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Internacional
Domingo - 10 de Dezembro de 2006 às 16:21

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Longe da glória dos seus heróis Júlio César e Napoleão, o ex-ditador Augusto Pinochet morreu neste domingo, aos 91 anos, em um canto escuro que a história lhe conferiu e onde não imaginava chegar quando impôs sua mão de ferro sobre o Chile, entre 1973 e 1990.

Doente e velho, nada sobrou daquela imagem de homem forte que rompeu bruscamente a tradição republicana no Chile ao comandar um golpe militar em 11 de setembro de 1973, para derrubar o presidente socialista Salvador Allende.

Pinochet foi-se com o sabor amargo que colocaram em sua boca nos últimos anos —acusado pela Justiça de crimes contra os direitos humanos e delitos econômicos durante sua ditadura. Ele evitou os julgamentos apelando à sua deteriorada saúde mental.

"Hoje, perto do final dos meus dias, quero manifestar que não guardo rancor de ninguém, que amo a minha pátria acima de tudo e que assumo a responsabilidade política de tudo o que fiz", disse o ex-ditador em carta lida por sua mulher, Lucía Hiriart, em 25 de novembro, dia de seu último aniversário.

Parentes dos mais de 3.000 chilenos mortos e desaparecidos durante o governo Pinochet nunca deixaram de culpá-lo pela perseguição sangrenta e pediram com insistência que fosse levado à Justiça, inclusive pouco antes de sua morte.

Mas o ex-ditador jamais imaginou pisar em uma cadeia. Ele alegou "demência" para escapar do cerco judicial, por processos relacionados a acobertamento de homicídios e sequestros realizados por subordinados dias depois do golpe de 1973. Preferiu que o chamassem de "louco" a ser condenado como criminoso.

ROSTO MUNDIAL

Há algumas semanas foi mencionado que Pinochet poderia ter guardado mais de nove toneladas de ouro em barras em uma conta em um banco de Hong Kong, o que somaria mais de 27 milhões de dólares à sua fortuna, distribuída em uma centena de contas secretas no exterior.

Pinochet nasceu em 25 de novembro de 1915 na cidade portuária de Valparaíso. Aos 20 anos era um novato no Exército, onde seguiu carreira que o levou a uma subida fulminante ao poder e que terminou em 1998, quando deixou a vida de militar ativo mais longevo do mundo.

Seu rosto tornou-se familiar entre os chilenos através de uma fotografia tirada depois do golpe de Estado, em que aparecia em pose desafiadora e com óculos escuros, assumindo como líder do país após derrubar Allende, a quem havia jurado lealdade ao entrar no cargo de chefe do Exército dias antes.

Pinochet liderou uma dura repressão contra os opositores, que classificava de "vendedores da pátria" e "marxistas". Muitos dele comandam hoje o país.

O ex-general formou um governo que misturava ditadura política e liberalismo econômico, em modelo que fincou as bases das privatizações de empresas públicas, política fiscal austera e desenvolvimento através de exportações.

"Isso não é uma ditadura, é uma ditamole", costumava brincar com jornalistas.

A piada não provocava risos com os dissidentes, entre eles a novelista Isabel Allende. Para ela, Pinochet "entrará na história junto a Calígula e Idi Amin Dada, como sinônimo de brutalidade e ignorância".

A figura de ditador desalmado levou um grupo guerrilheiro a tentar matá-lo em 1986. Ele escapou do atentado, mas cinco de seus seguranças morreram.

Proclamado como herói pelos partidários, que ainda representam quase um terço da população do país, Pinochet tentou ampliar seu governo por mais oito anos, convocando um plebiscito em 1988. Mas os chilenos negaram a permanência do governo militar, em eleição observada pelo mundo no ano seguinte.

Ele teve que deixar o comando em 1990, mas continuou à frente do Exército, causando mais uma dor de cabeça à incipiente democracia chilena.

ANCIÃO

Fora da vida pública, a marca dos crimes cometidos durante seu governo mudou o destino dos seus últimos dias.

Ele enfrentou um processo judicial de quatro anos, iniciado em sua cidade predileta, Londres, quando o juiz espanhol Baltasar Garzón ordenou sua prisão sob acusação de genocídio.

Pinochet passou quase 500 dias trancado em uma mansão de Londres, até que o governo britânico abriu as portas para sua volta, alegando razões humanitários devido à piora de sua saúde, afetada por diabates e insuficiência cardíaca.

Sua volta foi saudada por centenas de simpatizantes que o acompanharam por quase duas décadas e que ainda lhe agradeciam pelo o que chamam de gesto heróico em 1973, que terminou com o "fantasma" do marxismo no país.

Mas depois que chegou de Londres não conseguiu retirar-se para a vida de ancião aposentado.

Em seu próprio país, onde "nada acontecia" sem que soubesse, como disse uma vez, também corria riscos legais.

Reuniu uma das melhores equipes de advogados locais e entrincheirou-se.

Na batalha judicial, Pinochet perdeu sua imunidade como senador vitalício e sofreu sua maior humilhação, em episódio que poucos chilenos imaginavam ser possível: foi detido em sua casa e processado como autor de 75 homicídios e sequestros perpetrados por um esquadrão militar em 1973.

Depois da detenção temporária, surgiram outros processos judiciais por delitos financeiros e de violações dos direitos humanos, em que também foi submetido a mais prisões domiciliares, privando-o da liberdade no momento de sua morte.





Fonte: Reuters

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