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Opinião
Segunda - 21 de Dezembro de 2020 às 18:58
Por: Luiz Henrique Lima

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“Alegria, alegria” foi uma das composições que marcou época na música popular brasileira, lançando ao estrelato nacional o então jovem baiano Caetano Veloso. Até hoje é uma das canções emblemáticas da década de 60 e mesmo entre os jovens de 2020 quase todos conhecem os seus versos iniciais:

Caminhando contra o vento

Sem lenço e sem documento

No sol de quase dezembro

Eu vou ...

Hoje, o país vive uma situação semelhante, mas com sinais invertidos, isto é, sem nenhuma alegria e com muita tristeza.

Ao sol de meados de dezembro, caminhando contra o vendaval de uma pandemia com crise econômica, o país está sem lenço para chorar os seus 180 mil mortos, sem um plano de vacinação minimamente consistente e pactuado para prevenir outras tantas mortes e sem sequer um orçamento aprovado que defina as prioridades, programas, metas e ações governamentais para o curtíssimo prazo, pois 2021 começa daqui a 10 dias.

Como tenho sublinhado em outras oportunidades, o debate e a votação das leis orçamentárias constituem a principal responsabilidade do Poder Legislativo, eis que podem gestar soluções ou agravar carências na execução das políticas públicas.

Sem fundos orçamentários, inviabiliza-se o exercício dos direitos e garantias constitucionais, individuais, coletivos e sociais.

É a discussão sobre o orçamento público que aponta o rumo e imprime o ritmo do desenvolvimento nacional, autorizando empreendimentos, ponderando demandas e conferindo transparência aos propósitos do governo.

Sem orçamento, a improvisação substitui a estratégia e o voluntarismo se sobrepõe ao planejamento.

No regime democrático, o orçamento é, simultaneamente, combustível e freio. É o combustível que impulsiona a atuação dos gestores e é o freio que os limita à execução do que foi autorizado. Por isso, o orçamento deve ser elaborado com esmero técnico e primazia política. Deve ser uno, exclusivo, universal, público, específico e equilibrado.

A previsão de receitas deve ser consistente, coerente e segura, em sintonia com a conjuntura macroeconômica e a capacidade contributiva da sociedade. Em mares tempestuosos, decidir o orçamento corresponde a traçar o itinerário e a estratégia de modo a ultrapassar com segurança as múltiplas dimensões da presente crise.

Não se compreende, portanto, que tema de tamanha importância venha a ser objeto de tramitação tumultuada, a ser decidida, na melhor hipótese, de modo atabalhoado nos instantes derradeiros da sessão legislativa.

Que assim o seja indica grave disfuncionalidade no sistema de representação política, com evidentes e inevitáveis prejuízos para o bom andamento da administração pública. E que não venha imputar-se tal responsabilidade apenas ao Congresso Nacional, uma vez que, conforme bem apontado pelo Tribunal de Contas da União, as propostas encaminhadas pelo Poder Executivo, tanto da Lei de Diretrizes Orçamentárias como da Lei Orçamentária Anual, padeciam de vícios insanáveis, a exemplo da indefinição de metas de resultados fiscais e da não previsão de receitas oriundas de acordos de leniência.

Sem lenço, sem orçamento e sem vacina, assim vamos nós, brasileiros, caminhando contra o vento nesse final de 2020.

Que possamos disso tudo aprender algo e agir melhor no futuro. E que Deus nos proteja!

Luiz Henrique Lima é conselheiro substituto do TCE-MT.



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