Crime sem castigo
Não existe uma regra que determine um prazo padrão para a apuração de um delito e, apesar da previsão processual de 30 dias prorrogáveis por mais 30 para a conclusão de um inquérito policial, na maioria das vezes o prazo é descumprido para que todas as provas sejam apuradas e que todos os elementos que envolvam o delito sejam efetivamente apurados.
Para o advogado criminalista Antonio Gonçalves, isso é o grande problema dos crimes de elevada complexidade, pois, as autoridades competentes devem apurar os acontecimentos para restaurar a maior parte dos elementos possíveis que constituem um crime, por isso são necessários vários exames, como autópsia, balística, perícia criminal e, possivelmente que seja feita até uma reconstituição da cena do crime com o escopo de elucidar ainda mais questões como autoria e o delito em si.
“O grande problema é que ao apurar os fatos as autoridades competentes despendem um tempo elevado entre a data do fato e a conclusão do inquérito policial, o que ocasiona um arrefecimento do ímpeto processual e, por conseguinte, um esquecimento da opinião pública que pode ter como resultado um abrandamento de uma eventual punição”, complementa o especialista.
Segundo Gonçalves não existe entrave no processo, pois ou a policia investiga o crime com a maior gama possível de detalhes, com isso despenderá tempo, ou o inquérito é concluso de forma incompleta o que certamente irá dificultar a ação do Ministério Público seja na denúncia ou no próprio transcurso do processo. “O prazo ganha menor importância na apuração de um crime, pois, um apressamento pode prejudicar, ou até mesmo inviabilizar uma condenação de um criminoso”.
Quando se passa muito tempo para o julgamento, a tendência é que se tenha uma pena mais branda. “No caso de Suzane Von Richthofen, por exemplo, a jovem permaneceu em liberdade por anos e arrefeceu um pouco o ímpeto da opinião pública, que somente após o início do julgamento se reacendeu através da mídia. Essa dilação temporal em termos de julgamento não acarreta muitos benefícios, como no caso dos Nardoni que após mais de um ano sequer foram denunciados e o mesmo pode ocorrer com o Dr. Roger Abdelmassih”.
Para o especialista, a demora entre o delito e a denuncia e posteriormente ao julgamento produz sentimento de impunidade que não é benéfico ao processo. “O ideal é que o acusado seja denunciado no menor tempo possível e que não haja esse lapsto tão dilatado, mas qual seria o preço judicial a ser pago por uma investigação mal feita? Um inocente poderia até ser condenado por uma apuração apressada de um inquérito. A Constituição garante a ampla defesa e o contraditório e, com isso, as autoridades preferem agir com zelo ao serem contaminados pelo ímpeto da opinião publica”, finaliza o especialista.
Antonio Gonçalves é advogado, pós-graduado em Direito Tributário (FGV), Direito Penal Empresarial (FGV) e Direito Penal - Teoria dos Delitos (Universidade de Salamanca - Espanha). Mestre em Filosofia do Direito e Doutorando pela PUC-SP. É especialista em Direito Penal Empresarial Europeu pela Universidade de Coimbra (Portugal); em Criminologia Internacional: ênfase em Novas armas contra o terrorismo pelo Istituto Superiore Internazionale di Scienze Criminali, Siracusa (Itália); e em Direito Ambiental Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional. Fundador da banca Antonio Gonçalves Advogados Associados, é autor, co-autor e coordenador de diversas obras, entre elas, "Quando os avanços parecem retrocessos -Um estudo comparativo do Código Civil de 2002 e do Código Penal com os grandes Códigos da História" (Manole, 2007) e "A História do Direito São Paulo" (Academia Brasileira de História, Cultura, Genealogia e Heráldica, 2008).
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