Por mais que a situação seja de sobrecarga de trabalho, o Judiciário tem o dever de analisar todas as teses suscitadas nos processos. Por isso, o ministro Sidnei Beneti, do Superior Tribunal de Justiça,determinou ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que discuta os argumentos dos herdeiros do compositor Noel Rosa numa ação sobre contrato de cessão de direitos autorais.
O caso remete à década de 1930, quando Noel Rosa e sua mulher, Lindaura Silveira, assinaram contratos de venda e cessão de direitos autorais com a Mangione Filhos e Companhia. Os herdeiros do compositor afirmam que, apesar de os contratos terem o nome de “cessão de direitos”, dão à Mangione apenas o direito de edição das músicas e pode ser rescindido no caso de inadimplência.
A família de Noel Rosa, representada pelo advogado Cristiano Zanin Martins, do Teixeira, Martins e Advogados, foi à Justiça pedir a rescisão do contrato, alegando que a detentora dos direitos, a Magione, não vinha pagando as parcelas combinadas. O pedido foi negado em primeira e em segunda instâncias. Na Apelação ao TJ do Rio, o desembargador Jessé Torres afirmou que havia prova documental de que os pagamentos foram feitos. Se esses pagamentos foram irregulares, escreveu, isso deveria ser apurado em procedimento próprio.
Os herdeiros entraram com Embargos de Declaração no próprio TJ, mas tiveram o pedido rejeitado. Foram ao STJ, por meio de Recurso Especial. Alegaram que houve cerceamento de defesa: no primeiro grau, afirmaram, o juiz não apreciou pedido de perícia feito pela família de Noel Rosa e, na segunda instância, acusaram o tribunal de não ter analisado o pedido de afastamento da prescrição, alegada pela Mangione no processo.
Sem entrar no mérito, o ministro Sidnei Beneti deu razão à família do compositor na discussão processual. Afirmou que, como o TJ não discutiu todas as alegações das partes no processo, “terminou por negar prestação jurisdicional à recorrentes [os herdeiros]”. “É pacífico o entendimento neste Superior Tribunal de que há violação do artigo 535 do CPC se o acórdão insiste em não sanar o vício que efetivamente ocorre, como é o caso dos autos.”
A decisão foi monocrática. O ministro explicou que, como a tese já está pacificada na jurisprudência do STJ, ele poderia tomar a decisão de ofício, nos termos do artigo 557 do Código de Processo Civil.
Juiz há mais de 40 anos, Beneti reconheceu, em seu voto, a situação assoberbada em que se encontram os tribunais do país, mas salientou que a solução para esse problema não pode ser deixar de analisar certas argumentações, sob pena de falta de prestação jurisdicional. “Lastima-se a presente conclusão, especialmente considerando-se a enorme quantidade de recursos na massa de trabalho dos tribunais estaduais, entre os quais o respeitado Tribunal de Justiça de origem, mas não se vê outra solução para o caso senão a anulação do julgamento para que novo se realize.”
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REsp 1.383.425
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