Juiz pagou com a vida o que hoje se confirma
Denúncias de venda de sentença e exploração de prestígio apontadas na operação Asafe, da Polícia Federal, confirmam em grande parte as acusações e resgatam a memória do juiz Leopoldino Marques do Amaral, quase 11 anos depois dele ser assassinado. A avaliação é do filho do juiz Leopoldino Marques do Amaral Júnior, que hoje tenta viver no anonimato e continua temendo represálias como as que levaram ao assassinato do magistrado que inaugurou a crise no Judiciário de Mato Grosso.
Em entrevista ao jornal A Gazeta, Leopoldino Júnior, 36, afirmar conviver com o receio de represálias e a satisfação de ver na operação Asafe uma forma de reavivar as denúncias feitas pelo seu pai. Diz ainda que o escândalo que levou à cadeia advogados renomados e parentes de juízes e desembargadores serve para ver cumprir a profecia do magistrado assassinado.
"Meu pai disse que se fosse morto seria uma forma da verdade vir à tona e é isso o que está acontecendo mais de 10 anos depois. Infelizmente, o mais importante para nós era tê-lo. Isso não vai acontecer mais, porém, as pessoas estão vendo que o que foi dito era verdade mesmo muita gente não dando crédito naquele momento", afirma Leopoldino Júnior, que vive no interior de Mato Grosso e prefere, por segurança, não divulgar o município onde reside ou divulgar fotografias.
Mesmo com toda a exposição da operação Asafe, Leopoldino Júnior afirma que a família prefere não se inteirar muito do assunto e optou por deixar a questão de lado. Até mesmo assuntos como uma indenização aos filhos que chegou a ser requerida judicialmente depois da morte do juiz não são mais tratados como prioridade.
"O que a gente quer é paz. Passamos momentos difíceis. Meu pai foi acusado de muita coisa, questionaram a paternidade no caso de três irmãos nossos e toda a nossa vida mudou. Por isso, o mais importante hoje é ter paz", afirma Júnior, que diz ter se mudado de Cuiabá depois de enfrentar dificuldades até para encontrar emprego por causa do escândalo envolvendo o Judiciário.
Radialista e produtor de áudio no interior, Leopoldino lamenta mais o fato de passar grande parte da juventude vendo as pessoas comentarem denúncias contra seu pai. De estilo polêmico, o juiz foi acusado de favorecer parentes através de contratação no serviço público (nepotismo) e respondeu a processos administrativos na Corregedoria do Tribunal de Justiça (TJ/MT).
A família diz que a maioria dos casos se trata de represália. O juiz Leopoldino entrou para a história como o responsável por escancarar os bastidores do Judiciário através de denúncia encaminhada à CPI do Congresso Nacional que investigava o Poder. Ele citou à época a prática de nepotismo, desvio de recursos, venda de sentenças e acusou desembargadores de trocar cargos por favores sexuais. Grande parte das denúncias já se confirmou.
As acusações de Leopoldino já tratavam de vendas de sentenças e citavam até a advogada Célia Cury, esposa do desembargador aposentado José Tadeu Cury e que foi presa na terça-feira (18) por envolvimento com exploração de prestígio.
Logo depois da acusação, Leopoldino foi encontrado com o corpo carbonizado em 7 de setembro de 1999 numa estrada de Concepción, município paraguaio a 210 km da fronteira com o Brasil.
"Hoje vejo que mais de 10 anos se passaram desde que foram feitas as denúncias. Umas das poucas coisas que temos são a lembrança, o ensinamento dele e uma carta que ele deixou antes de morrer. Se temos essas coisas se confirmando agora, por que não o deixaram viver para esclarecer tudo?", pondera Júnior.
O radialista é um dos oito filhos do juiz. Depois que a família pediu indenização ao Estado, houve questionamento sobre a paternidade de três irmãos que haviam sido adotados pelo magistrado e não teriam direito às indenizações esperada e que não chegou a nenhum filho.
As investigações comandadas pela Polícia Federal levaram à prisão e condenação da ex-escrevente e assessora de Leopoldino Amaral, Beatriz Árias, e do tio dela, Marcos Peralta, apontado e preso como executor do assassinato. O empresário Josino Guimarães, que seria o mandante, trava uma batalha jurídica e se mantém longe do julgamento.
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