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Próximo dos 15 anos, Plano Real acabou com a hiperinflação
Em 1992, apenas quatro países em todo mundo tiveram inflação superior a 1.000% - Rússia, Ucrânia, Zaire e Brasil. Este é o cenário da economia brasileira antes do Plano Real e o principal motivo que levou a equipe econômica do presidente Itamar Franco a apresentar mais uma tentativa de reorganizar a política fiscal e monetária do País. Em 1º de julho de 2009 o Plano Real comemora 15 anos de sua moeda e o fato de ter alcançado seu principal objetivo. Nestes últimos 15 anos, a inflação acumulada no Brasil foi de 244%, ou 9% dos 2.477% registrados apenas no ano de 1993. Com essa constatação, o Terra inicia uma série de matérias até a próxima quarta-feira, que marca o aniversário da atual moeda vigente no País.
"O plano real teve esse mérito (de conseguir controlar a inflação)", confirma o professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), Antonio Correa de Lacerda. Mas quando a equipe econômica de Itamar Franco, liderada pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso e que agrupava Persio Arida, André Lara Resende, Gustavo Franco, Pedro Malan, Edmar Bacha, entre outros, apresentou uma nova tentativa de conter a inflação, o Brasil ainda sentia o gosto de recentes experiências frustradas. De congelamento de preços a confisco de valores da poupança, o brasileiro viu naufragar seis planos econômicos desde 1986.
Em março de 1986, durante o governo do presidente José Sarney, o então ministro da Fazenda Dilson Funaro decretava o fim do Cruzeiro e a criação do Cruzado. Além de cortar três zeros da antiga moeda, o Plano Cruzado congelou preços e salários. Sem a remarcação diária de preços, os consumidores elevaram a demanda e as mercadorias desapareceram das prateleiras dos supermercados.
Em novembro do mesmo ano, o governo se viu obrigado a lançar outro pacote de medidas, o Cruzado II, liberando os preços e a inflação contida artificialmente durante o período de congelamento. O impacto no índice de correção de preços foi de 242,23%, em 1985, para 79,66% em 1986. Contudo, Funaro deixa o cargo de ministro para a entrada de Luiz Carlos Bresser Pereira.
O "Plano Bresser" foi apresentado em junho de 1987 e procurava combater o déficit público, além de decretar novo congelamento de preços, aluguéis e salários, desta vez por 60 dias. Para equilibrar os gastos e a arrecadação, o plano aumentou tributos, eliminou subsídios e adiou o investimento estatal em obras de grande porte. O País retomou também as negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e suspendeu a moratória da dívida externa. Mesmo assim, a inflação saltou para 363% em dezembro de 1987.
Bresser é substituido por Mailson da Nóbrega, que começa propondo uma política econômica sem medidas drásticas. No entanto, em 1988 a inflação chega a 980% e Nóbrega lidera o "Plano Verão" - apresentado em janeiro do ano seguinte. O conjunto de medidas cortou mais três zeros da moeda, criando o Cruzado Novo, estabeleceu mais um congelamento de preços, propôs a privatização de algumas estatais e cortes nos gastos públicos. As medidas novamente não dão o resultado esperado e em 1989 a inflação fecha o ano a 1.972%.
A esperança de uma mudança no caminho da economia nacional veio com a euforia da redemocratização. Depois de eleição por voto direto, derrotando Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, o presidente Fernando Collor aprovou um pacote econômico, elaborado pela equipe da ministra Zélia Cardoso de Mello, em março de 1990. O "Plano Collor" resgatava o Cruzeiro e, assim como os anteriores, tabelava preços e salários e pretendia reduzir os gastos públicos, inclusive com demissões de funcionários. A novidade ficou por conta de uma medida que bloqueava o excedente de depósitos bancários acima de Cr$ 50 mil.
No início, a inflação foi reduzida, mas com custos muito altos ao País - aumento do desemprego, fechamento de empresas, queda da produção, além do estardalhaço na opinião pública provocado pelo confisco de parte das poupanças e contas correntes. Para tentar contornar estes efeitos, o governo lançou o "Plano Collor II" em fevereiro de 1991, uma nova tentativa de controlar a inflação que atingiu 1.620% no ano anterior. O novo fracasso dos planos, junto aos escândalos de corrupção no governo levaram ao impeachment de Fernando Collor.
