Publicidade
Repórter News - reporternews.com.br
Cidades/Geral
Terça - 21 de Março de 2006 às 08:45
Por: Keka Werneck

    Imprimir


Uma enchente de grande proporção - a terceira maior da história recente do Estado - está prevista para hoje e os próximos dias em 6 cidades mato-grossenses: Nobres, Rosário Oeste, Cuiabá, Várzea Grande, Santo Antônio do Leverger e Barão de Melgaço.

O aumento das chuvas forçou Furnas Centrais Elétricas a abrir uma comporta da Usina de Manso, localizada no município de Chapada dos Guimarães, dia 8 de março, para reduzir o fluxo do lago e evitar possível rompimento da barragem, o que geraria uma tragédia. A vazante nesta data era de 100 metros cúbicos por segundo, conforme a própria empresa. Mesmo assim, com os temporais, o imenso reservatório continuou enchendo a exaustão. Nos dias 17, 18 e 19, último final de semana, a vazante teve que ser elevada para 178, 242 e 420, respectivamente, metros cúbicos por segundo. Furnas diz ter informado à Defesa Civil do Estado sobre estes procedimentos há 11 dias. O tenente-coronel Arilton Azevedo, superintendente do órgão, nega esta informação e diz que ficou sabendo do caso somente domingo (19) de manhã pelo celular, quando começou a articular um vultuoso plano estratégico para avisar e atender às 3,5 mil famílias que devem ser atingidas primeiro pelas ondas vindas de Manso. Não bastassem estas primeiras informações, a vazante terá que ser ampliada ainda mais hoje às 10 horas para 800 metros cúbicos por segundo e amanhã, no mesmo horário, para 1 mil. Se o tempo não firmar até sexta-feira, isso vai chegar a 1,8 mil metros cúbicos por segundo, sendo que a vazante máxima da usina é de 2,5 mil, mas isso com a barragem totalmente inoperante. Furnas admitiu a necessidade de aumentar a vazante para a reportagem e confirma que isso pode significar realmente enchente nas cidades citadas, mas que não pode fazer diferente ou colocaria o reservatório em risco.

A empresa garante que das 4 turbinas disponíveis na usina, duas estão funcionando normalmente e duas, paradas, por determinação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), órgão que regula o setor. Conforme a assessoria de imprensa da empresa, isso é bom, porque quando todas estão "à toda" aumentam a vazante de água. O prefeito de Cuiabá, Wilson Santos, demonstrando preocupação com este quadro que vem se formando, disse, no entanto, que esteve pessoalmente na usina no domingo e que nenhuma das turbinas estava atuante e que foi informado por técnicos que elas na verdade retêm 400 metros cúbicos de água por segundo, ou seja, se estivessem funcionando as quatro é que seria interessante no momento. Diante destas contradições, o secretário de Estado de Meio Ambiente, Marcos Machado, informou ontem, em entrevista coletiva à imprensa, que vai investigar Furnas e o grau de responsabilidade da empresa nos episódios que ainda estão por vir. Disse ainda que enviou um pedido formal para que melhore a comunicação com as autoridades públicas neste processo de contenção de riscos e que envie um representante neste momento de emergência para colaborar efetivamente com o plano estratégico, já que, até ontem, não havia feito isso espontaneamente. O secretário também chamou a empresa à responsabilidade de uma colaboração solidária com alimentos e outros materiais que sejam necessários no atendimento às famílias desabrigadas, todas elas ribeirinhas e pobres, pois, com o aumento da vazante, as águas - já se sabe - não vão se aproximar das mansões localizadas acima da barragem - um ambiente paradisíaco erguido por famílias ricas de Mato Grosso e de fora do Estado também, muitas delas aficionadas por pesca.

A gravidade da situação é possível medir pelo grau de preocupação que despertou nas autoridades públicas. Na coletiva de ontem, na Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema), chefes maiores do Exército, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar, os prefeitos de Cuiabá e Várzea Grande, além de secretários de Estado, tentavam avaliar o que pode acontecer de hoje aos próximos dias e uniformizar posturas a serem adotadas, inclusive no sentido de prevenir mortes.

