Nova parceria com o irmão Luciano traz sucessos de duplas dos anos 80. Ao G1, ídolo fala de política, boatos de adultério e álbum com nome inglês.
Zezé lança disco de clássicos e diz que novo sertanejo é ‘efêmero’
“Double face”, o novo CD duplo de Zezé di Camargo e Luciano é mais uma prova da segurança que a dupla tem em relação ao sucesso. Enquanto os novos nomes da música sertaneja começam a atingir um público diferente do que comparece à festas de peão e dos rodeios, os dois investem em um disco dividido entre a música romântica que garante seu posto nas rádios desde meados da década de 90 e os “modões” dos anos 80.
Em entrevista por telefone ao G1, Zezé diz que se sente confortável para lançar um álbum com o repertório de pérolas esquecidas de artistas como João Mineiro e Marciano e Trio Parada Dura. Ele critica cantores que tratam seus discos como “descartáveis”. “É o seu principal produto, é como um escritor escrever um livro”, pondera.
Zezé alerta que o chamado “novo sertanejo” “começa a tomar uma direção efêmera”, e afirma que “os artistas têm que ter a preocupação em transcender isso”, comparando a música atual com o movimento tropicalista. Por outro lado, ele admite que “se estivesse começando hoje eu seria um cantor universitário”.
Eleitor e amigo do presidente Lula, Zezé faz também um balanço dos oito anos de governo do presidente e comenta seu posicionamento para as eleições de 2010, além de falar de como lida com as fofocas em sua vida.
Leia abaixo a entrevista completa.
G1 - Hoje em dia muitos artistas lançam uma ou duas músicas na internet e nas rádios e depois gravam discos ao vivo, ganhando dinheiro com shows e com CDs de sucessos. Vocês decidiram lançar um álbum de estúdio duplo. Isso não é ir contra a corrente?
Zezé di Camargo - Os artistas hoje estão usando o disco como um produto secundário, de menor importância na carreira. Mas o disco é o principal produto de quem canta. É como um escritor escrever um livro, um pintor pintar um quadro. É uma coisa eterna, o artista morre e a obra dele vai ficar aqui. As pessoas têm feito discos muito simples, um envelopinho sem encarte. Eu não quero ser o dono da verdade, mas acho que com a nossa carreira não podemos entrar nesse processo comum, descartável. Quem compra o CD quer chegar em casa, abrir, ler, olhar a ficha técnica, tem que ser um presente mesmo.
G1 - Porque vocês escolheram o nome em inglês “Double face” para o disco? Isso não vai dificultar o entendimento para o seu público?
Zezé - O nome foi ideia minha. O inglês está inserido em qualquer língua do mundo hoje. Veja expressões como free lance, delivery, hot dog, já entrou no nosso vocabulário. Quando eu falei pela primeira vez “Zezé di Camargo e Luciano – Dupla face” não ficou bom, soou feio, “duas caras”. É como quando você traduz uma música do inglês para o português e fica feio. Aí eu pensei em “Double face”, fica melhor e não muda nada, as pessoas vão entender.
G1 - O disco é interessante porque combina um CD com canções do seu estilo romântico com outro com músicas que fizeram sucesso nos anos 80, guarânias, músicas rancheiras, que não têm tanto prestígio quanto a música de viola. Porque você escolheu esse repertório de pérolas?
Zezé - A música sertaneja tem várias etapas, várias formas. A mais clássica é feita de toadas, cururus, músicas de Tião Carreiro e Pardinho, Tonico e Tinoco. É uma estrutura musical muito diferente, com viola, violão, no máximo um pandeirinho. Nos anos 80 a música sertaneja acabou recebendo influências da América Latina, como o chamamé dos Corrientes na Argentina, a harpa paraguaia, os trompetes da música ranchera mexicana. É um período onde ela começou a se comercializar, a entrar no inconsciente popular. Eu quis mergulhar – foi um trabalho mais meu, porque tem música no disco que o Luciano nem conhecia – exatamente nesse período que não tem um registro mais moderno.
Já existe hoje um sertanejo pop, que está atualizando o estilo para novas plateias, enquanto vocês estão se preocupando em resgatar um período importante que não teve seu devido registro. Vocês acham que têm uma responsabilidade em apresentar isso?
Zezé - A nossa carreira atingiu essa maturidade, não temos mais a preocupação de gravar algo que tem que tocar no rádio e vender. Nós nunca tivemos um disco que não ficasse entre os três mais vendidos, uma música de trabalho que ficasse fora das paradas. O CD novo de inéditas tem uma cara do que está acontecendo hoje no mercado. Eu tive uma experiência que me fez querer gravar o disco. A gente estava no aeroporto, depois de um show em Uberlândia fomos fazer uma roda de viola, estavam João Bosco e Vinícius, Jorge e Mateus, Maria Cecília e Rodolfo. E não teve nenhum que cantou uma música nova. Era só Milionário e José Rico, João Mineiro e Marciano, Trio Parada Dura. Aí eu pensei, “por que esses caras, que estão fazendo esse som novo, na hora de cantar o que gostam eles só cantam essas coisas antigas?”. Acho que eles podem até ter vontade de gravar isso, mas podem ter medo.
