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Agronegócios
Sexta - 25 de Fevereiro de 2005 às 06:33
Por: Renato Stancato

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São Paulo, 24 - A indústria de sementes resolveu tomar para si a tarefa de combater a pirataria que grassa no Brasil. Cansada de esperar pela fiscalização do governo, o setor resolveu se organizar para denunciar e processar os produtores e vendedores de sementes clandestinas. Na última safra, a estimativa do setor é de que 35% das sementes plantadas tenha sido informal. No mesmo período, o faturamento do setor foi estimado em R$ 4 bilhões.

Segundo Ivo Carraro, diretor de pesquisa e produção da Abrasem (Associação Brasileira de Sementes e Mudas), os processos tiveram início no ano passado. "Tomamos a decisão após um reunião com técnicos do Ministério da Agricultura", explicou. "Eles nos disseram que a fiscalização não seria uma prioridade deles, porque a propriedade intelectual era interesse privado, e não público."

Desde então, as empresas puseram a mão na massa. Só a Coodetec, empresa de Carraro, já abriu oito processos por pirataria. A sua primeira vitória parcial ocorreu em 22 de setembro, quando a juíza de Giruá, no Rio Grande do Sul, concedeu a primeira grande liminar de busca e apreensão de sementes ilegais no Brasil. Ao todo, as empresas de sementes já somam seis liminares em seu favor.

Para aprimorar a eficiência dessa estratégia, a Abrasem está selando um pacto com a Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI), cujos membros são juristas especializados no tema. "Já que por vias administrativas não é possível fazer nada, vamos tentar por vias judiciais", disse Carraro.

O presidente da ABPI, Gustavo Leonardos, explicou que a legislação que defende a propriedade intelectual de variedades convencionais e transgênicas é sólida. "Há leis para combater a pirataria", disse.

Segundo Carraro, o pacto entre a Abrasem e ABPI visa a criar massa crítica, na forma de técnicos e procedimentos, para conduzir essas ações judiciais. "É um tema novo, e precisam ser criados procedimentos novos. Por exemplo, como se prova judicialmente que determinada semente é cópia de uma cultivar registrada?", explicou.

O diretor da Abrasem afirmou, contudo, que o maior desafio é realmente obter mandados de busca para recolher provas da pirataria. "A ordem precisa ser dada rapidamente, porque as provas somem dos armazéns rapidamente. Tem dado certo entrar com medidas cautelares para pedir apreensão de sementes", afirma.

A produção de sementes clandestinas está crescendo significativamente, segundo Ivo Carraro. "Os produtores são incentivados pelo ganho adicional que podem auferir", explica. No caso da soja, o quilo de um saco de semente custa atualmente R$ 1,80, enquanto o quilo da soja custa até R$ 0,50. "A possibilidade de ganho que tem vendendo a soja como semente estimula a pirataria", afirma.

O setor de sementes de soja, por sinal, gera uma grande evasão. A Abrasem estima que apenas 65% da área plantada no Brasil seja feita com sementes oficiais. Mas é no caso do algodão que a expansão preocupa mais. O setor estima que apenas 31% das sementes plantadas na última safra tenha sido comprada de canais oficiais. "É um aumento imenso em relação a poucos anos atrás", diz.

Carraro explica que nem todas as sementes informais são ilegais. A legislação brasileira proíbe a multiplicação e venda de sementes sem licença, considerada pirataria. Contudo, permite que os agricultores guardem semente para seu próprio uso no ano seguinte. "Quando é esse o caso, só cabe ao setor de sementes convencer o produtor a voltar a ser seu cliente".

O diretor da Abrasem diz que o setor gera 200 mil empregos diretos e indiretos, ameaçados pela prática. Ele afirma, contudo, que há argumentos mais convincentes para sensibilizar os produtores. "O agricultor que usa sementes informais está dando um tiro no pé, porque está desestimulando investimentos das empresas de sementes em pesquisa", afirma.

A Abrasem e a ABPI também estão empenhadas em fazer uma campanha para alterar as atuais regras que permitem que produtores guardem sementes. "Elas foram feitas com foco nos pequenos produtores e deveriam estar restritas a eles", diz Carraro. "Não faz sentido que agricultores que plantam vários milhares de hectares tenham direito de guardar um volume ilimitado de sementes."

A maioria das ações movidas pelas indústrias de sementes tem como base a Lei de Proteção de Cultivares. A lei, de 1995, reza que é proibido produzir e comercializar sementes sem autorização prévia da empresa detentora do registro da cultivar. A Monsanto, contudo, está invocando outra lei - a de patentes, de 1996, para defender a propriedade intelectual do gene "Roundup Ready". Nesse caso, mesmo o agricultor que guarda sementes para a safra seguinte não estaria isento de pagar pelo uso indevido da tecnologia.

"Essa tese já foi aceita em primeira instância em processo que vencemos no Rio Grande do Sul", afirma Rodrigo Almeida, diretor de assuntos corporativos da Monsanto. O argumento é o de que a cada safra plantada deve ser computada como uso do gene, portanto passível de cobrança de direito intelectual.

O plantio de sementes transgênicas com o gene "Roundup Ready" é permitido pelo governo desde março de 2003. A produção oficial e comercialização das sementes, contudo, segue proibida. "Esperamos que a questão se resolva este ano, para que os produtores tenham acesso a sementes de maior qualidade", diz Almeida. Ele lembra que as sementes utilizadas no momento não passaram pelos mesmos procedimentos de fiscalização fitossanitária seguidos pela indústria.

A Monsanto segue em conversações com os produtores gaúchos sobre a cobrança de direitos pelo uso de sementes transgênicas no Estado. "A expectativa é que cheguemos a um acordo em no máximo três semanas, antes da colheita."




Fonte: Agência Estado

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