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Opinião
Quarta - 13 de Julho de 2011 às 10:50
Por: Dirceu Cardoso Gonçalves

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O desumano “bico” torna-se, cada dia, mais pernicioso à polícia paulista. Proibidas pelo regulamento, as atividades paralelas têm sido toleradas pelos sucessivos governos, que não pagam o salário adequado, mas não impedem o servidor de ir “buscar lá fora” o que não recebe na atividade policial. Em 2009, o convênio com a Prefeitura de São Paulo oficializou o ”bico” na PM, hoje chamado “atividade delegada”. E agora – pasmem – o policial deverá ganhar mais no bico do que na corporação, e o sistema é vendido para dezenas de municípios em todo o Estado.

Ao oficializar e incentivar, o "bico", com farda e armamento, no horário de folga, o Estado é maldoso e reconhece não estar pagando salário compatível e, ao mesmo tempo, arrepia os princípios da legislação trabalhista, que estabelecem jornada máxima de atividade ao trabalhador, horas-extras e define até o trabalho-escravo, também capitulado no Código Penal. A prática, sem dúvida, sucateia a instituição, pois, com os baixos salários, a policia paulista fatalmente marchará para a apatia geral.

Seus integrantes estarão mais voltados para o bico, mesmo porque, nele, sua remuneração é estabelecida tão somente pelas horas trabalhadas. A população, já abandonada em matéria de segurança pública, arcará ainda com o total prejuizo, quando o policial, em razão do "bico", se acidentar, ou se deparar com uma situação de flagrante delito, ou tiver que comparecer ao forum criminal, e por estes motivos o horário avançar ou coincidir com o estabelecido no "emprego principal". A classe, então, além do “bico”, usará o salário, o estudo e o treinamento ministrados na sua formação como base para prestar concursos de juiz, promotor, policial federal e outras carreiras melhor remuneradas. Isso já ocorre, mas poderá aumentar muito.
            
O policial, por exercer uma função essencial e de interesse público, é um profissional diferenciado. De seu trabalho dependem a segurança e a vida das pessoas. Por isso, os regulamentos estabelecem a dedicação exclusiva. Ele tem de receber treinamento e reciclagem permanentes e atuar descansado e psicologicamente preparado para enfrentar os desafios da atividade. Por trabalhar armado e em situações-limite, onde tem de decidir em segundos (se atira ou não), precisa estar bem. Não pode chegar ao seu posto de trabalho já cansado ou perturbado pelos problemas da outra atividade pois, nestas condições, pode transformar-se num “homem-bomba” e produzir resultados muito diferentes dos necessários e esperados pela sociedade.
           
Por mais que se crie artifícios legalizadores, a “atividade delegada” é incostitucional em pelo menos dois aspectos. Funcionários não podem receber, acumuladamente, de duas fontes públicas, e a atividade policial é de competência do Estado, podendo o município apenas fazer a guarda de seu patrimônio (artigos 37 e 144 da Constituição Federal). Considere-se, também, que as receitas do Estado destinam-se, entre outras coisas, a manter a segurança pública e as do município, tem outras finalidades. O prefeito que contrata a “atividade delegada” está desviando a finalidade dos impostos arrecadados. Não temos dúvidas de que o Ministério Público e os Tribunais de Contas, no tempo certo, exigirão a reparação dessa distorção.
           
Polícia é uma atividade de responsabilidade do governo. Jamais poderá ser terceirizada...
 
 
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
aspomilpm@terra.com.br


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