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Economia
Domingo - 20 de Fevereiro de 2011 às 13:09

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A poucos passos da praça da Sé, no centro de São Paulo, empregadas domésticas são arregimentadas para jornadas sem limite de horas e sem folga semanal, em troca de casa, comida e salário bem abaixo do mercado.

A descrição, que poderia remeter a épocas remotas, é atual: com a dificuldade de encontrar profissionais para lavar, passar, cozinhar e limpar, empregadores começam a buscar domésticas entre as imigrantes latino-americanas que se concentram na região central da cidade.

A maior parte desses empregos é informal, e não há estatísticas sobre o número de trabalhadoras latino-americanas em casas de família.

Mas a Folha ouviu imigrantes e agências de emprego que relatam que aumentou o número principalmente de bolivianas e de peruanas atrás de vagas para dormir no emprego.

Como o salário das domésticas aumentou, diminuiu a diferença entre o que ganha uma trabalhadora que dorme no emprego e outra que vai e volta todo dia. O resultado é que cada vez menos brasileiras aceitam vagas que exigem permanência à noite.

VENERADAS

"Uma cozinheira de forno e fogão para dormir no emprego é quase ouro no mercado. Quando aparece uma aqui, é venerada", diz Luciano Segura Jr., gerente-comercial da agência Domésticas.

O padre Mário Geremia, da Pastoral do Migrante, que acolhe pessoas de outros países, diz que começam a aparecer mulheres que chegam ao Brasil buscando especificamente vaga de doméstica para dormir no emprego.

Ele diz que também cresceu o número de empregadores que vão à região dos escritórios da pastoral para contactá-las, assim como a quantidade de bolivianas que trocam a costura pelo serviço doméstico.

É o caso da boliviana Maria (nome fictício), 34, que chegou ao Brasil em dezembro para trabalhar como costureira. Trocou o emprego por outro, em que cuidava de uma idosa em Atibaia, a 60 km da capital. Dormia no emprego e ganhava R$ 700 por uma jornada das 8h30 às 22h.

"Trabalhei conscientemente, mas abusavam de mim", diz ela, que busca outra vaga na mesma função.

Uma trabalhadora brasileira registrada que durma no emprego pede salário de R$ 1.200 a R$ 1.500 em São Paulo, segundo agências de emprego paulistanas.

DEZ DIAS

A peruana Mercedes (nome fictício), 46, chegou a São Paulo no dia 3 de fevereiro e foi contratada para cuidar de uma idosa menos de dez dias depois. Ganha R$ 1.000 para fazer todos os afazeres da casa e morar no trabalho. "Disseram que, já que não conhecia ninguém e não tinha aonde ir, eu não teria folga."

Ela planeja juntar dinheiro e remeter aos oito filhos que deixou em seu país.

O cônsul geral do Peru em São Paulo, Jaime Stiglich, afirma que as peruanas são muito procuradas para os serviços domésticos. "As peruanas cozinham muito bem e são muito buscadas."

Quatro agências que recrutam domésticas relataram que têm sido procuradas por latino-americanas.

Dizem, porém, que não conseguem agenciá-las porque os que buscam trabalhadoras por meio de agências, segundo elas, contratam com carteira assinada e pedem carta de recomendação.

DIVERSIFICAÇÃO

A anistia aprovada em 2009 pelo governo brasileiro a imigrantes que estavam ilegais no país expandiu as oportunidades de trabalho para os latino-americanos.

O primeiro emprego da boliviana Virginia Poma, 33, no Brasil foi em uma confecção paulista. Trabalhava como costureira das 7h à meia-noite. Hoje é recepcionista e instrutora em um salão de beleza no Brás, na região central da cidade, e trabalha das 13h às 21h, com uma hora de almoço.

Aos sábados, a maior parte dos alunos de Virginia na escola veio de fora. "Tem bolivianos, paraguaios e peruanos. Eles lotam aqui", conta. Homens e mulheres latino-americanos fazem cursos de manicure, depilação e corte de cabelo.

O padre Marcelo Álvares Matias Monge, da igreja S. João Batista do Brás, que tem missas em espanhol para atender os imigrantes da região, diz que o perfil do trabalhador boliviano começa a mudar. Segundo ele, começa a haver alternativas às oficinas de costura, que tradicionalmente empregam esses imigrantes.

A consulesa da Bolívia em São Paulo, Rosa Virginia Ayoroa, relata que a cada ano aumenta em 15% o número de bolivianos que se regularizam no país. Segundo ela, há "demanda voraz" em São Paulo por mão de obra boliviana barata.






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