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Opinião
Quarta - 16 de Outubro de 2013 às 22:31
Por: Gabriel Novis Neves

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Vira e mexe uma decisão do poder público me faz lembrar a história do sofá do português. É tão antiga que todos conhecem - menos as novas gerações.

Talvez, por isso, a confusão em entender alguns dos últimos acontecimentos que escandalizaram a todos, por exemplo: a história interminável do mensalão e a compra das cadeiras de ouro para a Arena Pantanal, fora dos padrões de obrigações da própria FIFA.

A historieta é a seguinte:

“Dois amigos de Lisboa migraram para o Brasil com as suas respectivas famílias e se instalaram na cidade do Rio de Janeiro.

Um abriu uma banca de jornal e o outro uma padaria. Eram vizinhos de negócio.

Moravam próximos aos seus locais de trabalho e no mesmo edifício, para não perderem tempo com deslocamentos em uma cidade grande e, também, para fazerem economia no dinheiro das passagens.

O jornaleiro trabalhava na rua e o seu colega dentro do seu estabelecimento comercial.

Certa ocasião, depois de muito pensar, o jornaleiro resolveu revelar ao seu velho amigo que na sua ausência o garrafeiro - que era do grupo de migrantes - costumava visitar a sua esposa durante a sua prolongada ausência, que o trabalho na padaria exigia.

Este ouviu a triste história que indicava um caso de adultério e se calou, agradecendo civilizadamente.

Passado alguns meses o padeiro procura seu amigo jornaleiro para agradecer a informação, que tinha procedência, e dizer que havia resolvido o problema doméstico: - Compadre: joguei o sofá no lixo!”

Mais ou menos isso acaba de ser feito pela prefeitura de Cuiabá, com a aprovação da Câmara dos Vereadores.

Até as pedras cangas da igreja de São Benedito sabem que o maior problema que enfrentamos para cumprir com a Constituição Federal de 1988 com relação à saúde pública - que diz ser “Um Dever do Estado e Direito do Cidadão” - é a escassez de recursos financeiros repassados aos municípios.

Como estes são insuficientes, foi então aprovada a criação da Empresa Cuiabana de Saúde (ECS).

Essa estatal pública será “responsável pela execução dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que chegou próximo à perfeição, segundo um ex-presidente da República, cliente do hospital privado Sírio-Libanês (São Paulo)”.

A justificativa oficial é hilariante! Sua função será agilizar processos “geralmente lentos, como a compra de materiais, medicamentos, peças de reposição dos aparelhos tecnológicos, construção de novas unidades de saúde e a contratação de excelentes profissionais no regime CLT, não lhes oferecendo o mínimo de segurança para execução de um trabalho de qualidade”.

Pôncio Pilatos, ao lavar as mãos diante de um julgamento, demonstrou ser um iniciante aluno perante a esperteza das nossas autoridades.

Em nenhum momento a prefeitura demonstrou de onde virão os recursos financeiros para o sucesso da nova empresa, que terá que ser eficiente - sem dinheiro. Apenas promessas do governo federal, useiro e vezeiro em dar calotes e não cumprir com o prometido.

O cuiabano não tem motivos para ser mal humorado. As medidas adotadas pelo poder público são muito engraçadas, para não dizer, trágicas, para o pobre que usa seus serviços de saúde por falta de opção financeira.

Com a empresa do milagre funcionando, qual será a função da Secretaria Municipal de Saúde e o seu volumoso organograma preenchido, na maioria, por cabos eleitorais?

A grande vítima dessa atitude será a população pobre, como sempre. A nossa capital extinguiu um programa de saúde pública (SUS) aplaudida e elogiada por toda a comunidade médica científica internacional.

Seria oportuno se prefeito, secretários, vereadores, fossem obrigados a usufruir das maravilhas gerenciais dessa nova empresa.

Único feliz com essa implantação de modernização dos negócios da nossa saúde pública é o vereador Mário Nadaf, que não conseguiu recursos com o modelo atual para o seu projeto beneficiando os homens idosos da capital, mas, com certeza, será atendido pela ECS.

Enfim, existem mais dúvidas que certezas na vida da população pobre.

 



Autor

Gabriel Novis Neves

foi o primeiro reitor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT); é médico gineco (ginecologista e obstetra)

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