A presença de mais juízes federais na composição dos Tribunais Regionais foi defendida pelo juiz federal Julier Sebastião da Silva
Julier pede mais juízes federais no Pleno do TRE
As decisões de grande repercussão da Justiça Federal sempre são assinadas por ele. Por coincidência - e porque são poucos juízes federais em Mato Grosso -, muitos casos polêmicos, envolvendo políticos e altas personalidades, caem na mão do juiz Julier Sebastião da Silva.
Entre as polêmicas recentes estão o caso do maquinário do governo. Sob a suspeita de superfaturamento e outras irregularidades, o juiz determinou que as 705 máquinas distribuídas aos 141 municípios voltassem ao pátio de Cuiabá. Instância superior reformulou a decisão de Julier.
Há menos de dois meses ele também esteve à frente da operação Hygeia, que prendeu temporariamente pessoas acusadas de desvio de dinheiro da Funasa. Entre esses, gente ligada ao PMDB, assessores diretos do deputado federal Carlos Bezerra.
Na operação Jurupari, foram presos irmão, genro e esposa do deputado José Riva (PP). Um levante político começou, acusando-o de conluio a fim de eleger o ex-procurador Pedro Taques. Julier, do alto de sua cadeira de juiz, prefere não fazer comentários sobre o assunto.
Sobre a crise que se abate no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) pela suposta venda de sentença, o juiz considera o fato lamentável, mas afirma não ter escutado sobre situações que comprovem as acusações. Entretanto, defende a maior participação de juízes federais no Pleno eleitoral.
Diário de Cuiabá - Como o senhor interpreta as declarações de que a operação Jurupari tem caráter político?
Julier Sebastião da Silva - Todo processo criminal que redunda em decisões judiciais parte do princípio da demanda. A Polícia Federal, dentro do inquérito regularmente instaurado, e o Ministério Público Federal, como dono da ação penal, formularam requerimentos que foram analisados e deferidos pela Justiça, dentro daquilo que prevê o marco constitucional.
Diário - O procurador Mario Lúcio Avelar disse que a operação Jurupari é uma continuidade da Curupira. Isso não significa dizer que a Curupira falhou em alguma coisa? Afinal, os crimes ambientais continuaram a ocorrer.
Julier - O problema não é da operação ou dos agentes de repressão do Estado. O problema são os crimes continuarem. O crime é inerente ao homem, ou seja, existe desde que o homem conseguiu caminhar em pé pela Terra e vai acompanhar toda a raça humana ao longo de sua existência. Portanto, cabe ao Estado, obviamente, através de seus órgãos de repressão próprios, estarem alertas, vigilantes e tomarem as providencias quando constatarem a existência de qualquer infração penal.
Diário - A Polícia Federal diz que poucas vezes uma operação conseguiu reunir tantas provas contra os acusados como agora. Para o delegado Franco Pirazzoni, as provas são contundentes. O senhor também percebe desta forma?
Julier - Cabe ao juiz analisar provas quando ele for sentenciar o processo. Então é nesse momento que são valoradas todas as provas, sejam elas periciais, documentais ou testemunhais, e é nesse momento que cabe ao juiz analisar. Do ponto de vista deste processo especificamente, por hora o que temos ainda é apenas inquérito policial inconcluso e que terá seus desdobramentos, obviamente. Portanto, ainda não é hora para a Justiça avaliar as provas, isso cabe à Polícia Federal, ao Ministério Público e ao juiz, no memento adequado reservado pelo Código do Processo Penal.
Diário - Políticos como Pedro Henry têm tecido críticas duras ao senhor, ao ex-procurador Pedro Taques e ao procurador Mário Avelar. Como o senhor interpreta tais críticas?
Julier - Não tenho nada a comentar sobre isso.
Diário - Mas ele tem acusado o senhor reiteradamente de conluio, de usar a Justiça...
Julier - Não vou comentar nada sobre isso.
Diário - Como o senhor enxerga a crise que existe dentro do TRE por conta da suspeita de venda de sentenças?
