvios de recursos financeiros e lavagem de dinheiro.

Com relação ao primeiro caso, a relação dos governantes com a imprensa, sabe-se que existe a liberdade de imprensa e a “liberdade de empresa”, e que para grande parte das corporações de mídia, este último conceito geralmente prevalece. No entanto, o direito à informação possui vários aspectos. Há a liberdade de comunicação atribuída ao professor, ao jornalista, ao usuário dos serviços públicos, e também a liberdade do cidadão de saber o que ocorre com as pessoas públicas, cujas ações geram efeitos refletidos em toda a população.

Neste particular, a liberdade de comunicação ou a liberdade de imprensa é um direito que merece amplitude e independência, não devendo a autoridade pública de qualquer esfera opor resistência. A pluralidade dos meios de difusão de informações, e de opiniões, é alimento para a Democracia e representa progresso intelectual dos cidadãos.

Mas tudo isso, a ampla liberdade de informação e a possibilidade de múltiplas fontes privadas e estatais está em sob ameaça, com a limitação de alcance da Lei de Acesso à Informação e a modificação da norma que obriga o monitoramento da evolução patrimonial de parentes de pessoas politicamente expostas.

A Lei nº 12.527/2011 trata do acesso às informações sobre as ações dos agentes públicos, decorre do princípio de que “todo poder emana do povo”, e no âmbito federal foi regulado pelo Decreto nº 7724/2012. Ocorre que no último dia 24 de janeiro de 2019 seu texto foi drasticamente alterado pelo Decreto nº 9690/2019.

A Lei prevê três tipos de sigilo: reservado, quando a informação fica protegida por 5 anos. Secreto, assim mantido por 15 anos, e ultrassecreto, quando o sigilo dura 25 anos. Somente as autoridades máximas poderiam impor esse “segredo”.

Todavia, com as novas modificações, a partir de agora é permitida a delegação da competência de classificação no grau ultrassecreto, autorizando os ocupantes de cargos em comissão a impor o sigilo a documentos e informações governamentais. Trocando em miúdos, um ocupante de cargo comissionado ganha uma “boquinha” no governo e o poder de vetar o acesso da população aos fatos e documentos produzidos nas entranhas da Administração.

A outra ameaça, com nítido propósito de lançar sombras aos negócios públicos, vem do Banco Central, que acolhe sugestão do Ministro da Justiça e retira a obrigatoriedade de monitoramento da movimentações financeiras de parentes de políticos. O BC publicou o Edital de Consulta Pública nº 70/2019, de 17 de janeiro de 2019, e o novo texto modifica o conceito de pessoa exposta politicamente exposta, excluindo deste controle prévio as pessoas próximos do agente político.

No ano de 2006 o ENCCLA (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro) criou o conceito de “pessoas politicamente expostas” que seriam os agentes públicos que desempenham ou tenham desempenhado cargos, empregos ou funções públicas relevantes, assim como seus representantes, familiares e outras pessoas de seu relacionamento próximo.

A modificação feita pelo Banco Central a pedido do MJ afasta o controle das movimentações bancárias sobre magistrados e militares, bem como de seus parentes, de modo que fica desobrigado o sistema bancário de prevenir delitos financeiros de algumas categorias, e dos parentes de agentes públicos. Em relação ao Decreto que “derrete” a Lei de Acesso à Informação, já existem interessados em discutir judicialmente o seu teor, e a consulta do Banco Central para diminuir o cerco a parentes de políticos ainda segue a todo vapor no site da entidade.

Sob essas novas regras não seria possível deflagrar a Operação Lavajato, seria impedida a descoberta de que o filho do vice-presidente conseguiu triplicar seu salário, e não seria divulgada a informação de que o filho do presidente movimentou vultuosas quantias de dinheiro de forma considerada “atípica”.

Vilson Pedro Nery, advogado Especialista em Direito Público.



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