"O Brasil conviveu com ciclo de superinflação, praticamente por 15 anos. É verdade que outros países também tiveram inflação muito alta, mas em períodos muito curtos. Foi uma tragédia do ponto de vista nacional", lembra o atual presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann.
O planejamento do Plano Real começou em 1993, com o Programa de Ação Imediata (PAI), que tinha as primeiras medidas para enfrentar a hiperinflação. O documento apresentado a Itamar Franco em julho daquele ano continha seis pontos principais: o corte e maior eficiência nos gastos públicos; recuperação da receita tributária; fim da inadimplência de Estados e municípios em relação às dívidas com a União; controle e rígida fiscalização dos bancos estaduais; saneamento dos bancos federais; e a aceleração do processo de privatização.
Diferentemente das tentaivas anteriores, o Plano Real não se baseou no congelamento de preços e salários e também não estabeleceu uma nova moeda imediatamente. Foi criada a Unidade Real de Valor (URV) para desvincular os preços do Cruzeiro Real e que depois seria convertida diretamente para o Real, cuja primeira emissão ocorreu em 1º de julho de 1994.
Lastreado por reservas internacionais na exata proporção ao dólar, o real começou a circular com valor acima da moeda americana, chegando a valer até US$ 0,80. As importações de matérias-primas e máquinas ficaram mais atrativas e os produtos importados chegavam com os preços abaixo dos similares nacionais, o que pesou na balança comercial. O impacto na inflação foi imediato e o índice ficou em 18,57% de julho a dezembro.
Efeitos colaterais "O Plano conseguiu, no início, atrelar o real ao dólar e, com isso, debelar a inflação", explica o professor de Economia da PUC, Antonio Correa de Lacerda. No entanto, ao mesmo tempo em que amenizava a inflação, a estratégia escolhida pela equipe de Fernando Henrique, produzia seus efeitos colaterais. "O Plano Real também gerou problemas para a economia, promoveu uma valorização muito grande do real frente ao dólar e deixou o País muito vulnerável", diz Lacerda.
"A opção que fizemos por estabilizar a inflação através da valorização da moeda nacional retirou a possibilidade de o Brasil ter se aproveitado do ciclo de expansão comercial. Há uma ruptura na trajetória da participação do Brasil no comércio do mundo. As exigências da estabilidade fizeram o País operar em déficit comercial e ficamos muito vulneráveis às crises que o mundo viveu", afirma Pochmann. O atual presidente do Ipea, em 1994 então assessor no Ministério do Trabalho, lembra que o lançamento do Real não contemplou outras medidas propostas, na sua opinião, fato que levou o sucesso do Plano ficar restrito.
"Não é que o plano esqueceu de discutir a estabilidade econômica e social, mas na verdade as opções feitas comprometeram o restante. Em 1993 e 1994, eu era assessor do ministro do Trabalho Walter Barelli. Ajudava na negociação do ministério com a Fazenda e o BC. A nossa sugestão era que, junto à implementação do Plano Real, era necessário um conjunto de outras medidas que também tivesse fim social e econômico. Sugerimos a implantação do contrato coletivo de trabalho - uma superação para o fim da correção monetária - e uma política explícita para o salário mínimo. Havia um conjunto grande de medidas, mas foram todas vetadas por Pedro Malan (então presidente do BC), Gustavo Franco (então secretário-adjunto de política econômica na Fazenda) e Edmar Bacha (então assessor especial na Fazenda). Houve uma opção explícita somente pela estabilidade monetária. As discussões foram muito longas, o presidente Itamar (Franco) não tinha muita convicção de dar certo ou não, era o final do governo. Houve uma visão extremamente economicista. As medidas tinham que ser contra inflação e depois seriam implementadas outras modalidades - o que nunca aconteceu. Já no final do ano (de 1994) teve a crise mexicana, e o País passou por uma fase de administração de crises internacionais, que não tinham a ver com o Brasil", conta Pochmann.
Ainda assim, a economia foi reaquecida com a entrada das classes C e D no mercado consumidor, aumento da oferta de crédito e prestações sem aumento todo mês. O PIB cresceu 5,67% em 1994, com o setor industrial apresentando expansão de 7%. "O principal objetivo do Plano Real era conseguir a estabilização dos preços", resume Lacerda. "O mérito do Plano foi ter conseguido alcançar a estabilidade", concorda Pochmann.
