Dedicado aos agricultores do Brasil, texto flexibiliza perigosamente exploração de reservas para ambientalistas, mas satisfaz, em parte, produtores
Relatório de Rabelo esquenta debate em MT
Tradicionalmente polarizada, a discussão sobre uma nova legislação ambiental brasileira costuma se dividir entre a bandeira ambientalista e a necessidade de assegurar uma produção agropecuária que continue batendo seus recordes. Em Mato Grosso, não podia ser muito diferente: entre ambientalistas e produtores daqui, a divergência também impera quando o assunto é a reforma do Código Florestal. O projeto tramita no Congresso e o voto do relator, deputado Aldo Rebelo, já provocou a indignação de um lado e aceitação com ressalvas do outro, na última semana.
Enquanto os ambientalistas apontam que o Código, no geral, se pauta por uma permissividade perigosa para os recursos naturais do Estado, o setor agropecuário se diz razoavelmente satisfeito com o que dispõe o texto da maneira como está ficando, mas não sem ainda esperar que o governo colabore para aliviar os custos da regularização ambiental.
O motivo da polêmica é um documento de 270 páginas que traz reformas ao atual Código, datado de 1965, e ficou sob responsabilidade de uma comissão especial da Câmara dos Deputados. A comissão pode iniciar a votação no próximo dia 23, mas pressões políticas podem redundar em adiamentos - e o ano é eleitoral. Caso isso aconteça, será novamente arrastado um embate antigo, mas que se reacendeu com a divulgação do relatório de Rebelo. Em linhas gerais, a repercussão esta semana sobre as mudanças propostas no Código (ver matéria) mais uma vez se marcou com figuras de ambientalistas e ruralistas devidamente representados.
Em Mato Grosso, por exemplo, o Instituto Centro de Vida (ICV) não só considera o modelo em questão um retrocesso para o Estado, como também reprova a própria forma como os debates sobre o Código estão sendo conduzidos. Segundo o coordenador executivo Laurent Micol, as audiências públicas foram voltadas para ruralistas. O próprio relatório do projeto de lei (nº 1876/99) leva escrito, à segunda página, “Dedicado aos agricultores brasileiros”.
Micol critica a visão do setor produtivo, que desconsideraria o trunfo que é o rigor na preservação dos recursos naturais. “O Estado não precisa de novos desmatamentos. O Código hoje não impõe nenhum limite ao crescimento da produção. Precisa de ajustes, mas não para torná-lo mais permissivo. Com técnicas de manejo e investimentos, já podemos aumentar a capacidade”. O ambientalista também aponta que o próprio mercado externo exige rigor para a conservação ambiental no Brasil. Cumpridas, tais restrições proporcionam ao produto nacional uma espécie de selo de qualidade e responsabilidade socioambiental, valor que não deve deixar de ser agregado.
PRODUÇÃO - Mas a produção, lá fora, não funciona bem assim. Quem chama a atenção é um dos diretores da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja), Ricardo Arioli Silva, mencionando que conceitos como reserva legal (RL) são até difíceis de traduzir no exterior.
Ele entende que o Código Florestal teve agora, em seu relatório, alguns avanços. São pontos como a isenção de reserva legal a pequenos produtores e a maior autonomia dos estados para decidir sobre limites dessas áreas e das APPs; fora o próprio fato de que ficará para trás um Código “incumprível”, que inevitavelmente criminaliza produtores. “Mas Mato Grosso cresce a níveis chineses por causa disso”, enfatiza. “No geral, o texto resolve velhos conflitos que apareceram em função de interpretações equivocadas do Código antigo”.
Já para o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária (Famato), Rui Prado, a discussão do Código traz de imediato a preocupação com os custos: por quanto sairá aos produtores o cumprimento das exigências para regularização ambiental? Segundo Prado, levantamento da Famato aponta que produtores mato-grossenses arcariam com um total de R$ 7,7 bilhões para regularizar todas as propriedades - valor insustentável para o setor, similar ao total da arrecadação do Estado.
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