No entanto, Machado pede prudência, em um momento em que alarmar é mais fácil, na opinião dele, do que ser prático. "Se pudesse dar uma única mensagem à população ribeirinha, diria: fique de olho no rio, porque ele vai encher rápido e fazendo ondas". Ele avisa ainda que "pescadores devem abandonar esta atividade de imediato, lazer no rio nem pensar e avisa ainda que é importante evitar transitar por ruas à margem do rio à noite. Até porque se houver mais chuva, haverá transbordamentos repentinos, podendo carregar carros, bicicletas e gente. "No entanto, não quero pessoas fechando suas casas alarmadas, até por questão de segurança e oportunistas podem se aproveitar disso. Vamos acompanhar a evolução dos fatos e soltaremos boletins explicando as providências", disse.

Está sendo cogitada a interdição de algumas localidades, como a avenida Beira Rio, onde há duas grandes faculdades, a Universidade de Cuiabá (Unic) e o Centro Universitário Cândido Rondon (Unirondon).

As famílias em área de risco devem se preparar para sair de casa, juntar pertences, organizar suas vidas, para uma remoção a que estarão sujeitas a qualquer momento.

A secretaria de Estado de Saúde está providenciando medicamentos e vacinas. Cestas básicas estão por conta da Secretaria Municipal de Cidadania, Trabalho, Assistencia e Inclusão Social. Já estão sendo disponibilizados, para servirem de abrigo, o estádio do Verdão e os ginásios municipal, da Lixeira e do Quilombo e em Várzea Grande os ginásios Fiotão, Ferreirão e o do Parque do Lago.

O prefeito Wilson Santos chama a atenção também das famílias ribeirinhas que vivem na região do rio Coxipó, que deve represar água e encher também, já que é afluente do Cuiabá.

O prefeito destaca ainda que esta é a terceira grande cheia dos últimos 32 anos na Capital. "Uma foi em 1974, outra em 1995 e esta de 2006. Me lembro de quando era menino, em 74, que a água chegou na avenida 15 de novembro (Porto)", comenta.

A barragem é o fato novo nesta cheia. As autoridades admitem que com ela dá ao menos tempo de planejar ações. Esta tem sido a principal argumentação da usina para sustentar sua importância, além da geração de energia. "De cara, Furnas alegou isso e aceitamos esta argumento porque sabemos que realmente é muito grande o volume de água, que está acima da normalidade. Mas mesmo assim vamos levantar a atitude da empresa, até porque nossa relação com ela, enquanto Sema, não é amistosa. Furnas está pendente conosco na licença ambiental, que autoriza o funcionamento dela, porque não está cumprindo uma exigência. Mesmo assim ela conseguiu na Justiça uma liminar para funcionar", lamenta o secretário.

Em 33 anos de serviços públicos prestados junto à Defesa Civil do Estado, o engenheiro e arquiteto Domingos Iglesias, hoje aos 80 anos e em depressão por ter sido afastado do órgão sem maiores explicações, doutor em portos de mar, rios e canais, revela à reportagem que previu o Estado sobre a insustentabilidade da Usina de Manso em um relatório minucioso protocolado em 2001, 1 ano após o início da operação das turbinas. "Não tem vazante suficiente e o lago vai encher. A vazão de Manso não dá sustentabilidade à usina como está previsto no projeto de Furnas", avisou o especialista em três volumes.

Iglésias lembra ainda que em 2002 surgiu um boato que o reservatório estava vazando. "Era verdade. Mandei um técnico vistoriar o local em alta cautela e ele verificou que o solo do lago cedeu bastante pelo peso da água, formando um redemoinho que poderia sugar veículos de navegação que passassem próximo dele".

Outro relatório feito pelo especialista, nas primeiras ocasiões de pânico devido à expansão do terrorismo no mundo, época do antraz, cita como ponto estratégico para ataques o reservatório de manso que, totalmente destruído, liberaria 2,5 mil metros cúbicos por segundo no rio, atingindo 250 mil famílias.

Indagado sobre o porquê de tudo isso não ter sido levado em conta, Iglesias diz "não sei, nem se quer tive qualquer retorno".

É com esta autoridade que ele, a pedido da reportagem, orienta a equipe de plantão a estar atenta à régua de Rosário Oeste, porque, de lá até Cuiabá, as águas demoram para chegar cerca de 32 horas. "Dá tempo para mobilizações, sem alarde".

Iglesias diz já estar recebendo algumas ligações de técnicos preocupados com os próximos acontecimentos.

A equipe de emergência destaca que todo este trabalho é preventivo e que "reza" para que não precise de todo este aparato.

O plano está sendo concentrado no Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp), cujos telefones gratuitos são 193, 192 e 190, além de outros disponibilizados.





Fonte: A Gazeta

Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://reporternews.com.br/noticia/311109/visualizar/