Com R$ 930 o casal de aposentados Francisca Freitas Pereira, 65, e Sebastião Câmara Pereira, 77, garante o sustento de 12 pessoas que vivem em uma casa simples do bairro Jardim Vitória, em Cuiabá.
27% dos idosos sustentam o lar
Com R$ 930 o casal de aposentados Francisca Freitas Pereira, 65, e Sebastião Câmara Pereira, 77, garante o sustento de 12 pessoas que vivem em uma casa simples do bairro Jardim Vitória, em Cuiabá. Nos pequenos cômodos da residência comprada com muito trabalho, eles abrigam 7 netos ainda pequenos, uma filha, um filho e a esposa.
Francisca e Sebastião representam uma realidade de 27,2% dos idosos de Mato Grosso, que são responsáveis pelo sustento das suas famílias, geralmente numerosas, com muitos netos, filhos e esposos (as) que não têm renda própria ou fixa. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o Estado está abaixo da média nacional com 39,5% dos idosos sustentando as famílias.
Na casa de Francisca e Sebastião as aposentadorias recebem um complemento do Bolsa Família pago a 5 crianças, além do dinheiro que o filho consegue trabalhando como pedreiro. A filha do casal, Rose Freitas Pereira, 29, chegou há pouco mais de 1 mês em Cuiabá e está desempregada. Ela é mãe de 5 crianças que moram com os avós e reclama que está difícil arrumar serviço na Capital.
Sebastião trabalhou como motorista por 30 anos e há 4 se aposentou devido ao Mal de Parkinson. Ele comenta que o dinheiro é curto para todas as despesas, que além de contas como água e luz, tem a lista de remédios que toma.
Embora tenha uma situação mais confortável que de seo Francisco, o comerciante Antônio Rufino Neto, 79, também é responsável pelo sustento dos filhos e netos. Ele conta que trabalha desde os 6 anos de idade e há 3 anos decidiu montar um mercadinho no bairro Jardim Vitória, onde trabalha em companhia da esposa Darli, 64. O casal cria uma neta de 11 anos e manda dinheiro para os 3 filhos que estão desempregados no Maranhão. "Também ajudamos um neto de 23 anos que está preso. Se envolveu com drogas e terminou na cadeia", conta seo Antônio, que acorda diariamente às 4h para buscar o pão que será revendido no Comercial Lustoza a partir das 6h.
Ele destaca que só vai parar de trabalhar quando morrer, brincando que "a vida está boa demais, tão boa que nem penso no assunto".
Na avaliação do sociólogo Naldson Ramos esta situação mostra a mudança de comportamento da sociedade dos últimos 30 anos. Ele comenta que as pessoas mais velhas sempre tiveram o papel de liderança dentro das famílias, mas antes os jovens conquistavam a independência financeira mais tardar aos 20 anos e saiam das casas dos pais, formando novos núcleos familiares. "Isso mostra que os jovens estão demorando cada vez mais para ingressar no mercado de trabalho".
A atual dependência financeira é reflexo da baixa escolaridade e da falta de qualificação, que dificultam o jovem a conquistar uma vaga no mercado de trabalho, mantendo-os sempre dependentes dos pais. Naldson comenta ainda que a falta de instrução forma pessoas menos conscientes e esclarecidas da importância do trabalho. Por isso, muitos não se incomodam em viver somente com o básico (casa e comida), mesmo que isso seja mantido com a aposentadoria dos pais ou avós, ou com auxílios monetários como o Bolsa Família.
"Essa distribuição de renda promovida pelo Governo Federal tem um ponto bastante positivo, porém tem um lado perverso, uma vez que muitas pessoas deixam de entrar no mercado de trabalho de maneira proposital para não perder o benefício. Tem pessoas que até trabalham, mas não querem ser registradas para continuar ganhando o Bolsa Família e continuam na informalidade".
A comodidade também é um ponto negativo para quem se contenta com pouco e não busca melhora de vida, além de ser reflexo da baixa instrução.
Outro ponto abordado pelo sociólogo é a falta de autoridade dos pais em relação aos filhos, que ficam soltos e sem compromisso com as responsabilidades. Ao mesmo tempo que os idosos entendem a importância do trabalho, não conseguem repassar isso aos mais novos e nem impor essa obrigatoriedade. "Os jovens de hoje sentem-se soltos e livres devido a falta de cobrança efetiva e sistemática a ponto de fazê-los trabalhar para o próprio sustento".
Comentários