Até quarta-feira, o Terra vai apresentar matérias que mostram a evolução da inflação, crédito e salário mínimo antes e depois do Plano Real, além de discutir as heranças que o plano econômico deixaram para assegurar que o Brasil tenha uma melhor base econômica para ajudar no crescimento futuro.
"O plano real teve esse mérito (de conseguir controlar a inflação)", confirma o professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), Antonio Correa de Lacerda. Mas quando a equipe econômica de Itamar Franco, liderada pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso e que agrupava Persio Arida, André Lara Resende, Gustavo Franco, Pedro Malan, Edmar Bacha, entre outros, apresentou uma nova tentativa de conter a inflação, o Brasil ainda sentia o gosto de recentes experiências frustradas. De congelamento de preços a confisco de valores da poupança, o brasileiro viu naufragar seis planos econômicos desde 1986.
Em março de 1986, durante o governo do presidente José Sarney, o então ministro da Fazenda Dilson Funaro decretava o fim do Cruzeiro e a criação do Cruzado. Além de cortar três zeros da antiga moeda, o Plano Cruzado congelou preços e salários. Sem a remarcação diária de preços, os consumidores elevaram a demanda e as mercadorias desapareceram das prateleiras dos supermercados.
Em novembro do mesmo ano, o governo se viu obrigado a lançar outro pacote de medidas, o Cruzado II, liberando os preços e a inflação contida artificialmente durante o período de congelamento. O impacto no índice de correção de preços foi de 242,23%, em 1985, para 79,66% em 1986. Contudo, Funaro deixa o cargo de ministro para a entrada de Luiz Carlos Bresser Pereira.
O "Plano Bresser" foi apresentado em junho de 1987 e procurava combater o déficit público, além de decretar novo congelamento de preços, aluguéis e salários, desta vez por 60 dias. Para equilibrar os gastos e a arrecadação, o plano aumentou tributos, eliminou subsídios e adiou o investimento estatal em obras de grande porte. O País retomou também as negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e suspendeu a moratória da dívida externa. Mesmo assim, a inflação saltou para 363% em dezembro de 1987.
Bresser é substituido por Mailson da Nóbrega, que começa propondo uma política econômica sem medidas drásticas. No entanto, em 1988 a inflação chega a 980% e Nóbrega lidera o "Plano Verão" - apresentado em janeiro do ano seguinte. O conjunto de medidas cortou mais três zeros da moeda, criando o Cruzado Novo, estabeleceu mais um congelamento de preços, propôs a privatização de algumas estatais e cortes nos gastos públicos. As medidas novamente não dão o resultado esperado e em 1989 a inflação fecha o ano a 1.972%.
A esperança de uma mudança no caminho da economia nacional veio com a euforia da redemocratização. Depois de eleição por voto direto, derrotando Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, o presidente Fernando Collor aprovou um pacote econômico, elaborado pela equipe da ministra Zélia Cardoso de Mello, em março de 1990. O "Plano Collor" resgatava o Cruzeiro e, assim como os anteriores, tabelava preços e salários e pretendia reduzir os gastos públicos, inclusive com demissões de funcionários. A novidade ficou por conta de uma medida que bloqueava o excedente de depósitos bancários acima de Cr$ 50 mil.
No início, a inflação foi reduzida, mas com custos muito altos ao País - aumento do desemprego, fechamento de empresas, queda da produção, além do estardalhaço na opinião pública provocado pelo confisco de parte das poupanças e contas correntes. Para tentar contornar estes efeitos, o governo lançou o "Plano Collor II" em fevereiro de 1991, uma nova tentativa de controlar a inflação que atingiu 1.620% no ano anterior. O novo fracasso dos planos, junto aos escândalos de corrupção no governo levaram ao impeachment de Fernando Collor.
"O Brasil conviveu com ciclo de superinflação, praticamente por 15 anos. É verdade que outros países também tiveram inflação muito alta, mas em períodos muito curtos. Foi uma tragédia do ponto de vista nacional", lembra o atual presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann.
