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Opinião
Quarta - 12 de Maio de 2010 às 17:29
Por: Kleber Lima

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Era 06 de setembro de 2002, quando, já no final da tarde, recebemos na redação do Diário de Cuiabá o caderno da última pesquisa do IPEC sobre a disputa ao governo do Estado e Senado, cujas eleições seriam dali a menos de 30 dias. Quando vimos os números, ficamos atordoados: Blairo Maggi, que nunca tinha assumido a dianteira na disputa, virara o jogo e impunha 16 pontos percentuais sobre seu principal adversário, o tucano Antero de Barros: 41% a 25%.

Advertido pelo Diretor de Redação, Gustavo de Oliveira, eu e minha equipe da editoria de política nos pusemos a tentar entender aqueles números. O Diário vinha de uma relação conturbada com pesquisas, em função das eleições anteriores, e já tinha experimentado da forma mais cruel o dissabor de publicar números que não vieram a se confirmar com as urnas. Embora se limitem a publicar os números, os jornais acabam assumindo para si, perante seus leitores, a responsabilidade pelas pesquisas.

Na primeira leitura que fizemos, nada havia no relatório que não confirmasse os números: era aquilo mesmo, o até então desconhecido Blairo Maggi tinha se tornado o azarão da disputa e ganhava do candidato oficial em praticamente todos os municípios. Vencia também na espontânea. Tinha a menor rejeição. Vencia também nos cenários de segundo turno. Não adiantava, por mais que tivéssemos dúvidas, a vontade do eleitor tinha mudado.

Mesmo assim fizemos uma última checagem. Fomos, eu e o Gustavo, pessoalmente, à sede do IPEC, que na época funcionava na avenida Miguel Sutil, e pedimos que o proprietário do instituto, o João Alberti, nos mostrasse os questionários, o plano amostral e tudo que pudesse nos tranquilizar sobre números, sob pena de o jornal não publicar a pesquisa.

O Alberti prontamente nos atendeu. Quando ele nos mostrava a pilha de questionários, começava na TV o horário eleitoral gratuito. Ficamos ainda mais aturdidos quando vimos uma velhinha no vídeo, falando diretamente de Sapezal, fazendo denúncias rasteiras contra Blairo Maggi e sua família. Em seguida, entra na tela um Dante de Oliveira desconfortável e visivelmente abatido, explorando as denúncias da velhinha e confrontando ele próprio o candidato da oposição. Na hora, disse ao Gustavo: - “Podemos parar a checagem. Para o PSDB abrir a caixa de ferramenta e partir para a pancadaria como acabamos e ver, essa loucura só se justifica porque eles já possuem números que comprovam que vão perder as eleições”.

O Gustavo concordou, voltamos para a redação e publicamos a pesquisa no dia seguinte. Como prevíamos, o mundo desabou sobre o jornal. Mas, a história se encarregou do resto, e o Blairo foi aumentando a diferença até vencer as eleições, no primeiro turno, com pouco mais de 50% dos votos, mas fazendo quase o dobro dos votos de Antero (619.655 x 360.296).

Essa história me veio à memória na última sexta-feira, 07.05, quando recebi a notícia, coincidentemente pelo próprio Gustavo, por telefone, do falecimento do João Alberti. Acompanhei de forma relativamente próxima a bravura com que Alberti enfrentou o câncer durante praticamente o último ano. Foi a mesma bravura com a qual contou para desbravar o mercado de pesquisas eleitorais e de opinião em Mato Grosso.

Tomei gosto pelas pesquisas de opinião por causa do Alberti. Hoje tenho minha própria empresa de pesquisas, e conheço na pele os dissabores que ele já enfrentou por ser colocado em xeque especialmente pelos candidatos que não aparecem bem, mas também por jornalistas que nada ou muito pouco sabem a respeito e, ainda, por concorrentes inescrupulosos que se aproveitam da situação para jogar lenha na fogueira dos imbecis que combatem as pesquisas como causa de seus fracassos, quando elas, na verdade, apenas retratam os efeitos de suas estratégias erráticas.

Não acredito em santos, tampouco em diabos, por essa razão não é minha intenção com esse artigo santificar o Alberti por seu passamento. Provavelmente nem sempre suas pesquisas acertaram (aliás, toda pesquisa tem erro admitido), e os eventuais erros que tenha cometido servirão sempre como argamassa para os argumentos infundados e outras aleivosias dos que, sem a capacidade de fazerem autocrítica, preferem se esconder na sombra do suposto erro das pesquisas para justificarem suas tragédias.

Minha intenção é fazer um reconhecimento ao legado do João Alberti de ter sido pioneiro nessa atividade em Mato Grosso, e com isso abrir caminho para que eu e tantos outros possamos hoje explorar o mercado de pesquisas, criando nossas próprias histórias e ajudando a sociedade a entender melhor os fenômenos sociais e políticos de nosso Estado. Acima de tudo, minha intenção é homenagear a memória de um amigo atencioso que sempre estava disponível, e que vai nos fazer muita falta. “Hasta siempre, compañero!”

 
(*) KLEBER LIMA é jornalista e consultor de marketing em Mato Grosso: E-mail: kleberlima@terra.com.br



Autor

Kleber Lima

KLEBER LIMA é jornalista e secretário de Comunicação da Prefeitura de Cuiabá

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