CASO HENRIQUE TRINDADE: Esperança por Justiça enfraquece
Não se pode dizer que Odomila Ribeiro, 55, viveu à espera de Justiça por conta da morte do marido Henrique José Trindade, ocorrida em 1982, no município de Alto Paraguai (218 km a médio-norte de Cuiabá). Ao contrário, nos primeiros anos da perda, correu "atrás de resolver", como ela própria definiu sua atitude. Plantou sozinha a lavoura que alimentou os filhos. "A gente nunca tem repouso, né?".
Na época, estava grávida de 8 meses e mesmo depois de 28 anos após o crime, com todos os filhos criados, continua tocando sua plantação. A esperança em relação à Justiça ficou "enfraquecida" pelo tempo. "Acho que deixou a desejar um pouquinho", afirma humildemente.
Na semana passada, o caso que foi levado ao conhecimento Organização dos Estados Americanos (OEA) e teve um novo desdobramento: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da instituição rejeitou a indenização no valor de R$ 90 mil e a pensão vitalícia de 1 salário mínimo a ser paga a Odomila, proposta feita pelo Estado de Mato Grosso. Uma nova negociação deverá ser marcada, ainda em data indefinida.
A preocupação da agricultora, natural de quem trabalhou a vida toda com a lida da terra, é de que a indenização venha a atrapalhar sua aposentadoria, que deverá sair no final do ano. "E se eu não conseguir me aposentar por conta disso?".
Odomila tem direito à indenização pela prescrição do crime que chegou a presenciar. No dia 4 de setembro de 1982, sob uma forte chuva, um grupo de homens invadiu a casa de Henrique Trindade, onde o encontrou sem camisa. Um deles mandou o agricultor se vestir. Todos entraram no quarto em seguida e o delegado Nelson Tokashike disparou contra Trindade, acertando-lhe o braço.
De acordo com a petição encaminhada à OEA, ao sair do quarto, o agricultor recebeu dois tiros. Ainda com vida, foi obrigado a levar o grupo às casas de outros 2 agricultores jurados de morte. Ao encontrarem as residências vazias, o grupo matou o agricultor. Antes, porém, Henrique Trindade teve um olho arrancado, segundo a denúncia.
Vivendo atualmente em Terra Nova do Norte (675 km ao norte de Cuiabá), Odomila afirma que nem soube do valor ofertado na proposta de indenização. Juvenal Ferreira Trindade, filho do agricultor, também ferido durante o episódio, hoje mora no Paraná. Ele é filho do primeiro casamento do agricultor. "Dos 4 filhos desse casamento, somente ele vivia com a gente, por que a mãe morreu". Juvenal sofreu várias ameaças e se mudou do assentamento.
Por conta desse fato, segundo o procurador geral do Estado, Dorgival Veras de Carvalho, o acordo teve de ser adiado. "Foi um fator surpresa para mim. Fiquei sabendo lá em Washignton".
Agora, segundo o procurador, terá de ser levantada a documentação sobre quais filhos de Henrique Trindade têm direito à indenização.
O advogado que iniciou o processo junto à OEA, Adair José Alves Moreira, afirmou que toda a documentação foi providenciada. "Os filhos que dependiam dele na época terão o direito adquirido por meio de herança". Segundo ele, há um entrave por parte do Estado.
Hoje prefeito de Alto Paraguai, Adair acompanhou desde os 8 anos a luta da família para sobreviver à tragédia. "Eu também morava no assentamento. Nossos pais eram amigos".
Atualmente, o processo é acompanhado pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cegil), com sede no Rio de Janeiro. A reportagem entrou em contato com o centro, mas não obteve sucesso. Sobre o delegado, não há notícias do paradeiro.
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