Maior fornecedora da Sejusp, Rodrigo Peres teve cozinha interditada no interior, mas continua fornecendo alimentação na grande Cuiabá
Empresa perde contrato por refeições "impróprias"
Problemas parecidos também foram detectados em Cuiabá, onde a empresa prepara o café, almoço e jantar para cerca de 3,8 mil presos. Porém, o fornecimento está sendo feito normalmente. Os 2 contratos que ela possui com a Secretaria do Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), um englobando a Penitenciária Central do Estado, o Centro de Ressocialização de Cuiabá, Cadeia Pública Capão Grande e Presídio Militar de Santo Antônio, e outro para o Centro Sócio Educativo (Pomeri), vencem em 23 de junho de 2011.
As irregularidades foram constatadas em vistorias feitas periodicamente pela Gerência de Serviços de Alimentação do Sistema Prisional. Em Água Boa (730 km ao leste de Cuiabá), as instalações foram consideradas inadequadas, a limpeza era precária e o esgoto jogado na rua.
Segundo a nutricionista e responsável técnica Cintia Nara Selhorst, até insetos foram encontrados no local. "Havia alimentos deteriorados e alguns sem data de validade. Por isso decidimos levar a situação ao conhecimento do Ministério Público, que interviu e pediu a interdição".
Medidas para solucionar os problemas já tinham sido cobradas pela Vigilância Sanitária do município. Conforme o fiscal Jader Bahia, a empresa tinha sido notificada por diversas vezes, mas não atendeu todas as exigências. "Existe um manual de normas que as empresas devem seguir e esta (Rodrigo Peres) não atendeu todas elas, principalmente no que tange às condições de limpeza".
Bahia explica que, apesar de não encontrar comida estragada, as condições em que eram manipuladas ofereciam risco à segurança alimentar. "Como ela fornecia a refeição de um grande número de pessoas, nossa preocupação era com a qualidade desta comida".
Grande Cuiabá - Em relação à situação da unidade em Cuiabá, a Gerência de Serviços de Alimentação revelou que não pode tomar nenhuma medida, já que o contrato está sendo cumprido. Porém, reconhece que a segurança alimentar dos presos está comprometida. "O que nós detectamos foi o não cumprimento de algumas normas da Anvisa, que são aplicadas para todos os estabelecimentos que trabalham com manipulação de alimentos para transporte. Sem estas adaptações, o processo de higienização é comprometido e há riscos de contaminação cruzada, seja pelos ambientes ou pelas pessoas que ali trabalham", diz Cintia Nara.
Ainda, segundo a nutricionista, a fiscalização e notificação para que as adaptações sejam feitas são de responsabilidade da Vigilância Sanitária do município.
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS), através da Coordenadoria de Vigilância Sanitária (Visa), por meio de nota, informou que o estabelecimento Rodrigo Peres Pereira Cia. Ltda, que responde pelo nome fantasia Marmitaria Boa Esperança, em inspeção higiênico sanitária recebeu o alvará/2009 de funcionamento.
Em abril deste ano, foi realizada uma denúncia direcionada ao recinto. A Vigilância Sanitária fez uma nova inspeção e constatou irregularidades. Foi entregue o auto de infração, notificando com prazo de 72 horas para correção das não conformidades. Seis dias depois, foi realizada uma nova inspeção que constatou o cumprimento de termo de notificação.
De acordo com a nota, em inspeção realizada no dia 21 de maio, foi constatado que o estabelecimento encontra-se apto a receber o alvará sanitário/2010.
A Vigilância Sanitária afirma ainda que não recebeu nenhuma nova denúncia sobre o estabelecimento citado e que atende a todas as denúncias oficializadas para nova inspeção e atuação no caso de irregularidades.
Nova licitação - Com a interdição do estabelecimento em Água Boa, uma outra empresa assumiu o serviço na Penitenciária Major Zuzi, por meio de um contrato temporário de emergência. Uma nova licitação já foi feita, mas a empresa Rodrigo Peres não pode concorrer, já que uma decisão administrativa, publicada no Diário Oficial no dia 10 de setembro de 2010, proibiu a mesma de participar de processos licitatórios do Estado por um período de 6 meses. Inicialmente, a restrição valeria por 2 anos, mas a empresa recorreu e conseguiu reverter para 6 meses.
A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) considerou graves os problemas no fornecimento, já que "poderiam ensejar motins e rebeliões, colocando também em risco os servidores do Sistema Prisional e a população carcerária com a ingestão de alimentação imprópria para o consumo", diz parte do despacho publicado em Diário Oficial na última semana.
Foi o que ocorreu em julho de 2008, quando os menores abrigados do Centro Sócioeducativo fizeram um motim alegando que a comida estava estragada. Um mês depois um laudo encomendado pela própria empresa apontou que a alimentação, servida para aproximadamente 3,5 mil pessoas naquele dia, estava própria para o consumo.
Situação semelhante foi registrada na Penitenciária da Mata Granda, em Rondonópolis (250 km ao sul de Cuiabá), em abril de 2007. Cerca de 380 presos se recusaram a entrar nas celas no final do dia, como forma de protesto pela precária qualidade da comida servida no dia. Havia suspeita que o feijão estivesse estragado. Eles só retornaram aos cubículos quando a empresa trocou todas as marmitas por sanduíches de pão com mortadela.
Sistema - Hoje, 21 empresas fornecem alimentação para os cerca de 11,2 mil presos em Mato Grosso, distribuídos em 64 unidades prisionais. A seleção dos fornecedores é feita por meio de pregões, promovidos pela Secretaria de Administração (SAD). O critério da seleção é o menor preço ofertado, dentro do teto estabelecido pela SAD para a etapa alimentação.
O último pregão foi feito em 2008. A empresa "O Universitário Restaurante, Indústria, Comércio e Agropecuária LTDA" chegou a vencer o contrato referente às unidades prisionais de Cuiabá, Várzea Grande e Santo Antônio de Leverger. Porém, ela foi desclassificada do processo licitatório por ter apresentado preço considerado impraticável, de R$ 5,7 para cada etapa de alimentação. Com isso, a Rodrigo Peres, que era a segunda colocada, assumiu o serviço.
Atualmente, o custo da refeição diária para cada preso varia de R$ 6 a R$ 10. O menor valor é praticado em Cuiabá, de R$ 6,88 dia. O pagamento é feito de acordo com o número de refeições distribuídas no mês.
Outro lado - A reportagem entrou em contato, por telefone, com a empresa Rodrigo Peres Pereira. A informação repassada é que o proprietário estava viajando e só deve se pronunciar sobre o assunto após ser notificado sobre as últimas decisões em relação ao processo de Água Boa.
Comentários