Investigação aponta gabinete paralelo de prefeito afastado de Cuiabá com decisões intermediadas por primeira-dama Conversas no celular de Márcia Pinheiro mostram negociação de cargos na Prefeitura de Cuiabá, diz o Ministério Público.
Ao lado da casa do prefeito afastado Emanuel Pinheiro (MDB) existia um escritório particular, que, segundo o Ministério Público Estadual (MPE), funcionava como um gabinete paralelo dele e que também era usado como núcleo de apoio à primeira-dama Márcia Pinheiro. O prefeito está afastado do cargo há 30 dias.
No celular de uma das figuras centrais do esquema, a ex-secretária-adjunta de Governo e Assuntos Estratégicos, Ivone de Sousa, que trabalhava nesse gabinete, os investigadores encontraram alguns diálogos entre ela e Márcia Pinheiro.
Num dos trechos de outubro de 2018, Marcia diz à Ivone que quer fazer uma nomeação:
"Ivone, eu quero colocar a esposa do seu Janair no lugar daquela que nós demitimos no Prev, como é que é? lá do previvale, sei lá como chama...", diz trecho da conversa anexada ao processo contra o prefeito afastado.
Minutos depois, a primeira-dama perguntou qual o salário de outro cargo:
"Ivone, quanto que ganha o chefe jurídico de saúde? Emanuel quer colocar ela como chefe do jurídico. Ele está louco para tirar aquele cara" (sic)
Ivone responde:
"Lá é DAS 3, saí líquido R$ 3.300 mais o prêmio de R$ 2.000."
Márcia Pinheiro pergunta:
"Ivone, não dá para colocar um prêmio de R$ 3.800? e continua... Emanuel achou que ela ia ganhar R$ 9.000 lá."
Emanuel Pinheiro mantinha gabinete paralelo ao lado de sua residência. A primeira-dama, Márcia Pinheiro, despachava do local — Foto: Secom/ Prefeitura de Cuiabá
Os relatórios do Ministério Público apresentaram outros documentos e anotações apreendidos no escritório que fica ao lado da casa do prefeito.
Os documentos reforçariam a tese de que Márcia Pinheiro exercia uma participação ativa no esquema de compra e manutenção de apoio político, por meio das contratações temporárias e da concessão irregular do prêmio saúde.
Um dos documentos apreendidos era um curriculum encaminhado pelo vereador Marcrean Santos continha um bilhete informando que o documento deveria ser enviado aos cuidados da primeira-dama.
Em fevereiro deste ano, a pessoa indicada pelo vereador foi nomeada na Empresa Cuiabana de Saúde Pública, com cargo de recepcionista e salário de mais R$ 3.600, segundo o MPE.
Uma perícia feita no celular de Márcia Pinheiro revelou uma conversa entre ela e seu filho, o deputado federal Emanuelzinho (PTB). A conversa é do dia 27 de junho de 2017, quando ele não havia nem se candidato ao cargo de deputado federal. Ele mandou a seguinte mensagem para a mãe:
"Mãe, consegue uma vaga na Assistência Social e uma renovação de contrato? Te explico quem são chegando em Cuiabá."
Márcia Pinheiro responde:
"Tá, passa pra mim."
Advogado Francisco Faiad que defende Márcia Pinheiro preferiu não comentar a denúncia neste momento. "Não vamos nos pronunciar, até porque não fomos intimados de nada. Estamos estudando as denúncias", disse.
O deputado Emanuelzinho e o vereador Marcrean não atenderam ao telefone e também não responderam as mensagens. O g1 não conseguiu localizar a defesa de Ivone de Sousa.
Investigações contra o prefeito e primeira-dama
As apurações indicam que a maioria das contratações de servidores temporários foi feita para atender interesses políticos do prefeito que está afastado do cargo há 30 dias pela Justiça.
O inquérito foi instaurado pelo MPE com base nas declarações do ex-secretário de Saúde de Cuiabá, Huark Douglas Correia, extraídas do acordo de delação firmado com a 9ª Promotoria de Justiça Cível da capital.
Huark decidiu fazer a delação após descobrir que a Polícia Civil apurava a existência de possíveis irregularidades na contratação de servidores temporários para o Pronto Socorro Municipal de Cuiabá, no período março a dezembro de 2018, época em que ele ocupava o cargo de gestor da Secretaria de Saúde de Cuiabá.
Ele disse que durante o período de sua gestão, a Secretaria de Saúde de Cuiabá teria contratado mais de 250 servidores temporários, cuja contratação, em sua maioria, teria sido realizada para atender interesses políticos do prefeito de Cuiabá e que o próprio Emanuel Pinheiro teria dito ao secretário que as referidas contratações seriam um 'canhão politico', que eram levadas a cabo por indicação política, principalmente de vereadores, e visavam retribuir ou comprar apoio político.
Além disso, a investigação aponta que a folha de pagamento de pessoal da Secretaria de Saúde de Cuiabá era uma das maiores despesas da pasta, chegando ter em média 5.400 servidores e que o número de temporários era superior a dos efetivos.
Emanuel Pinheiro, Antônio Possas e Huark faziam reuniões no escritório ao lado da casa do prefeito, fora do horário de expediente, e na época devido ao alto valor do orçamento de pessoal, foi sugerido um corte de funcionários em torno de 800 a 1.000 funcionários temporários da área meio administrativo, mas isso não aconteceu, declarou Huark.
Comentários