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Polícia Brasil
Terça - 15 de Fevereiro de 2011 às 17:30

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Dias depois da eleição de Silvio Berlusconi, em 2008, manifestei minha tristeza pelo fato de que 2.761 anos de civilização romana, se contados a partir da fundação da cidade e até o dia em que escrevia, tivessem acabado com a eleição de um cidadão tão mal falado --e não sem razão.

Não podia imaginar que 2.764 anos (ou alguns dias menos) acabassem com a decisão de uma juíza de submeter a julgamento o premier italiano, acusado de corrupção de menores e de abuso de autoridade, exatamente pela tentativa de encobrir o caso.

Berlusconi, salvo erro de memória, é o único dirigente de uma democracia que a revista "The Economist", de impecáveis credenciais liberais, julgou indigno de comandar um país. Não porque fosse aplicar políticas de esquerda, que horrorizariam a revista mas que ela aceita, democraticamente, embora as julgue inadequadas. Indigno pela catarata de processos que o perseguem desde sempre, desde que começou a construir sua imensa fortuna.

Berlusconi passou os quase três anos desde a vitória eleitoral de 2008 tratando de blindar a si próprio contra os processos que rolam há anos. O que não dava para imaginar é que a blindagem se romperia por outro motivo, a prostituição de uma menor.

O processo começa em abril e o chefe do governo pode ser condenado a 15 anos de prisão, se considerado culpado de ambos os delitos.

Berlusconi é tão falso que seus seguidores tratam de desqualificar as críticas a seu comportamento atribuindo-as a um suposto moralismo dos opositores. Sei que valores morais andam meio fora de modo no mundo inteiro, o que transforma a defesa de algo que seria positivo --a moral na condução dos negócios de Estado --em algo negativo.

Mas é falso. Basta citar Nichi Vendola, o segundo líder político mais bem visto na Itália, segundo pesquisa publicada pelo jornal "La Repubblica" na segunda-feira. Aliás, é curioso que o mais querido é um homem do governo, Giulio Tremonti, o ministro da Economia, sóbrio e discreto o suficiente para ser a antítese de Berlusconi, apesar de participar de seu governo.

Política e sentimentos populares não são mesmo para amadores.

Volto a Vendola. Ele é comunista, católico, poeta e homossexual --ou seja, uma combinação que está proibida, por definição, de ser moralista.

O que diz Vendola sobre o "Berlusquistão", expressão que constava em cartaz de protesto da marcha predominantemente feminina de domingo contra o "prêmier", como pronunciam seus concidadãos?

"Berlusconi baseou seu poder na distorção da linguagem e dos valores. Elevou sua retórica machista de cabaré e quartel a idioma da classe dirigente".

Os berlusconistas que falam em "moralismo" da oposição não tiveram pejo em publicar, em "Il Giornale", o diário da família Berlusconi, uma foto de Vendola, nu com amigos, tirada faz 32 anos.

Ironizou o político em entrevista a "El País": "Eu estava em um camping nudista, e, ainda por cima, estava magro e bonito. Temo que a foto aumentará meus apoios".

Vê-se, pois, que a retórica e a ação no "Berlusquistão" são falsas. Alias, Berlusconi finge e mente até quando não precisa para quem não precisa.

Uma vez, ele chegou antes para um encontro com Lula, à margem de uma cúpula qualquer, e puxou conversa com os jornalistas brasileiros que esperávamos ambos. Como eu era o único que falava italiano, mal mas falava, puxei o assunto Ronaldinho, então no Barcelona mas que o Milán de que Berlusconi é dono pretendia contratar.

Berlusconi alegou que Ronaldinho era muito caro para um homem pobre como ele disse ser. E ainda reclamou de que pagava uma fábula de impostos. Se eu tivesse uma nota de 100 liras no bolso (que já não existiam mais), teria dado a ele, com muita pena. Se não é possível vencer a hipocrisia, usemô-la também.

PS - "Berluquistão" é obviamente uma expressão que se refere à degradação da mulher nos anos Berlusconi, como ocorre em países como o Afeganistão.






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