A Polícia Federal tenta desvendar um enigma que mistura a rede terrorista Al Qaeda, tráfico de cocaína para financiar ações do terror e um grupo brasileiro de supostos contrabandistas.
A investigação visa identificar quem são os brasileiros citados por militantes ligados à Al Qaeda, que ajudariam o grupo terrorista a colocar entre 500 kg e uma tonelada de cocaína em Mali, na África Ocidental.
A aparente conexão brasileira foi descoberta com a prisão, em dezembro do ano passado, de três militantes de um braço da Al Qaeda que atua entre Gana, Mali e Argélia, na África Ocidental.
O trio --Omar Issa, Harouna Touré e Idris Abdelrahman-- é de Mali, foi preso em Gana e deportado para Nova York, onde será julgado.
É a primeira prisão de integrantes da Al Qaeda num caso que o governo dos EUA classifica de narcoterrorismo --a venda de drogas para financiar ações armadas.
Touré era o contato com os brasileiros, de acordo com uma investigação da DEA (Drug Enforcement Administration, a agência americana antidrogas).
Em conversas telefônicas e gravações em vídeo, Touré diz que traria a cocaína da Colômbia com a ajuda de brasileiros. O passaporte dele tem a comprovação de que passou pelo Brasil, pela França e pela Arábia Saudita.
Consultada pela Folha, a PF diz que investiga que grupo atuaria na rota do tráfico entre o Brasil e Mali.
Tráfico no deserto
A tarefa do grupo brasileiro seria levar a cocaína da Colômbia para Mali, como relatam documentos obtidos pela Folha nos EUA. De Mali, a droga seria transportada pelo deserto até o Marrocos e depois para a Espanha.
Mali é o principal entreposto de cocaína na África, segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes. O norte do país virou rota de contrabando e palco de sequestros. De 30 a 70 toneladas de cocaína que vão para a Europa passam pela África Ocidental.
O braço da Al Qaeda que levaria a cocaína pelo deserto caiu numa armadilha da DEA. A agência colocou um informante para negociar com o trio como se fosse das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Os americanos imaginavam que o ódio que ambos nutrem pelos EUA funcionaria como liga para os negócios. Deu certo.
Touré, que veio ao Brasil, disse, em mais de uma conversa com o informante, que cobraria US$ 2.000 por quilo de cocaína transportado --transportar 500 kg renderia US$ 1 milhão ao grupo.
No norte da África, é rotineira a mistura de crimes e radicalismo islâmico. Muitas das rotas de contrabando em Gana e no Chade são dominadas por facções terroristas.
Os militantes que estão presos em Nova York pertencem a um grupo chamado Aqim (Al Qaeda do Magreb Islâmico).
A facção nasceu em 1997 na Argélia, com o objetivo de atacar autoridades seculares argelinas e alvos ocidentais. Em 2006, o grupo assumiu um atentado em que morreram 43 militares da Argélia e o sequestro de 23 europeus.
A aliança da Aqim com a Al Qaeda foi selada em 11 de setembro de 2006, no quinto aniversário do ataque às torres gêmeas de Nova York.
Foi Osama bin Laden quem autorizou que usassem o nome Al Qaeda do Magreb Islâmico _antes, a facção chamava-se Grupo Salafista de Predicação e Combate [predicação é sermão].
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