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Repórter News - reporternews.com.br
Internacional
Segunda - 24 de Setembro de 2007 às 19:31

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SÃO PAULO - Bactérias levadas ao espaço pelo ônibus espacial Atlantis em 2006 tornaram-se bem mais letais que outras, cultivadas nas mesmas condições de temperatura e umidade, mas sem sair da Terra, mostra um experimento descrito nesta semana no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS). O aumento de virulência foi marcante: aplicada em ratos, a variedade espacial matou 90% dos animais em 25 dias, contra 60% dos que não resistiram à versão terrestre.

Segundo uma das autoras do trabalho, Cheryl A. Nickerson, da Universidade Estadual do Arizona, a causa mais provável desse aumento no potencial destrutivo da Salmonella typhimurium, que também causa intoxicação alimentar em humanos, é o efeito da microgravidade no meio onde as bactérias são cultivadas. Sem peso, não há sedimentação, e o arrasto exercido pelo líquido ao passar sobre os micróbios também é reduzido.

O experimento em órbita foi realizado pela astronauta Heide Stefanyshyn-Piper. Ela abriu a barreira que separava as bactérias do meio de cultura, num vasilhame especialmente reforçado para garantir que os astronautas não corressem perigo. Além de mais letal, a salmonela que voltou do espaço também se mostrou mais potente, requerendo uma dose menor para causar a doença, em comparação com a variedade terrestre.

A cientista não descarta a possibilidade de haver um efeito da radiação espacial na amostra, mas diz que experimentos realizados em simuladores de baixa gravidade na Terra também geraram bactérias mais resistentes do que culturas mantidas em condições normais.

"Há bastante evidência de que é a ação do fluido sobre as células, em microgravidade, que gera esses efeitos", afirma. A bactéria "sente" as mudanças no ambiente e ajusta sua bioquímica de acordo.

Isso significa que bactérias inócuas que vão ao espaço, no corpo de astronautas, podem voltar transformadas em organismos letais? Não exatamente, diz Nickerson.

"Nossos resultados indicam apenas que o crescimento em uma cultura líquida, em um experimento controlado no espaço, pode aumentar a virulência bacteriana", explica a pesquisadora, lembrando que o corpo humano apresenta condições diferenciadas.

"Quando outros fatores entram em jogo, como as forças que atuam sobre o corpo, o sistema imunológico, antibióticos e terapia, a resposta pode mudar", afirma. Avaliar o efeito do espaço em microorganismos incubados em uma pessoa exigiria um experimento específico. "Além disso", lembra, "astronautas têm ido e vindo do espaço há décadas, com um perigo mínimo de doenças infecciosas para eles mesmos e nenhum perigo para outras pessoas".

Na comparação entre as bactérias enviadas ao espaço e as que permaneceram na Terra, os pesquisadores descobriram diferenças na expressão de 167 genes, principalmente nos relacionados a uma proteína, Hfq, ligada à reação das bactérias ao estresse e à promoção da virulência de vários microorganismos, não só da salmonela.

Esse resultado poderá ajudar no desenvolvimento de vacinas e antibióticos. "Estratégias tendo como alvo a Hfq e reguladores relacionados poderiam ter o potencial de reduzir os riscos de doenças infecciosas no espaço e oferecer novas opções terapêuticas na Terra", diz o artigo.

"Uma parte importante de nosso trabalho com vôos espaciais relaciona-se diretamente a compreender como micróbios causam doenças na Terra", afirma Nickerson.

Segundo ela, a ligação existe porque a redução nas forças exercidas pelo fluido, sentida pelas bactérias cultivadas no espaço, assemelha-se a algumas condições que surgem durante o ciclo de vida normal dos microorganismos, inclusive em hospedeiros. Áreas de baixo arrasto de líquido no corpo humano incluem o estômago e o útero, por exemplo. "Usamos os vôos espaciais como plataforma de pesquisa para o controle de doenças".

A despeito disso, a pesquisadora não descarta a possibilidade do estudo vir a influenciar o design de naves espaciais. "Nossa pesquisa identificou alguns mecanismos que têm um papel fundamental nas respostas dos microorganismos à baixa gravidade e ao arrasto reduzido. Estratégias visando esses mecanismos certamente poderão ser usadas para avaliar os riscos para a tripulação, e na criação de novas medidas para reduzir o perigo de doenças infecciosas em missões à Lua ou Marte".

Nickerson diz que não há registro de astronautas infectados com salmonela. Na missão Apollo 13, em 1970, o astronauta Fred Haise teve febre, provocada por uma grave infecção urinária causada pela bactéria Pseudomonas aeruginosa.




Fonte: Estadão

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