Conferência sugere controle social da mídia e fiscalização do jornalismo
A Conferência Nacional de Comunicação, que terminou nesta quinta-feira, em Brasília, propõe uma série de mudanças no setor – inclusive algumas polêmicas, como o controle social da mídia e a criação de um órgão para fiscalizar o trabalho jornalístico.
Após três dias de debate, cerca de 1,6 mil delegados representando empresas, movimentos sociais e o poder público aprovaram um relatório final com mais de 500 propostas.
O objetivo é que o documento sirva como base para um novo marco regulatório das comunicações. Antes de se transformar em lei, porém, o assunto precisa ser encaminhado para a apreciação do Congresso Nacional.
Uma das propostas mais polêmicas foi aprovada em plenário nesta quinta-feira: a que prevê o controle social da mídia, com a participação popular em diversos processos, como no financiamento e na produção nacional.
Contrários a essa proposta, as empresas argumentaram que o setor já é fiscalizado pelo Ministério das Comunicações e que o “controle social” pode resultar em algum tipo de cerceamento da liberdade de expressão.
Já os representantes da sociedade civil defenderam a mudança, com a justificativa de que a legislação atual não é cumprida e que o setor carece de mecanismos “mais específicos”.
Conselho
O relatório final sugere ainda a criação de um Conselho Federal de Jornalismo, órgão cujo objetivo seria regulamentar a profissão, insitituindo um código de ética e coibindo excessos.
Para a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), entidade que defende a ideia do Conselho, a proposta “trata apenas de regulamentação”.
“(A proposta) nada tem a ver com censura”, disse a secretária-geral da Fenaj, Maria José Braga.
A criação de um Conselho para fiscalizar a atuação dos jornalistas foi proposta pelo governo Lula em 2004 – mas a ideia acabou sendo engavetada após sofrer uma série de críticas.
As propostas da Confecom vão além do Conselho Federal de Jornalismo e incluem, ainda, uma espécie de “tribunal da mídia” para coibir o desrespeito aos direitos humanos e a criação de um código de ética para a profissão.
Participação
O professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UNB), Murilo César Ramos, diz que o termo “controle” tem uma conotação “complicada”, mas que o objetivo não é a censura, mas sim ter um “ordenamento jurídico mais claro para os meios de comunicação”.
“A mídia no Brasil é muito desregulamentada. E o que fizemos aqui na Conferência foi simplesmente reunir as pessoas para esse debate”, diz o professor.
Segundo ele, é natural que algumas propostas tenham ficado com a redação “imprecisa”, o que pode dar margem para interpretações “equivocadas”.
“É preciso lembrar que o debate começou nos Estados e que nem todo mundo aqui conhece os termos específicos. É um movimento popular. O texto será ainda lapidado ao longo de novas discussões”, disse.
O relatório final da Confecom não detalha, por exemplo, como seria feito o controle social ou, ainda, quem teria assento nessa função.
Ingerência
Insatisfeitas com o encaminhamento dos debates que antecederam a Conferência, seis das oito principais entidades empresariais do setor decidiram não participar do evento.
Em nota, entidades como a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) e a Associação Brasileira de Internet (Abranet) justificaram a decisão com o argumento de que “preceitos constitucionais da livre iniciativa” não estavam sendo atendidos.
Entre as empresas, há o entendimento de que a prática do jornalismo já estaria submetida à legislação brasileira, especificamente ao Código Civil – e que a criação de novos mecanismos de fiscalização pode abrir espaço para a censura.
O diretor-geral da Abert, Luis Antonik, diz que “estamos vendo isso todos os dias na América Latina”, segundo ele com medidas de cerceamento à imprensa na Bolívia, Venezuela e Argentina.
“Essa liberdade é uma coisa que conquistamos com muito sacrifício”, diz.
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