Afastamento de desembargadores e juízes caiu como uma bomba em Mato Grosso e crise é avaliada pelo presidente da Associação de Magistrados
Presidente da AMAM comenta decisão do CNJ contra magistrados de MT
As notícias causaram enorme dano à imagem do Poder Judiciário, repercutiram no Congresso Nacional, nas ruas, nos corredores de fóruns, nos olhares desconfiados dos próprios cidadãos atendidos pela Justiça.
A reação veio da Associação mato-grossense dos Magistrados (Amam), em nota oficial assinada pelo presidente da entidade, Walter Pereira de Souza. "No Estado Democrático de Direito as Instituições sobrevivem a seus membros, e todos devem se submeter ao sistema legal vigente".
Magistrado há 11 anos, Walter Pereira assumiu a Amam em fevereiro de 2009, quando o Tribunal de Justiça já estava dividido em dois grupos políticos. Ele manteve-se neutro em todos esses meses e hoje está empenhado em levantar o moral dos magistrados de Mato Grosso. Walter Pereira programa para esta semana na vinda do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares Pires, e estuda outras medidas para manter a máquina funcionando. Nesta entrevista, Walter Pereira avalia o Poder Judiciário antes e depois do CNJ, diz que o Conselho comete excessos e avisa: "Esse episódio ainda deve render muita coisa, tem uma inspeção do CNJ por ser concluída. Temos outras questões no Tribunal que devem ser corrigidas".
A Gazeta - O senhor acha que essa é a maior crise de imagem pela qual passa o Poder Judiciário de Mato Grosso, ou foi pior no episódio que envolveu o assassinato do juiz Leopoldino Marques do Amaral?
Walter Pereira - São dois momentos diferentes. O caso Leopoldino foi grave dentro do seu momento. Não menor nem maior, mas grave também. E esse é outro episódio de alta relevância dentro do Poder Judiciário, que vai refletir durante muito tempo. Isso, inegavelmente, faz parte de nossa história, e nós teremos que aprender com os erros cometidos e com tudo que aconteceu.
Gazeta - O senhor falou em Judiciário antes e depois do CNJ. São novos tempos? Pode explicar isso melhor?
Pereira - A magistratura vem sofrendo, nos últimos anos, a influência de muitos novos conceitos. Estamos em uma fase de transição, de muitas mudanças. Temos aí a figura do CNJ, completamente divorciada da história do que era o Poder Judiciário, algo com a qual a gente tem que aprender a conviver. O CNJ tem sido muito útil ao Poder Judiciário em muitas ocasiões, e em outras tem se excedido, tem invadido competências de tribunais, tem invadido competência constitucional do Supremo Tribunal Federal. Então, até se adequar a esses limites vai levar um tempo. E a magistratura vem sofrendo fortes influências da informatização, das novas decisões dos ministros do Supremo, e também pela juventude da magistratura. Então estamos em uma fase de transição muito grande. Muitas mudanças ainda vão ocorrer. E o comportamento de uma magistratura mais antiga, vem colidindo com essa transformação. Então o Judiciário ainda vai mudar, será menos enclausurado, mais aberto para a sociedade. Até o Poder Judiciário conseguir o seu objetivo, que é a transparência, que é a publicidade de seus atos, que é alcançar o cidadão, vai demorar um pouco. Mas o Judiciário caminha para isso. Teremos muitas transformações ainda. Esse episódio (afastamento de magistrados) ainda deve render muita coisa. Tem uma inspeção por ser concluída no CNJ, essa inspeção pode acrescentar mais alguma coisa. Creio que a Corregedoria do CNJ deve concluir isso em breve, temos outras questões administrativas do Tribunal que devem ser corrigidas. E o Estado Democrático é isso, se tem um erro, corrige-se.
Gazeta - Como está a magistratura de Mato Grosso após todas essas denúncias contra o Poder Judiciário?
Pereira - Sem dúvida nenhuma a situação é da maior gravidade. Não tem como se portar como se fosse algo normal. Todos nós sentimos e profundamente que isso tenha ocorrido. A magistratura toda sentiu. A magistratura vem trabalhando, produzindo, o Tribunal com seus projetos, dando continuidade, mas esse episódio causa em cada um de nós, um grande sentimento de tristeza. E inevitavelmente, na sociedade, causa sentimento de revolta, de angústia, de desconfiança. Mas é preciso deixar registrado que o Poder Judiciário nunca se negou e nem vai se negar a apurar eventuais desvios de conduta e punir, como vem acontecendo.
Gazeta - Nesta semana, senadores de vários Estados protestaram contra a chamada pena branda para os magistrados envolvidos em corrupção, que é a aposentadoria compulsória. Eles querem que, em processo administrativo, o magistrado perca o cargo. E prometeram dar impulso a propostas de Emenda à Constituição que prevêem o fim da aposentadoria compulsória como penalidade. Qual é a opinião do senhor sobre isso?
Pereira - A legislação prevê isso em razão do magistrado ser um servidor de qualidades especiais, não uma pessoa especial, mas de qualidades comportamentais especiais. Por exemplo: o cidadão comum pode extravasar em uma festa, em uma boate. Ele pode até se exceder. O máximo que ele vai receber é uma censura, de um familiar ou de um amigo. O magistrado tem um código de ética que não permite, de maneira nenhuma, ter uma conduta, na função, ou fora dela, que macule a imagem do Poder. Por isso, quando da aposentadoria do magistrado, por uma infração disciplinar, ela não retira automaticamente a aposentadoria, que é proporcional ao tempo de serviço. Há uma confusão da aposentadoria, e a mídia trabalha isso como se fosse uma regra. Isso não é verdade. Aquele que já tem tempo suficiente para se aposentar, esse vai receber a aposentadoria integral. Mas quem não tem tempo para se aposentar, sendo aposentado com uma pena de aposentadoria compulsória, ele vai receber proporcional. E essa aposentadoria por falta disciplinar não quer dizer, necessariamente, que ele não vai perder essa aposentadoria. Porque uma coisa é o procedimento disciplinar, ou outro é o criminal, como aconteceu no caso em comento. Nessa ação pode ser determinada a perda do cargo, aí se perde a aposentadoria também.
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