Com 27% de estudantes de ensino superior com 30 anos ou mais, classes se dividem entre o interesse maior dos mais velhos e a dispersão e a necessidade de interagir socialmente dos mais novos
Universidade vive conflito de gerações com invasão de alunos ""pós-trintões""
Um em cada quatro estudantes que ingressaram em curso superior em 2008 tinha 30 anos ou mais, segundo censo da educação superior do Ministério da Educação. Em apenas oito anos, o contingente de universitários a partir dos 30 aumentou 206% - o número de ingressantes com até 24 anos também subiu, mas a uma taxa menor, de 89%.
O crescimento do número de alunos trintões, quarentões e cinquentões levou para as faculdades um verdadeiro conflito de gerações e fez com que instituições passassem a oferecer alternativas aos alunos experientes.
Os alunos mais velhos, mesmo que não sejam assim tão velhos, normalmente são mais interessados e dedicados aos estudos, enquanto os jovens que acabaram de sair do ensino médio costumam ser mais dispersos e aproveitam mais as relações sociais durante a faculdade.
Para o agente de turismo Jefferson Cavalcanti, de 42 anos, a convivência no ambiente acadêmico com os colegas mais novos tem sido difícil. "Eles atrapalham muito. É sempre uma confusão na classe: barulho, conversas em voz alta, risadas", reclama. Cursando o último semestre de marketing na Universidade Nove de Julho (Uninove), Cavalcanti conta que muitas vezes precisa chamar a atenção dos colegas. "Peço silêncio ou falo para deixarem a sala."
Apesar das broncas, Cavalcanti diz conseguir manter uma boa relação com todos - foi até eleito o vice-representante da classe. Ainda assim, preferiria frequentar uma faculdade com estudantes mais maduros. "No começo, deu vontade de desistir. Pensei que não valia a pena gastar meu dinheiro dessa forma. Mas avaliei melhor e persisti."
Para a antropóloga Rita de Cássia Oliveira, especializada em estudos da juventude e coordenadora do curso de Ciências Sociais da PUC de São Paulo, uma das raízes do descompasso em sala pode ser a imaturidade dos mais novos. "O jovem de 18 anos hoje é muito imaturo, em especial os meninos. Eles conversam em sala e se dispersam mais facilmente", afirma.
Segundo Rita, a questão central é diferença na capacidade de escolha e de valorização do curso superior. "Os alunos de 18 têm dificuldade em saber o que querem da vida. Eles mudam muito de curso e têm a ideia de que não vão aprender nada na faculdade, que é o mercado que ensina", diz. Os mais velhos tendem a buscar mais que um diploma. "Quando ele entra um pouco mais maduro, já com experiência profissional, começa a perceber que a faculdade vai dar uma formação ampla, aprofundada."
Mesmo os mais jovens reconhecem a dedicação do grupo experiente. "Eles vêm para estudar e ponto final, pois sabem quanto vale o dinheiro", diz Pamela Tavares, de 21 anos, do sétimo semestre de Comércio Exterior na Universidade Paulista (Unip).
Pamela conta que, quando fez as disciplinas básicas, sua turma contava com quase 50% de alunos mais velhos e as aulas eram disciplinadas. A situação mudou quando os estudantes foram divididos por carreiras, e sua turma passou a ter apenas uma aluna acima dos 30 anos. "Depois que separou, virou uma bagunça."
Prazer e profissão. Clara Matilde Nascimento, de 35, é engenheira de produção. professora universitária e aluna de Direito na Universidade Brás Cubas (UBC). Decidiu voltar a estudar por prazer. "Direito sempre me chamou atenção, pois envolve toda a sociedade", diz. "Acabei me apaixonando e agora quero tentar unir as duas carreiras."
Para a técnica em informática Creusa Iliani Ferreira, de 52 anos, estudar Letras na Universidade de São Paulo (USP) representa a possibilidade de finalmente ter um curso superior e trabalhar em uma área que mais lhe agrade. "Sempre gostei de Letras. Quero trabalhar com revisão, tradução ou dar aulas."
Creusa não reclama do comportamento dos colegas mais novos, mas reconhece que o contato é restrito. "Não vou sair correndo da aula para ir a cervejada. Os programas são outros."
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