Julier - Acho que é um fato lamentável do ponto de vista democrático, institucional, mas que deve ser apurado pelos órgãos competentes para isso, de acordo com a Constituição. O que tenho visto pela imprensa apenas é que Superior Tribunal de Justiça está dando ensejo às apurações necessárias. Há que se confiar no STJ na apuração dos fatos e, eventualmente, no esclarecimento e julgamento daquilo tudo que for apurado dentro da investigação que corre lá.
Diário – O senhor também já ouviu histórias sobre venda de sentenças no TRE?
Julier - Eu compus o Tribunal Regional Eleitoral entre os anos de 1998 e 1999. Desde aquele período eu não tenho integrado a Corte Eleitoral do Estado. Então a rigor eu não teria maiores elementos para fazer comentários nesse aspecto. O que sei, volto a frisar, é o que está aí na imprensa, e pelo que li já há uma investigação formal instaurada pelo STJ, a quem obviamente cabe a responsabilidade de conduzir e apurar os fatos.
Diário - O que seus colegas de Justiça Federal, como doutor o Jefferson Schneider e César Bearsi, comentam sobre o trabalho no TRE?
Julier - Não converso com os colegas sobre esse tipo de questão.
Diário - Aliás, não seria hora de rever a composição do TRE? Não é contraditório nomear para um cargo temporário de juiz alguém que é advogado? Dar poder de julgar a alguém cuja função é defender?
Julier - Os problemas envolvendo as cortes eleitorais não são recentes no país. A Justiça Eleitoral é um ramo do poder Judiciário da União, mas que em razão das peculiaridades tem sido majoritariamente integrada por magistrados estaduais e, observando-se a regra do quinto constitucional, pelos advogados. A rigor, acho que deveríamos ter uma participação maior dos juízes federais na composição do pleno, já que trata de um ramo do poder Judiciário da União. Então a maior efetividade, independentemente de méritos dos colegas estaduais, é só uma questão do ponto de vista estritamente institucional. Tratando-se do ramo do Judiciário da União, é obvio que não poderíamos ter apenas um juiz federal nessa composição. Inclusive, durante o debate sobre a Emenda Constitucional 45, que trata da reforma do Judiciário, esse era um dos aspectos que Associação dos Juízes Federais havia encampado e levado até o Congresso. Houve senador apresentando emendas no sentido de que seja aumentada a composição do TRE pelos juízes federais. Ao invés de um, que sejam dois ou três juízes federais. Sem qualquer demérito à OAB, mas apenas observando a natureza do ramo do poder.
Diário - Mas o senhor não acha então que essas vagas destinadas a advogados deveriam ser extintas?
Julier - Essa discussão tem que ser feita no campo do Quinto Constitucional. Os mandatos no TRE são temporários, são apenas mandatos. Ou seja, juízes ficam dois anos, sejam eles juízes federais, desembargadores e os advogados que vêm pelo Quinto Constitucional. A questão maior é na composição do Quinto Constitucional. Há a viabilidade disso? Isso é importante para a sociedade? Isso é importante para o poder Judiciário? É importante para a advocacia? Ou não é importante e tem resultado em graves defeitos de composição? Por exemplo, nos tribunais superiores. O STJ deveria ter um terço de juízes federais, um terço de magistrados estaduais e um terço de Quinto Constitucional. A magistratura federal hoje no STJ não tem o terço reservado aos magistrados federais. Porque advogados entram pelo quinto nas cortes federais e acabam entrando nas vagas de juízes federais, de desembargadores federais. Isso tem causado um certo desequilíbrio do ponto de vista daquela corte e por isso vem sendo parte de questionamento por parte da Associação de Juízes Federais.
Diário – Por que, entre todos os juízes federais, é o senhor quem sempre está à frente dos casos mais polêmicos?
Julier - Juiz não procura processo. Ele não pode deixar de decidir. Se ele recebe um processo, ele tem que decidir, não pode dizer “não posso”. Constitucionalmente, o juiz está aí para decidir. Sendo provocado, ele deve responder à provocação judicial que lhe fora feita. Quem recorre ao Judiciário espera que o juiz decida. Existindo processo em que é demandada a prestação judicial, o juiz deve decidir e assim eu tenho feito.
