Nas vitrines e nas gôndolas, os valores terminados em 90 ou 99 são a maioria; clientes não estranham o comportamento
Estratégia do comércio seduz o consumidor mais desatento
Uma prática comum nos estabelecimentos comerciais é o uso dos centavos para determinar o preço dos produtos. Os valores "quebrados" são os preferidos dos lojistas como forma de atrair consumidores. Esta estratégia de mercado é responsável por seduzir a maioria dos compradores. "Por exemplo, sobre o valor de R$ 19,99, o consumidor leva em consideração somente o R$ 19, enquanto que o comerciante consegue os R$ 20. E na maioria das vezes o cliente não pede o 1 centavo de troco", observa o economista Anaor Carneiro.
Ele analisa que essa jogada de marketing cria uma falsa expectativa no consumidor. "É a ilusão de que o cliente está levando o produto por um preço mais barato". De acordo com o economista, a composição dos valores dos produtos inclui tanto os custos quanto a rentabilidade do comerciante. Porém, ele aponta que ainda há o componente emocional, que mexe com a sensibilidade do consumidor, além da marca do produto. "Nesse mix comercial, que compõe os preços das mercadorias, o lojista consegue ganhar a venda".
Para ele, a condição de que o consumidor despreza os centavos faz com que o comerciante continue praticando essa estratégia de mercado. Carneiro ressalta que uma pequena parcela da população pede o troco. "De cada mil consumidores, 1 reclama o seu troco". Em tese, todo preço terminado em "9" ou "90" é enganoso. "Esta é a mais suja das táticas de marketing usualmente utilizadas pelo comércio de uma maneira geral, e que atinge cada vez mais produtos à venda", diz uma campanha lançada na internet contra preços enganosos.
E não é difícil perceber essa prática no comércio mato-grossense. Nas ruas de Cuiabá, por exemplo, as vitrines, os carros de som e vendedores ambulantes estampam e anunciam valores como R$ 19,99, R$ 20,99, R$ 34,99 e muitos outros, iguais apenas nas duas casas após a vírgula. "É uma forma de atrair clientes. Faz parte da política da empresa", diz o gerente de vendas de uma loja de utilidades, Rodrigo da Silva.
Moedas em falta
Estratégia ou não, o fato é que os comerciantes se aproveitam do descuido do consumidor e da condição do mercado, e explica que há falta de moedas para o troco - principalmente a de 1 centavo. Geralmente, produtos (com preços terminados em 9 centavos) podem ser pagos com uma única cédula, sendo as de R$ 1, R$ 2, R$ 5, R$ 10). O consumidor mais exigente e consciente dos seus direitos, certamente se irrita na hora de receber -ou deixar de receber -o troco, simplesmente por falta de moedas no caixa.
Os valores de 5, 10, 25, 50 centavos e de 1 real geralmente sobram no comércio. Mas a menor delas, a de 1 centavo, está literalmente entrando em extinção. Informações do Banco Central mostram que a quantidade atual de moedas de 1 centavo circulando no mercado nacional é inferior às demais. Até quinta-feira (27), 3,190 bilhões de moedas de 1 centavo estavam em circulação no país, contra 3,712 bilhões de 5 centavos, e 4,177 bilhões de 10 centavos.
Basta uma simples ronda no comércio que é possível perceber essa realidade. A comerciante Andréia Reveles afirma que há muita dificuldade de encontrar a moeda de 1 centavo no mercado. Além disso, a gerente de uma loja de roupas, Edilaneide Barbosa, diz que uma minoria dos consumidores pede o troco de centavos. A auxiliar de escritório Zilandia Luiza dos Santos, confirma que o dinheiro de menor valor não é considerado na hora de pagar pela compra. Geralmente, as pessoas ao comprarem a mercadoria não recebem o troco completo, muitas vezes, por "vergonha" de reivindicar o 1 centavo que tem direito.
A estudante Suely Gomes de Almeida afirma que esquece de pedir o centavo de troco. Mas a gerente de uma loja de bijuterias, Josinete Moraes, conta que o troco para os consumidores que pedem o centavo é sempre viabilizado. "Se não temos, oferecemos outros produtos". Essa situação chega a ser um paradoxo: as lojas colocam grande parte de seus produtos com preços terminados em 9 centavos, e praticamente nunca têm as moedas de 1 centavo para fornecer aos seus clientes na hora do troco. No entanto, há lojistas precavidos que escapam dessa regra.
A gerente Maria Rosa Tomás dos Santos diz que as os valores das mercadorias são inteiros. Ela conta que essa atitude auxilia no troco. "Mesmo trabalhando com produtos que tem valores menores, procuramos arredondar os preços". Para o médico João Bosco Fernandes, a devolução do troco é algo fundamental, independentemente do valor. Ele diz que sempre solicita o troco. "Mesmo que seja de 1 centavo". O consumidor explica que dessa maneira consegue juntar dinheiro. "É de grão em grão que consigo uma boa quantia. Cada centavo faz muita diferença".
Conselho - O economista Anaor Carneiro explica que é direito do consumidor solicitar sempre o troco. Ele explica que se o lojista cobra um determinado valor pelo produto é certo que o cliente pague o correspondente. "Se a loja não tiver o troco para repassar ao cliente é melhor que não aplique valores quebrados nos produtos". Carneiro diz também que o consumidor não deve aceitar mercadorias como troco. "Não é nem pelo valor do dinheiro em si que se deve pedir o 1 centavo de troco. É muito mais pelo fato de se sentir lesado, e ainda ser conivente com essa tática abusiva e desrespeitosa do mercado". Ele afirma ainda que o consumidor não deve ter vergonha de pedir o troco, seja qual for o valor.
Inadequadas - Conforme o Banco Central as moedas inadequadas à circulam são aquelas tortas, perfuradas, desfiguradas ou com danos de qualquer outra natureza. Desta forma, as instituições financeiras bancárias devem acolher do público as moedas danificadas a serem encaminhadas ao BC para exame. Ao receber moedas danificadas, a instituição financeira bancária deverá fornecer recibo ao interessado e informá-lo, posteriormente, do resultado do exame, ressarcindo-o no valor que eventualmente lhe couber.
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