Maria da Penha: Decisão do STJ faz aplicação retroceder
A exigência de representação criminal para abertura de inquérito contra acusados de violência a mulher, como estabelece uma nova decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovada há 30 dias, está sendo considerada um grande retrocesso na aplicação da Lei Maria da Penha (11.340/2006).
Desde a última semana de fevereiro, quando a medida entrou em vigor, dezenas de mulheres retornaram à delegacia para solicitar a suspensão de inquéritos. Já nos casos de agressões ocorridas após a decisão do STJ, quando o início das investigações passou a depender de assinaturas das vítimas, a polícia vem verificando muitos casos de recusa.
A delegada Josirlete Magalhães Criveletto disse que ainda não há levantamento quantificando os casos de mulheres que desistiram de punir os maridos agressores, mas os reflexos da nova medida são notórios. Em 2009, 6.700 mulheres foram vítimas de violência doméstica em Cuiabá e Várzea Grande. Esta incidência representa 18,5 mulheres agredidas ao dia.
A coordenadora das promotorias Especializadas de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, Lindinalva Rodrigues Corrêa, disse que, com a decisão do STJ, o peso de punir ou não o agressor novamente recai sobre a mulher. Pela Lei Maria da Penha, destacou a promotora, cabia ao Estado, ao receber a queixa ou flagrar um ato de agressão, apurar o caso e aplicar as penalidades ao agressor por meio de “ação publica e incondicional”, que não dependia de vontade da vítima. A única exceção são os homicídios e tentativas de homicídio que continuam sendo crime de ação pública.
A partir de agora, além de tornar a ação condicional, dependente da permissão formal da vítima, o STJ, denunciou Lindinalva, quer aplicar a suspensão condicional do processo. Isso significa dizer que mesmo os agressores que já estão respondendo a processo na Justiça podem ficar impunes antes de ser sentenciados.
Lindinalva explicou que se essa medida for aprovada, o réu poderá pedir a suspensão do processo por até dois anos e no período, se não reincidir no crime, não haveria julgamento, ou seja, o caso seria arquivado. O mais grave, avaliou, é que nessa situação a vítima sequer teria direito de opinar.
Entre os argumentos de defesa para adoção da nova regra estaria, segundo a promotora, o desejo de salvar o casamento e manter a família unida. “Mas uma vez estão sacrificando a mulher em nome da família”, protestou ela.
Desde a noite de quarta-feira, sob a coordenação da promotora Lindinalva Corrêa, Cuiabá sedia o I Encontro Nacional Multidisciplinar de Operadores da Lei Maria da Penha, evento do Ministério Público Estadual. Os debates e palestras acontecem no auditório da Escola do Tribunal de Contas, no CPA, e se estenderão até o final da tarde de hoje. Motivado pela decisão do STJ, esse evento reúne juízes, promotores, defensores, delegados de polícia, representantes de conselhos de direito de vários estados.
Do evento sairá a “Carta de Cuiabá”, um protesto contra as alterações aprovadas e em discussão no Superior Tribunal.
Comentários