Diário - Uma coincidência então os mais polêmicos terem caído nas suas mãos?
Julier - É uma sessão judiciária pequena, em comparação com outras. Em Brasília tem mais de 20 varas, em Belo Horizonte... Aqui são apenas seis varas na capital, sendo duas delas especializadas. Portanto, temos só quatro varas de feitos gerais. Isso redunda em 25% na distribuição para cada vara.
Diário - O desembargador Tourinho Neto, do TRF, tem um histórico de reverter suas decisões. O senhor vê algum motivo pessoal ou o trabalho dele é meramente técnico?.
Julier - Nossa Constituição assegura autonomia e independência aos membros do poder Judiciário. Assim como um desembargador pode entender de uma forma determinado assunto, outros juízes podem ter divergência de opinião sobre a aplicação da lei num determinado caso. Especificamente, por exemplo, nessa última operação (Jurupari), o vice-presidente do Tribunal, desembargador José Amílcar de Queiroz Machado, indeferiu os habeas corpus que lhe foram direcionados. Portanto, mesmo na corte regional havia divergência, entre o vice-presidente e aquele que foi sorteado como relator das ações.
Diário - Nessa eleição temos um caso novo. O então procurador Pedro Taques pediu exoneração do Ministério Público Federal, depois de uma carreira de mais de 15 anos, para ser candidato ao Senado. Pelo histórico de Pedro Taques, o senhor acredita que ele pode conferir uma nova cara à política?
Julier - Essa pergunta é mais apropriada ao eleitorado ou ao candidato.
Diário - Mas vocês dois trabalharam juntos em diversas operações. Por certo devem ter criado algum vínculo...
Julier - A Justiça Federal sempre trabalhou com o Ministério Público, independentemente de quem seja. No passado havia o doutor Pedro Taques, doutor Mendes. Já passaram outros ilustres procurados. Atualmente, há o doutor Gustavo Nogami, doutor Mário Lúcio Avelar, doutora Ludmila, doutora Vanessa... É uma instituição, do ponto de vista brasileiro, respeitável e que tem prestado grande serviço à sociedade, inclusive quando atua judicialmente perante a Justiça Federal.
Diário - Eu sei que o voto é secreto... mas ele é seu candidato ao Senado?
Julier - (Risos) Como você mesmo disse, o voto é secreto.
Diário - A propósito, no final do ano passado, muito se falava sobre uma provável candidatura sua. Por que não aconteceu?
Julier - Aconteceu que você está conversando comigo como juiz. O prazo para eu ser candidato já se findou e não há mais essa possibilidade. Podemos dizer como os cuiabanos: “Quem bedjou, bedjou; quem não bedjou, não bedja mais”.
Diário - Mas o que aconteceu? Houve conversas com representantes de partidos, que fizeram convite ao senhor. Por que não deu certo, o que aconteceu sobre isso?
Julier - A questão básica é: sou juiz há quase 15 anos e pelo visto gosto de ser juiz (risos).
Diário - O senhor ainda pensa em entrar para a vida política?
Julier - Essa pergunta é igual àquela história... Você sabe andar de bicicleta? Não! Mas um dia você vai aprender? Enquanto estiver vivo, posso aprender um monte de coisas.
Diário - Diante de toda essa repercussão da operação Jurupari e outras operações recentes surgiram boatos de que o senhor iria se afastar para sair um pouco do foco. Que agora o senhor iria tirar férias. O que há de verdade nisso?
Julier - Eu faço mestrado. Tenho até o dia 13 de setembro para entregar minha dissertação na Inglaterra. Isso é única coisa que há de verdade. Estou verificando junto ao Tribunal uma licença necessária para eu escrever. Então, vou precisar de 30 a 60 dias, mas isso não está definido. A rigor, não há essa questão de “sair”. A única coisa concreta é que eu tenho que entregar minha dissertação no dia 13 de setembro.
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