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Domingo - 13 de Junho de 2010 às 07:23
Por: Jean Campos

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Presidente do TJMT, desembargador José Silvério
Presidente do TJMT, desembargador José Silvério

Há menos de quatro meses no mandato tampão da presidência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), o desembargador José Silvério Gomes continua empenhando na missão resgatar a credibilidade do Poder Judiciário.

Após assumir o cargo em razão da aposentadoria compulsória do então presidente, desembargador Mariano Travassos, - acusado com outros nove magistrados de suposta participação em desvio de recursos do Tribunal para uma cooperativa de créditos ligada à Maçonaria – Silvério se deparou com problemas referentes ao preenchimento das vagas em aberto e, também, com novas denúncias envolvendo magistrados. “As denúncias são graves. Fica ruim para a instituição ter nome de desembargadores envolvidos nas denúncias de venda de sentenças”, disse o presidente do TJ.

Com 30 anos de magistratura, o desembargador se sente incomodado quando as denúncias contra uma pequena parcela acabam recaindo sobre 220 juízes e 21 desembargadores que atualmente compõem o Judiciário estadual. “Não serão poucos que irão ‘lamear’ toda a Justiça”, afirmou.

Nesta entrevista, José Silvério também fala sobre a greve dos servidores, ação contra nepotismo e garante que “o Tribunal vai cortar na carne” os desvios de conduta que foram provados.

Ao lembrar que, dos últimos quatro presidentes do Tribunal três foram afastados da Magistratura, Silvério não esconde sua preocupação. “É um cargo difícil, complicado, e vou pedir a Deus que quando terminar o meu mandato eu não saia com um processo nas costas”, confidenciou. Questionado sobre a possibilidade de se reeleger presidente do Tribunal de Justiça, Silvério soltou: “Deus me livre!”.


Diário de Cuiabá - O senhor assumiu a presidência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ) num momento turbulento. Que impressão teve desses quase quatro meses?

José Silvério – Pelo que já passei em termos de administração - já fui presidente do TRE, diretor de fórum no interior do Estado, na Capital -, eu imaginava que administrar o Tribunal de Justiça fosse parecido. Mas percebi que aqui é bem mais complicado. São mais de cinco mil servidores. Temos as denúncias que estão veiculando, temos a greve. Está sendo bem mais complicado do que eu imaginava.

Diário de Cuiabá - Em um encontro entre advogados e juízes, há cerca de dois meses na OAB, o senhor chegou a chorar ao falar sobre as denúncias contra magistrados...

José Silvério – Porque não davam nome, jogavam o nome de todos na lama. Queremos nomes, pelo amor de Deus. Você sai aí fora, fala que é desembargador, logo dizem que você vende sentença.

Diário - Naquele momento, a operação Asafe ainda nem havia sido desencadeada. Qual o sentimento do senhor hoje ao ver tantas suspeitas de venda de sentenças contra colegas de Magistratura?

Silvério – Veja bem, o que temos por enquanto é oficioso. Solicitamos oficialmente à ministra Nancy Andrighi, do STJ, o que tem sobre membros do Judiciário de Mato Grosso para também instaurarmos procedimentos. Aí vamos apurar. Por enquanto, o que se vê na imprensa é lobista falando com advogado, que está acertando com determinado magistrado venda de sentença. É complicado, acredito que a ministra vai apurar isso muito bem apurado porque as denúncias são muito fortes. E não se pode cometer injustiça. Por enquanto, o que se tem é lobista falando com advogado. Lobista com lobista. Não aparece magistrado fazendo acerto. Aparecem filhos, assessores... Já tem nomes, o que já começa a separar o joio do trigo.

Diário – Mas a presença de filhos e assessores de magistrados no esquema investigado não seria uma forma de atuação indireta desses juízes e desembargadores?

Silvério – Pois é. É isso que precisamos saber. Eu tenho filho, mas não sei se ele está me vendendo lá fora. Ele pode estar vendendo e é ele que está tirando proveito, usando meu nome. E aí? Agora, é evidente que temos que escolher melhor as pessoas com quem iremos trabalhar.

Diário - O senhor, como presidente do TJ, teve acesso ao inquérito da operação Asafe? Se teve, o que achou das investigações?

Silvério – Ainda não. Vamos receber oficialmente o material do STJ.

