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Opinião
Domingo - 10 de Abril de 2011 às 22:47
Por: Lourembergue Alves

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“A sombra do vento”. Livro do espanhol Carlos Ruiz Zafón, atualmente radicado em Los Angeles. Trata-se de um belíssimo romance, cujo cenário é o da Barcelona da segunda metade da década de 1940, com todos os problemas herdados da Guerra Civil (1936-39) e da Segunda Guerra Mundial. O que deixou a população em situação bastante desconfortável. Vítima do surto de cólera e da dificuldade financeira. A despeito disso, um grupo de endinheirado se sobrepunha, a ponto inclusive de usufruir-se das regalias sociais, e de tudo que destas advinha. 

 Ambiente, entretanto, que não se contrapunha a existência de outro mundo, o dos livros. Tanto que Daniel, um dos personagens-narradores, cresceu no meio da livraria do pai. Fazia “amigos invisíveis”. Certo dia, logo pela manhã, foi levado pelas mãos do próprio genitor para visitar o “Cemitério dos Livros Esquecidos”. Um lugar todo recortado por túneis, escadas, plataformas e estantes abarrotadas, que se erguiam da base até cúspide, as quais “deixavam adivinhar uma biblioteca gigantesca”. Eis, aqui, “um santuário. Cada livro, cada volume tem alma. A alma de quem o escreveu, e a alma dos que o leram, que viveram e sonharam com ele” – dizia-lhe seu pai. Estão juntos tudo que ninguém se lembra mais e que se perdeu no tempo, sempre a espera “de um novo leitor”. “Cada livro que você vê foi o melhor amigo do homem”. O garoto, à época, com dez anos, ouvia atentamente a tudo, ao mesmo tempo em que perambulava pelos “esconderijos daquele labirinto com cheiro de papel velho, pó e magia”. Foi aí que deparou com “A sombra do vento”, de Julián Carax. Autor e título que ele jamais tinha visto ou ouvido falar, mas deixou-se levar pela história narrada, a de “um homem em busca de seu verdadeiro pai”. Leitura que o levou a investigar sobre a vida de Carax.  Então, a partir desse momento, surgem às tramas, os segredos, os personagens enigmáticos e romances, e que o próprio Daniel se vê também envolvido. A ponto, por exemplo, da sua vida e a do autor desconhecido se entrelaçarem de forma mágica e paralela. Tanto que “nos passos perdidos de Carax” ele “reconhecia” os seus próprios. Isso se deu num quadro-ambiente permeado de praças, cafés do Bairro Gótico, Ramblas e o Tibidado, em meio a um enredo de mistérios, mentiras, intrigas, perseguições e amores perdidos. Teias que encaixam perfeitamente bem cada detalhe – construída cuidadosamente didática, da mesma forma que fora traçada a personalidade de cada um dos personagens, especialmente dos amigos de infância de Julián Carax.    
 
Aliás, não é por outra razão que essa obra de Carlos Zafón teve a sua inscrição entre as melhores dos últimos tempos. 
 
Uma obra que tem como mote principal a solidão, tristeza e os vazios sem respostas, tal como escrevera Nuria Monfort – uma de suas personagens – “Há prisões piores do que as palavras”.  Mas, igualmente, esse escrito de Zafón trata de livros. Inclusive dos que estão fora das listas dos mais vendidos. Até porque os de Carax sempre estiveram à margem de grandes nomes, com vendas inexpressivas. Aqueles que os leram, no entanto, ficaram apaixonados pela leitura e “seduzidos” pelo autor. Ponto interessante, onde Carlos Zafón, no trabalho em questão, traz a idéia de que grandes livros e autores nem sempre aparecem em destaque nas livrarias, fazendo prevalecer à boa literatura às estratégias de marketing das editoras e de determinados escritores.

Discussão necessária e importante. Não apenas por conta disso, e igualmente por essa razão, que “A sombra do vento” é tida como sedutora e comovente, cujo final é revelador, além de extraordinário, apesar de cenas próprias das tramas policiais.        

Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos



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