G1 - Muitos desses novos nomes costumam citar vocês como uma grande referência. Você já refletiu sobre a influência de Zezé di Camargo e Luciano na música sertaneja?
Zezé - Eu acho que não dá para escrever um livro sobre a música sertaneja sem ter um bom capítulo dedicado a nós. Acho que temos essa responsabilidade de primar pela qualidade em todos os sentidos. Esse movimento novo do sertanejo começa a tomar uma direção efêmera, e todo mundo que está participando pode ir embora quando ele parar. Alguns artistas têm que ter a preocupação em transcender isso. Por exemplo a Tropicália, quando acabou o movimento, todos os artistas estagnaram. Alguns nomes que se preocuparam em fazer um trabalho importante, como Gilberto Gil, ficaram.
G1 - Você acha que as pessoas levam a música menos à sério hoje, com menos paixão?
Zezé - O público vai mais pela festa, pela curtição. As pessoas que vão ao nosso show idolatram a gente, sentam ali e ficam ouvindo até a nossa respiração. Você vê um show desses artistas novos, tem na plateia um cara de costas para o palco beijando a boca da menina. Eu não acho que está errado, é o momento que a música vive. Não dá para ficar nadando contra a corrente. A gente faz do nosso jeito porque pode, mas se estivesse começando hoje eu seria um cantor universitário.
G1 - Você costuma ser muito reservado na sua vida pessoal, não aparece em revistas de celebridades, não tem muito burburinho em volta. Como você faz para proteger a sua intimidade?
Se eu fosse atender todos os convites que eu recebo para eventos eu não faria outra coisa na vida. Você vai aprendendo. No começo da carreira eu achava que fazer uma matéria mostrando a minha casa em uma revista era o máximo. Hoje eu acho que é uma futilidade. Prefiro ir a eventos dos meus amigos, que não vão dar ibope nenhum, mas onde não vão estar os caras da moda, não vão estar os BBBs da vida. Eu fico muito mais feliz com meus amigos na beira do rio, tocando uma viola, no meio do mato, tomando uma cachaça, do que indo para uma festa badalada.
G1 - E como você lida quando as coisas ultrapassam essa barreira e você vira assunto de fofoca?
Zezé - Esse ano saiu uma fofoca que é a pior de todas, de que eu era pai da criança de uma menina aí. Eu falei, “só se eu for o Espírito Santo”. Eu vi aquela moça umas duas vezes na vida. Se eu encontrasse essa menina na rua antes dessa história eu nem saberia quem era. Eu estou até processando o jornal que deu essa matéria, porque entrou em outro mérito, envolveu a minha família. A minha filha Camila chegou em casa chorando, jogou a matéria que saiu em um site na mesa e pediu explicação para mim.Tomei uma atitude jurídica, como acho que todo mundo deve tomar, e não vou voltar atrás, porque a notícia é infundada.
G1 - O Luciano foi citado recentemente em uma matéria falando que tinha uma conta falsa no Twitter que ele usava para atazanar os políticos. Vocês vão se posicionar politicamente para essa eleição?
Zezé - O Luciano ficou chateado com essa matéria, ele disse que o jornalista entendeu errado. Ele quis dizer que usava uma conta fake para não influenciar como artista as pessoas, e não para se esconder. Acho que o artista tem que se posicionar politicamente, porque antes de ser artista ele é um cidadão. Se não fica parecendo que você só quer o lado bom da história e está à margem do resto, pensando “ah, eu estou bem e o povo que se f...” – não é bem assim. Eu tenho que exercer a cidadania, cobrar de quem eu acho que tenha que cobrar e contribuir da minha maneira. Eu não tenho medo de me posicionar politicamente.
G1 - Já decidiu em quem você vai votar?
Zezé - Ainda não decidi. A gente não conhece os candidatos. O José Serra a gente já conhece, de outras campanhas, governador de São Paulo. A Dilma Roussef, por exemplo, a gente não conhece tanto. Será que ela vai ser uma continuidade do governo Lula? Será que ele vai dar um suporte? O Lula é um bom cabo eleitoral, mas o povo já sabe separar muito uma coisa da outra. Antigamente até o artista falava, “ah, vote em fulano”, e a gente não tem mais esse poder. Acho poucas pessoas que seguem isso ainda. “Vou votar nesse cara porque o Zezé di Camargo falou”. Se fizer isso é uma idiotice.
Como você avalia os oito anos de governo Lula? Você acha que foi importante para o Brasil?
Zezé - Foi muito importante. Eu continuo acreditando muito nele e não me arrependi nem um pouquinho. Sou um cara super apartidário, tenho grandes amigos em todos os partidos. Aécio Neves (ex-governador de Minas Gerais pelo PSDB) é padrinho de casamento da minha filha e amigo pessoal meu. Sou amigo pessoal do Lula também, e isso não me impede de discordar dele. Por exemplo, essa intermediação em relação ao caso do Irã, acho que foi precipitado da parte dele. Mas no geral, olhando o que era o Brasil antes e o que é o Brasil agora, acho que o saldo é muito positivo.
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