Deserções fazem regime de Kadafi sucumbir aos poucos; confira
Altos dirigentes líbios, ministros, diplomatas e militares renunciaram ou desertaram do regime do general Muamar Kadhafi para expressar sua oposição à violenta repressão contra os manifestantes contrários ao poder.
Governo
O ministro da Justiça, Mustafah Abdel Jalil, demitiu-se para "protestar contra o uso excessivo da força" contra os manifestantes, informou na segunda-feira o jornal líbio Quryna.
O ministro do Interior, Abdel Fatah Yunes, renunciou em solidaridade à "revolução". "Anuncio minha renúncia a todas as minhas funções em resposta à revolução", afirmou o ministro usando uniforme militar, segundo imagens divulgadas na noite de terça-feira pelo canal Al Jazeera.
Liga Árabe
O representante permanente da Líbia na Liga Árabe há mais de uma década, Abdel Moneim al Honi, anunciou sua demissão para unir-se à "revolução e protestar contra os atos de repressão e violência".
Nações UnidasM
Membros da equipe diplomática líbia, encabeçados pelo embaixador adjunto da Líbia na ONU, Ibrahim Dabbashi, pediram ao exército líbio que derrube Muamar Kadhafi, um "tirano" e "genocida".
Militares
Dois caças líbios pousaram na segunda-feira no aeroporto de Valletta (Malta). Os dois pilotos afirmam ter desertado depois de receber ordens de disparar contra os manifestantes em Benghazi.
Embaixadas
O embaixador da Líbia nos Estados Unidos, Ali Aujali, anunciou nesta terça-feira que se nega a servir a um "regime ditadorial", pedindo abertamente a renúncia do líder Muamar Kadhafi, em entrevista à rede americana ABC.
Na Índia, o embaixador Ali Isawi declarou à BBC que havia se demitido por não concordar com a violência "massiva" e "inaceitável" contra a população civil em seu país. Também acusou o regime de Kadhafi de "recorrer a mercenários estrangeiros".
Em Daca, o secretário de Estado de Relações Exteriores de Bangladesh informou ter recebido uma nota da embaixada da Líbia, informando sobre a demissão do embaixador Ahmed A. H. Elimam.
Na Austrália, a embaixada líbia rompeu relações com o regime, segundo o jornal The Australian. "Representamos o povo líbio, mas não representamos mais o regime líbio", declarou o adido cultural Omran Zwed.
Na Malásia, o embaixador condenou o "massacre" de civis e retirou seu apoio ao chefe de Estado. "Já não somos leais a ele (Kadhafi), somos leais ao povo líbio", declarou à AFP o embaixador Bubaker al Mansori. Cerca de 200 líbios protestaram diante da embaixada líbia no país asiático.
Na China, um diplomata pediu demissão e disse que todo o corpo diplomático líbio deveria fazer o mesmo, segundo a Al-Jazeera.
No Marrocos, um diplomata que trabalhava no serviço de imprensa da embaixada em Rabat entregou o cargo para protestar contra "o extermínio diário do povo" líbio.
Na Indonésia, o embaixador líbio, Salaheddin M. El Bishari, anunciou sua demissão porque não pode "tolerar" que o regime de Muamar Kadhafi mate civis, em uma entrevista publicada nesta quarta-feira por um jornal de Jacarta.
Mundo árabe em convulsão
A onda de protestos que desbancou em poucas semanas os longevos governos da Tunísia e do Egito segue se irradiando por diversos Estados do mundo árabe. Depois da queda do tunisiano Ben Ali e do egípcio Hosni Mubarak, os protestos mantêm-se quase que diariamente e começam a delinear um momento histórico para a região. Há elementos comuns em todos os conflitos: em maior ou menor medida, a insatisfação com a situação político-econômica e o clamor por liberdade e democracia; no entanto, a onda contestatória vai, aos poucos, ganhando contornos próprios em cada país e ressaltando suas diferenças políticas, culturais e sociais.
No norte da África, a Argélia vive - desde o começo do ano - protestos contra o presidente Abdelaziz Bouteflika, que ocupa o cargo desde que venceu as eleições, pela primeira vez, em 1999; mais recentemente, a população do Marrocos também aderiu aos protestos, questionando o reinado de Mohammed VI. A onda também chegou à península arábica: na Jordânia, foi rápida a erupção de protestos contra o rei Abdullah, no posto desde 1999; já ao sul da península, massas têm saído às ruas para pedir mudanças no Iêmen, presidido por Ali Abdullah Saleh desde 1978, bem como em Omã, no qual o sultão Al Said reina desde 1970.
Além destes, os protestos vêm sendo particularmente intensos em dois países. Na Líbia, país fortemente controlado pelo revolucionário líder Muamar Kadafi, a população entra em sangrento confronto com as forças de segurança; em meio à onda de violência, um filho de Kadafi foi à TV estatal do país para tirar a legitimidade dos protestos, acusando um "complô" para dividir o país e suas riquezas. Na península arábica, o pequeno reino do Bahrein - estratégico aliado dos Estados Unidos - vem sendo contestado pela população, que quer mudanças no governo do rei Hamad Bin Isa Al Khalifa, no poder desde 1999.
Além destes países árabes, um foco latente de tensão é a república islâmica do Irã. O país persa (não árabe, embora falante desta língua) é o protagonista contemporâneo da tensão entre Islã/Ocidente e também tem registrado protestos populares que contestam a presidência de Mahmoud Ahmadinejad, no cargo desde 2005. Enquanto isso, a Tunísia e o Egito vivem os lento e trabalhoso processo pós-revolucionário, no qual novos governos vão sendo formados para tentar dar resposta aos anseios da população.
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