Diário – Como o senhor tem se mantido informado?

Silvério – Pela mídia. Se o processo corre em segredo de Justiça, só a ministra pode liberar o inquérito.

Diário – E o que o senhor tem achado das notícias veiculadas sobre o assunto?

Silvério – As denúncias são graves. Fica ruim para a instituição ter nome de desembargadores envolvidos nas denúncias de venda de sentenças. Mas o nome dos desembargadores aparece na boca de lobistas. Não se sabe se participaram mesmo ou não. Tanto que a ministra do STJ ainda não afastou ninguém, está sendo cautelosa.

Diário - A Polícia Federal aponta para a participação efetiva da advogada Célia Cury, esposa do desembargador José Tadeu Cury, na negociação de sentenças. O senhor conhece Célia Cury? Já chegou para o senhor alguma informação sobre a atuação dela no TJ?

Silvério – Conheço, mas não tenho amizade. Possuo com ela relacionamento institucional. Sou desembargador, algumas vezes já a vi aqui no Tribunal, mas não tenho amizade íntima.

Diário – O senhor já teve notícia de algum fato envolvendo suposta negociação de sentença por intermédio de Célia Cury?

Silvério – Não. Confesso que essas informações que estão publicando envolvendo o nome dela, pra mim, foram surpresa. Sabia que ela advogava, tinha escritório. Mas não para realizar esse tipo de coisa que estão noticiando.

Diário - O juiz Leopoldino Marques do Amaral disse, em carta divulgada em 1999, que era difícil para advogados sérios competirem com certas esposas de magistrados. Como evitar que esposas – ou parentes de desembargadores – atuem no TJ?

Silvério – Vamos por parte. Se a esposa do juiz ou desembargador for advogada, com carteira da OAB, ela tem todo o direito de advogar. Advogar. Agora, fazer lobby e usar nomes pra ter privilégio, aí não pode. Isso deve ser denunciado.

Diário - O desembargador Rui Ramos disse na sessão do TRE, na terça-feira, que em 24 anos de Magistratura nunca viu momento tão delicado para a Justiça mato-grossense. O senhor tem o mesmo sentimento?

Silvério – Realmente passamos momentos delicados na época do Leopoldino. Mas agora - com a aposentadoria de dez magistrados, depois mais um e mais essa operação envolvendo membros da Magistratura – isso tudo nos coloca numa situação delicada. A instituição tem que lidar com isso com muito cuidado para resgatar sua credibilidade. Todo mundo quer saber se vai ter uma decisão justa.

Diário - A morte do juiz Leopoldino Marques do Amaral também foi um momento grave, não é mesmo?

Silvério – Eu não lembro direito porque eu era juiz e não tinha muito acesso aos procedimentos. Eu não tinha relação com ele. Lembro que foi uma situação de comoção, um juiz que morreu denunciando o Tribunal. Os membros do Tribunal daquela época já se aposentaram.

Diário – Quando foi presidente do TRE o senhor chegou a ter conhecimento de denúncias similares às investigadas atualmente?

Silvério – Nos dois anos em que fiquei lá, não tive conhecimento de denúncias como as que estão sendo faladas hoje. Tanto que, na época cassamos o mandato de Chica Nunes, Pedro Henry e ninguém alegou que houve venda de sentenças.

Diário - Qual o lado bom e o lado ruim deste momento no Tribunal?

Silvério – Lado bom não tem nenhum. Desde que eu assumi a presidência até agora, não tivemos como sair dos reflexos negativos à imagem da instituição porque a cada dia é uma nova coisa. Mas, estamos trabalhando normalmente. As sessões estão sendo realizadas normalmente, os juízes trabalhando normalmente... Nós temos problemas mais com a imagem do Tribunal. Calúnia, difamação. Quando jogam todos na lama, passa a ser crime porque muita gente não tem nada a ver com essa situação. É difícil.

Diário – Está difícil? Além disso, o senhor tem que administrar a greve dos servidores.

