Crédito e seguro rural, continuam os gargalos
O Banco do Brasil comemora o aumento das cifras disponibilizadas para financiamento do setor agrícola para a safra 2008/2009. Contabilizou, até maio, R$ 27,5 bilhões – 28% superior ao que foi oferecido para a safra anterior. O plano de safra 2009/2010, com promessa de mais crédito para a “classe média” rural e cooperativas agropecuárias, acaba de ser anunciado. Divulga-se um montante de R$ 107,5 bilhões no total, 37,8% a mais em relação à safra anterior.
Em um momento em que as instituições financeiras reduziram as linhas de crédito, o plano de safra merece elogios. Mas não é suficiente.
O produtor agrícola está fragilizado, sobrevive há décadas de safras frustradas, advindas de intempéries climáticas, que geraram dívidas estratosféricas. Tanto é verdade que, em muitos casos, financiamentos obtidos após a repactuação das dívidas acabam voltando ao caixa dos bancos na forma de pagamento de prestações em atraso.
Por isso, não é unicamente a liberação de crédito, sempre ressaltada pelo governo, que levará o setor à necessária estabilidade. É preciso que sejam repactuadas as bases para o acesso a esse crédito e oferecidos mecanismos para que os produtores possam ficar protegidos contra novos prejuízos. Nesse processo, volta à tona o debate em torno do seguro rural, que além de cobrir custos de plantio (a começar por sementes e fertilizantes) deve garantir a renda do produtor.
As dificuldades começam na mesa do gerente do banco. As garantias exigidas pelas instituições financeiras são um dos maiores entraves enfrentados pelos produtores. As regras que regulam a contratação do crédito rural são as mesmas que regem todo o sistema financeiro. Ignora-se que o setor agrícola tem suas peculiaridades. Nos jornais, divulga-se que está sobrando dinheiro no crédito rural. Com certeza, pois o recurso não tem chegado ao produtor por conta do exagero de exigências.
É fundamental a modernização do sistema de crédito rural. São medidas necessárias e urgentes a reavaliação do patrimônio em parâmetros mais justos; a aceitação de outros bens que não a propriedade como garantia; a liberação de parte do bem proporcionalmente ao que já foi quitado para que sejam contraídos novos empréstimos; e a aceitação de garantias em 2º e 3º graus, de modo que uma mesma propriedade possa ser instrumento de validação de mais de um empréstimo – medida esta adotada pelos bancos comerciais, mas negada pelos bancos oficiais.
Ao lado da revisão das bases das garantias exigidas para a obtenção do crédito, o seguro é outro ponto crucial. O produtor agrícola precisa se precaver de novos prejuízos para que possa se manter no campo e continuar a trabalhar. O seguro rural nos moldes em que se aplica no Brasil não atende às especificidades do setor, já que se restringe a expectativas de produção baseadas em parâmetros defasados, estabelecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O último censo é de 1996. Portanto, os índices de produtividade utilizados pelas companhias de seguro não refletem os avanços tecnológicos e o consequente aumento da produtividade no campo. Assim como não levam em conta as particularidades de cada região.
Tudo isso significa que o produtor, ao ter perda de safra, é ressarcido de forma insuficiente, apenas em parte do que alcançaria se São Pedro atendesse às preces. Pior ainda são as cláusulas dos contratos de seguro rural que, invariavelmente, submetem a validade do seguro a uma vistoria técnica da lavoura, a ser realizada em 15 dias após a contratação, para se verificar o vigor das plantas. Se minguadas ou danificadas por qualquer sinistro neste “período de carência”, nulo é o contrato e totalmente desprotegido fica o nosso homem do campo.
Há espaço para esses absurdos porque o seguro rural no país não é atraente nem para o produtor nem para as seguradoras ou resseguradoras. Falta concorrência no mercado. No Congresso tramita projeto que cria o Fundo de Catástrofe, uma reivindicação antiga do setor agrícola brasileiro. Tem como objetivo garantir indenizações para grandes prejuízos provocados por calamidades climáticas. Esse fundo vai reduzir os riscos para seguradoras e resseguradoras, atraindo novas empresas para o mercado e, consequentemente, diminuindo os custos do seguro para os produtores. Relevante também é que o dinheiro das subvenções abrangerá um número bem maior de propriedades.
Enquanto o poder público não avança nessas questões, que em muito aliviariam as pressões sofridas pelo setor, o cooperativismo continua cumprindo o seu papel econômico com viés social no campo. Espelho da situação crítica na agropecuária, as cooperativas, apesar de abaladas, são o alento dos produtores, principalmente os pequenos, ao proporcionarem redução de custos na aquisição de insumos, acesso a novas tecnologias e negociações mais vantajosas em virtude do volume de produção do conjunto de cooperados.
Em um país de proporções territoriais gigantescas, como o Brasil, o setor agrícola é estratégico e estratégica deve ser sua política de financiamento, crédito e seguro. Não modernizar o setor é torná-lo inviável. Inviabilizá-lo é inviabilizar o país.
* Edivaldo Del Grande é presidente da Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp)
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