O planejamento do Plano Real começou em 1993, com o Programa de Ação Imediata (PAI), que tinha as primeiras medidas para enfrentar a hiperinflação. O documento apresentado a Itamar Franco em julho daquele ano continha seis pontos principais: o corte e maior eficiência nos gastos públicos; recuperação da receita tributária; fim da inadimplência de Estados e municípios em relação às dívidas com a União; controle e rígida fiscalização dos bancos estaduais; saneamento dos bancos federais; e a aceleração do processo de privatização.
Diferentemente das tentaivas anteriores, o Plano Real não se baseou no congelamento de preços e salários e também não estabeleceu uma nova moeda imediatamente. Foi criada a Unidade Real de Valor (URV) para desvincular os preços do Cruzeiro Real e que depois seria convertida diretamente para o Real, cuja primeira emissão ocorreu em 1º de julho de 1994.
Lastreado por reservas internacionais na exata proporção ao dólar, o real começou a circular com valor acima da moeda americana, chegando a valer até US$ 0,80. As importações de matérias-primas e máquinas ficaram mais atrativas e os produtos importados chegavam com os preços abaixo dos similares nacionais, o que pesou na balança comercial. O impacto na inflação foi imediato e o índice ficou em 18,57% de julho a dezembro.
Efeitos colaterais "O Plano conseguiu, no início, atrelar o real ao dólar e, com isso, debelar a inflação", explica o professor de Economia da PUC, Antonio Correa de Lacerda. No entanto, ao mesmo tempo em que amenizava a inflação, a estratégia escolhida pela equipe de Fernando Henrique, produzia seus efeitos colaterais. "O Plano Real também gerou problemas para a economia, promoveu uma valorização muito grande do real frente ao dólar e deixou o País muito vulnerável", diz Lacerda.
"A opção que fizemos por estabilizar a inflação através da valorização da moeda nacional retirou a possibilidade de o Brasil ter se aproveitado do ciclo de expansão comercial. Há uma ruptura na trajetória da participação do Brasil no comércio do mundo. As exigências da estabilidade fizeram o País operar em déficit comercial e ficamos muito vulneráveis às crises que o mundo viveu", afirma Pochmann. O atual presidente do Ipea, em 1994 então assessor no Ministério do Trabalho, lembra que o lançamento do Real não contemplou outras medidas propostas, na sua opinião, fato que levou o sucesso do Plano ficar restrito.
"Não é que o plano esqueceu de discutir a estabilidade econômica e social, mas na verdade as opções feitas comprometeram o restante. Em 1993 e 1994, eu era assessor do ministro do Trabalho Walter Barelli. Ajudava na negociação do ministério com a Fazenda e o BC. A nossa sugestão era que, junto à implementação do Plano Real, era necessário um conjunto de outras medidas que também tivesse fim social e econômico. Sugerimos a implantação do contrato coletivo de trabalho - uma superação para o fim da correção monetária - e uma política explícita para o salário mínimo. Havia um conjunto grande de medidas, mas foram todas vetadas por Pedro Malan (então presidente do BC), Gustavo Franco (então secretário-adjunto de política econômica na Fazenda) e Edmar Bacha (então assessor especial na Fazenda). Houve uma opção explícita somente pela estabilidade monetária. As discussões foram muito longas, o presidente Itamar (Franco) não tinha muita convicção de dar certo ou não, era o final do governo. Houve uma visão extremamente economicista. As medidas tinham que ser contra inflação e depois seriam implementadas outras modalidades - o que nunca aconteceu. Já no final do ano (de 1994) teve a crise mexicana, e o País passou por uma fase de administração de crises internacionais, que não tinham a ver com o Brasil", conta Pochmann.
Ainda assim, a economia foi reaquecida com a entrada das classes C e D no mercado consumidor, aumento da oferta de crédito e prestações sem aumento todo mês. O PIB cresceu 5,67% em 1994, com o setor industrial apresentando expansão de 7%. "O principal objetivo do Plano Real era conseguir a estabilização dos preços", resume Lacerda. "O mérito do Plano foi ter conseguido alcançar a estabilidade", concorda Pochmann.
Até quarta-feira, o Terra vai apresentar matérias que mostram a evolução da inflação, crédito e salário mínimo antes e depois do Plano Real, além de discutir as heranças que o plano econômico deixaram para assegurar que o Brasil tenha uma melhor base econômica para ajudar no crescimento futuro.
Fonte:
Terra
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