Famílias vivem abandonadas em estrada de MT
A construção da BR-163, há mais de 30 anos, desenvolveu regiões, mas trouxe também o desmatamento e a pobreza. Quando aceitou o convite do governo militar para ajudar a colonizar a Amazônia, na divisa de Mato Grosso com o Pará, o gaúcho Ladislau Juppen achou que estava diante da grande chance da vida. Não demorou para se desiludir. "O pessoal trouxe e largou a gente assim, ao Deus dará", afirma. Sua esposa também o passou muito medo. "Logo que a gente chegou, a casa não tinha porta, não tinha janela, era tudo mato, as onças vinham gritar em volta de casa", lembra Teresa Juppen.
Era início dos anos 1980. A família Juppen persistiu, desmatou metade do terreno, como determinou o governo, e plantou feijão, arroz e milho. O problema é que não havia pra quem vender, e Ladislau teve que buscar o sustento no garimpo, sofrendo com as doenças. "Para te falar a verdade, eu passei mais de cem malárias", relata. Dos 129 colonos que vieram com Ladislau, apenas sete ficaram. Muitos venderam o sítio pelo preço da passagem de volta.
O mesmo cenário se repetiu em dezenas de assentamentos em que a equipe de reportagem passou. A situação é pior onde a estrada abandonada não é nem sombra da rodovia que prometeu levar o desenvolvimento à região. Castelo dos Sonhos, no Pará, é exemplo dessa decepção. A vila é um distrito da cidade de Altamira, que fica a 1.000 km de distância.
Na escola pública de Castelo dos Sonhos, parte dos professores é emprestada de Belém e Altamira. Eles ensinam durante 50 dias as matérias do ano inteiro e vão embora. "Só temos um livro de biologia pra o ensino médio. Falta para todas as outras disciplinas", diz a diretora da escola.
Prosperidade agrícola
Em Mato Grosso, onde o asfalto chegou, a realidade é bem diferente. A lavoura tomou o lugar da floresta, mas a agricultura fez cidades prosperarem. O município de Sorriso, por exemplo, é o maior produtor de soja do mundo. São 30 milhões de sacas por ano. Já em Lucas do Rio Verde, cidade vizinha, o ensino é modelo. As escolas municipais têm piscina, e as crianças que moram longe, em assentamentos, passam o dia todo lá. Além do café da manhã, almoço e lanche, jantam antes de voltar pra casa.
Durante quatro anos, de 2004 a 2007, Lucas do Rio Verde ganhou o prêmio 'Gestor Eficiente da Merenda Escolar', dado pelo Ministério da Educação. Lá eles produzem praticamente tudo o que consomem.
Na esteira do sucesso do município, há pessoas que enriqueceram. O ex-sem-terra, Ildo Romancini, por exemplo, comemora as conquistas. Chegou há 27 anos emLucas do Rio Verde. Hoje vive da agricultura e é dono de um supermercado da cidade. A mulher dele, Nilva Romancini, divide a vida na cidade entre antes e depois do asfalto da BR-163. "Quando fui ter minha filha em Sorriso, eu fui de carona numa carreta. Chegamos lá e tive que me lavar antes de me consultar, porque tava toda cheia de poeira", conta.
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