Silvério – Pois é. A greve é outra situação difícil. Há seis meses houve uma outra greve. Infelizmente o Tribunal não pode atender a pretensão deles, então não sei onde vai parar esta greve. Vou dizer uma coisa: quero que o Conselho Nacional de Justiça venha fazer uma verificação porque as nossas contas estão corretas, não tem nenhum pagamento irregular, nenhum pagamento privilegiado. Quero que o CNJ venha, verifique e mostre que não temos como atender as solicitações. O não-atendimento das solicitações acontece por falta de meios. Querem receber um passivo de dez anos atrás que somam R$ 213 milhões. Onde eu vou arrumar isso? Aí querem que eu vá no banco fazer um empréstimo para pagá-los. A gerente de um banco nos mostrou que só os juros deste empréstimo podem chegar a R$ 5 milhões, que já são descontados diretamente do valor repassado pelo Estado. Hoje, o repasse do Governo, que é R$ 32 milhões, está quase todo engolido pelo pagamento da folha. O Tribunal pode pagar o custo da dívida do empréstimo? Hoje não pode! Outra reivindicação dos servidores é que eles querem ganhar auxílio-alimentação de R$ 500 mensais. Seriam outros R$ 3,5 milhões. Onde vamos arrumar esse recurso? Teria todo prazer de atender as reivindicações. O servidor ganha mal, temos que reconhecer isso, o direito de greve é constitucional. Agora, a greve é justa? Essa é outra questão que o Tribunal vai decidir.

Diário - Não seria a hora de acabar com todos os vícios do Tribunal? Fazer uma faxina definitiva, incluindo aí nepotismo, privilégios, venda de sentenças?

Silvério – Estamos levantando todas as denúncias de nepotismo. O nosso conselho interno está trabalhando com isso, apurando, e pessoas estão sendo demitidas. Mas essa é uma ação silenciosa. O levantamento não ocorre apenas com parentes de magistrados que, identificados, foram todos afastados. Servidores também são inspecionados.

Diário – O Tribunal também apura casos de nepotismo cruzado?

Silvério – Tudo. Mas o cruzado é complicado porque teria que ver que tipo de cruzamento. Eu não conheço nenhum filho de desembargador que trabalhe em gabinete de deputado ou conselheiro, nem mesmo o inverso. Também não temos denúncias sobre isso.

Diário - Como fazer para resgatar a imagem do Judiciário, que ficou seriamente abalada?

Silvério – Se fosse somente aquele primeiro episódio, do afastamento dos magistrados, eu acredito que já tinha sido feito um trabalho no sentido de resgatar a imagem do Judiciário. Mas, com as novas denúncias, essas operações, ainda não tivemos como fazer um novo trabalho. Isso por enquanto. O que temos que fazer? Limpar. Tem gente aqui que está vendendo sentença, negociando, comprando? Limpa esse povo daqui! Aí mostramos para a sociedade que quem ficou aqui é gente séria, quem tem vontade de trabalhar, e que a sociedade pode confiar. Sabemos que esse é um trabalho difícil, que não muda de uma hora pra outra. Só muda com muito trabalho e vamos mostrar à sociedade que queremos mudar.

Diário - O que o presidente do Tribunal de Justiça tem a dizer à sociedade e aos advogados sobre a confiabilidade da Justiça mato-grossense?

Silvério – É certo que existem denúncias, mas são coisas pontuais. Denúncias de venda de sentença pesam contra quatro magistrados. Nós temos 220 juízes trabalhando, 21 desembargadores e não serão poucos que irão “lamear” toda a Justiça. Continuamos trabalhando com celeridade, honestidade e vamos apurar os desvios. Aqueles que forem provados, o Tribunal vai cortar na carne. Isso eu não tenho dúvida. Mas não será de uma hora para outra, será respeitado o devido processo legal. Não estamos aqui para compactuar com ninguém qualquer desvio. Precisamos preservar a instituição porque agente passa e ela fica.

Diário – Se o senhor pudesse se reeleger presidente...

Silvério – Deus me livre!

Diário – Seria candidato na próxima eleição do TJ?

Silvério – Se eu soubesse que era isso aqui, eu não teria vindo. Muito menos se reeleger presidente. É uma coisa que não passa nem em sonho em minha cabeça! Só quero que Deus me ajude a terminar bem este mandato. Preste atenção: dos quatro últimos presidentes, três foram afastados pelo CNJ. O único que se aposentou voluntariamente foi o desembargador Paulo Lessa. É um cargo difícil, complicado, e vou pedir a Deus que quando terminar o meu mandato eu não saia com um processo nas costas.






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