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Opinião
Sexta - 11 de Outubro de 2019 às 08:43
Por: Leda Alves

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Em setembro de 2019, Elton Fernandes de 32 anos, sofreu choque anafilático e faleceu antes mesmo da chegada do SAMU. Elton era garçom, trabalhava em um evento na cidade de Belo Horizonte e mesmo sabendo ser alérgico a camarão, resolveu arriscar e sua história acabou ali, após ingerir o alimento ao qual era alérgico.

Em junho de 2017, Karanbir Singh Cheema de 13 anos, alérgico a proteína do leite de vaca, sofreu perseguição de um colega na escola, que segurava um pedaço de queijo na mão, que acabou atirando em Karanbir, acertando-lhe o pescoço. Isto foi suficiente, para que, em menos de 10 minutos, o garoto ficasse inconsciente, vindo a ter um choque anafilático causado pelo contato do alimento ao qual era alérgico com sua pele. Karanbir foi socorrido e levado ao hospital, onde morreu 10 dias após o ocorrido na escola. Ali outra história foi interrompida, não pela ingestão, mas pelo simples contato do alergênico com a pele do alérgico.

Outras histórias como essas podem ser evitadas se mais informações sobre a gravidade de uma alergia alimentar forem disseminadas e/ou propagadas.

O garçom Elton sabia de sua condição alérgica, porém, talvez se as outras pessoas ao seu redor também soubessem quão grave pode ser uma alergia alimentar, poderiam tê-lo dissuadido de comer aquela comida que lhe enchia os olhos, mas que não lhe faria bem, oferecendo-lhe uma opção segura que lhe tirasse o foco daquilo que não podia.

Já no caso de Karanbir, o colega que lhe acertou com um pedaço de queijo, disse que não tinha conhecimento da gravidade da alergia, que pra ele queijo não era leite e que tudo não passou de uma brincadeira. Fato é que alergia alimentar não é brincadeira, e nesse caso a vida de um menino tido como “tão brilhante que ele poderia ter sido qualquer coisa que quisesse,” foi ceifada.

Foi justamente por me dar conta da total ausência de conhecimento sobre alergia alimentar, até mesmo por parte das famílias que têm um ou mais membros alérgicos, que decidi estudar e informar sobre o tema.

A alergia alimentar chegou na minha vida há 7 anos, com o nascimento do meu segundo filho, Joaquim, prematuro de 36 semanas. Até os 4 meses de vida foi muito sofrimento e idas a médicos e hospitais tentando encontrar respostas para tanto choro visivelmente de dor, diarreia constante e geralmente com sangue, refluxo com vômitos, crise respiratória, pele sempre grossa e empolada e sono agitado, isso quando dormia, pois chorava dia e noite, e quando conseguia dormir, eram no máximo duas horas seguidas, mas sem deixar de soluçar, gemer e se contorcer. Foi quando aos 4 meses veio o diagnóstico de alergia a proteína do leite de vaca – APLV. Até este momento eu nunca ouvira o termo. Tivemos então que retirar o leite em pó que ele tomava como complemento, que havia sido introduzido ainda na maternidade por orientação do pediatra, eu tive que fazer a dieta de restrição total de leite e derivados para amamentá-lo e mantê-lo exclusivamente no aleitamento materno até a introdução alimentar, que teve que começar precocemente.

O diagnóstico de uma alergia alimentar não é facilmente concluído e quando o temos, no meu caso que é o leite, ouvi do médico: “a partir de agora nada de leite e derivados.” Longe de ser só isso, pois por falta de informação, a mãe, e digo principalmente a mãe porque é ela que começa a dieta para amamentar o filho, que passa a não poder comer fora e terá que levar a própria marmita para as reuniões familiares, agora é olhada com olhares de reprovação e adjetivada de fresca, nojenta, metida, exagerada, louca e por aí vai. Ou seja, a desinformação é tamanha que associam as restrições alimentares a dietas da moda, quando na verdade, se trata de garantir a saúde e até a vida da criança ainda tão indefesa. A família então, passa a ser excluída das reuniões e não mais convidada para as festinhas com os amigos, isto porque, alguns pensam que se tornou chata e fitness depois da chegada do(a) filho(a) e outros podem até acreditar na alergia, mas pensam ser melhor não chamar, porque afinal, a mãe, a criança ou ambos não poderão comer nada do que será servido mesmo.

Enfim, em decorrência da restrição alimentar, que não tem nada de fácil, surgem problemas de ordem emocional e psicológico, atritos familiares que infelizmente, muitas vezes resultam em divórcio.

Em muitos casos, quando a alergia é diagnosticada precocemente, a dieta é bem orientada e a família é acompanhada por profissionais capacitados (o que é raro por falta de conhecimento sobre o assunto), a tolerância a proteína pode chegar cedo também, até os 5 anos de vida, porém, temos muitos casos de crianças mais velhas que continuam alérgicas, como meu filho de 7 anos, por exemplo. Com isso, o que temos vivido é que nossos filhos hoje sofrem a mesma exclusão que nós mães sofremos quando amamentávamos. Preciso enfatizar mais uma vez que isso ocorre não por maldade, mas por ausência de informação e conscientização.

Por precisarem levar seu lanche de casa para a escola e para as festinhas (quando são convidados), nossos filhos alérgicos ouvem comentários do tipo: “sua mãe é chata e não te deixa comer coisas gostosas né?” ou até mesmo os colegas dizem “minha mãe diz que isso é doença de gente rica.” Alguns, até de forma inocente dizem “tadinho (a) não pode comer nada? Só um pedacinho não faz mal.”

Verdade é que só um pedacinho faz muito mal sim e pode levar a morte.

Sabe o que nós, famílias com alergia alimentar, mais queremos? Lógico, que em primeiro lugar que a medicina nos traga respostas e cura. Em segundo lugar, que a sociedade se informe e se conscientize para não tornar nossas vidas ainda mais restritas do que já são por falta de informação.

Leda Alves

Mãe de alérgicos

Defensora da Conscientização da Alergia Alimentar



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