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Economia
Domingo - 21 de Março de 2010 às 04:41

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A simplificação da burocracia, o apoio governamental e também o controle da violência levaram ao aumento de até 56% do número de abertura de empresas nas favelas do Rio de Janeiro, em 2009. As comunidades deixaram o papel de vítimas da sociedade e viraram ninho de empreendedores que nem sempre se resignam a atuar à margem da lei. Os indicadores mostram que a formalização do comércio está apenas começando.

Alexandre Leôncio, que há um ano buscava um ponto para vender balas e doces em sua barraquinha na Cidade de Deus, hoje tem uma loja, está contratando e aumentando o ponto comercial. E ainda sonha expandir. "Se eu conseguir um ponto no Centro, sei que vou me dar bem. Com CNPJ, negocio com fornecedores e tenho melhores preços daqui", revela. Entre o tabuleiro e a loja reformada, iluminada e lotada de mercadorias se passaram pouco mais de 12 meses e muita dedicação. "Tudo o que eu ganho invisto", diz. A empresa cresceu tanto que, de empreendedor informal registrado em setembro do ano passado, ele passará esse ano a microempresário. "Meu movimento superou o limite e vou mudar de categoria. Mas é só um passo para crescer mais". A clientela, que não esvazia a loja um minuto, confirma o sucesso.

O número de empresas constituídas na Cidade de Deus aumentou 56% em 2009. A maior parte do comércio ainda é informal, mas o caminho para a mudança está aberto. O posto de atendimento do Sebrae-RJ, graças a parceria com governo do estado e a Prefeitura do Rio, atende interessados diariamente. A entidade está também nas comunidades do Alemão, da Maré e áreas de Santa Teresa e realiza projetos para incentivar a formalização, cooperativismo e organização de quem trabalha por conta própria. "O principal entrave ainda é cultural. As pessoas pensam que é caro, demorado e envolve muita papelada. Tentamos mudar essa visão. O acesso aos mercados também pode ser uma dificuldade para qualquer pequena empresa", analisa Andreia Crocamo, gerente de Políticas Públicas do Sebrae RJ.

José Luciano Silva, diretor da Junta Comercial do Rio, aponta outra dificuldade. Quando o empresário não tem endereço reconhecido pelo governo, a regra é tomar o logradouro do Microempreendedor Individual (MEI) mais próximo como referência ou a localização da associação de moradores. "Isso é um dos gargalos. Nem todas as ruas e vielas têm CEP e Código de Logradouro", diz.

A falta de regularização urbanística é parte do descompasso entre a economia real e a formal. A maior favela do Rio tem o maior comércio estabelecido. Levantamento do governo feito ano passado mostra que, com 100.818 moradores, a Rocinha possui 6.508 empresas. A alta na regularização em 2009 chega a 36,3%, sendo que menos de 200 concluíram a formalização. A instalação do Posto da Secretaria de Urbanismo (Pouso) pode mudar esse cenário. "Começamos o processo de regularização que inclui reconhecimento das ruas. As pessoas passam a ter um endereço. A meta é transformar as comunidades em bairros. Tanto para o comércio quanto para o cidadão. Isso vai devolver a cidade para quem mora nela", diz Alexandre Furlanetto, coordenador geral de Regularização Urbanística.

Anderson Franco, franqueado da rede de cursos Microlins, lamenta não ter alvará. "Tenho um documento provisório. A qualquer momento pode expirar. O problema é que o prédio não existe para a prefeitura. Só um grande lote", conta. Morador da Ilha do Governador, ele assumiu a loja da Rocinha e se prepara para abrir outra. Com 400 alunos, os cursos mais procurados são Informática e Inglês. Para contratar na comunidade, ele reclama da falta de capacitação. "Tenho um professor que chegou só com experiência em lan house, mas o ajudei a se formar e agora ele é um dos destaques", revela, mas também elogia:"É o maior faturamento entre minhas três lojas. Um lugar bom para trabalhar e me permitiu conquistar meu primeiro carro zero", comemora.

Mais trabalho, renda e chances para o futuro
O crescimento econômico da comunidade, além de gerar emprego e renda, leva comodidade e oportunidades aos moradores. Raimunda Alves, 45 anos, é cliente da agência da Caixa Econômica na Rocinha e prefere o atendimento de lá. "Aqui a gente sente que é gente como a gente. Eles atendem bem. É mais rápido".

Com aulas supletivas do Ensino Médio e cursos regulares, funcionários da Microlins podem reforçar o currículo fora do expediente. Fernanda Sousa, 15 anos, bate ponto desde os 14 como orientadora, após começar como promotora. "Cresci aqui. Faço aulas de Informática e Inglês e continuo a estudar", diz ela, que cursa o Ensino Médio. Nascida na comunidade, ela mora com os pais e faz planos. "Quero fazer Biologia Marinha. Enquanto isso, aprendo para ajudar no futuro", pondera.

CNPJ, alvará e direito a aposentadoria e pensão
A maioria das empresas registradas em 2009 nas comunidades do Rio é de empreendedores individuais (EI), categoria regulamentada no ano passado que permite ao trabalhar por conta própria ter CNPJ, alvará e ainda contar com a proteção da Previdência Social. Tudo isso pagando menos de R$ 60 por mês. "O número deve crescer muito porque o Portal do Empreendedor, que faz o cadastramento, teve problemas que só foram resolvidos em janeiro", diz José Luciano, da Junta Comercial do Rio (Jucerja).

O recurso foi a estratégia do comerciante Alexandre Leôncio, da Cidade de Deus, para sair da informalidade. Antes da regularização, ele lembra que ia até Madureira para comprar seus produtos. Com alguns fornecedores, comprava usando seu CPF, pagando preços altos. Outros sequer vendiam para Pessoa Física. "Como empresa, eu ligo para o fornecedor e digo o que quero. Ele traz aqui e eu posso negociar o preço, digo mesmo que não vou pagar se estiver alto", conta.

Andreia Crocamo, do Sebrae RJ, acrescenta que a formalização também amplia o acesso a compradores potenciais que incluem até o governo. "As empresas de maior porte estão aprendendo a lidar com esse fornecedor pequeno. O governo está adequando a legislação. Ele pode vender para uma escola municipal ou para o posto de saúde, por exemplo", ensina ela. O atendimento na Cidade de Deus faz parte de projeto piloto que envolve governo, prefeitura, Sebrae e Firjan.






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