Avicultura quer enfrentar crise com menor produção
A crise financeira mundial está batendo às portas da economia real e já coloca de sobreaviso um dos principais setores exportadores brasileiros: a avicultura. Com 35% da produção voltada para o mercado externo, o setor não quer ser surpreendido com excesso de carne no próximo ano. O momento é de cautela e de corte na produção, avaliam dirigentes de associações do setor.
Tudo o que a avicultura não quer ver é o filme do primeiro semestre de 2006, quando os consumidores brasileiros foram brindados com preços extremamente baixos e embalagens escritas em árabe e em russo. Aquele produto, que deveria ser comercializado no mercado externo, acabou ficando no interno devido à queda mundial de demanda. A alegria dos consumidores custou caro para os produtores.
Se naquele ano os problemas vieram da própria avicultura, devido ao avanço da gripe aviária, que provocou forte queda mundial de consumo, agora as ameaças vêm de fora do setor, mas podem ser tão contundentes quanto às de 2006.
O esperado recuo no avanço da economia mundial, devido à crise financeira internacional, deve desacelerar o consumo.
Essa crise já feriu uma das líderes do setor, a Sadia, que teve prejuízo de R$ 760 milhões com operações de câmbio. No interior paulista, a Frango Forte, um frigorífico com exportações para Europa, Ásia e Mercosul, e que já vinha com dificuldades de obtenção de crédito mesmo antes do agravamento da crise, teve seus problemas acentuados. A falta de recursos fez a empresa suspender o fornecimento de ração a produtores integrados.
Se o setor não planejar bem a produção, a desova de carne produzida para fora poderá, mais uma vez, ocorrer no país.
Para prevenir essa eventual sobra de carne de frango, o setor se mobiliza visando um melhor planejamento. Eduardo Santos, secretário-executivo da Asgav (Associação Gaúcha de Avicultura), diz que não vai haver o desmoronamento do setor, mas os produtores devem ficar em estado de alerta. "É preciso observar a Europa e a Ásia e como se comportam os importadores."
Redução
"O cenário é de incertezas e o recado é o de redução de alojamento", diz Ariel Antônio Mendes, presidente da UBA (União Brasileira de Avicultura). As exportações -que estão com altas de 20% em volume e de 40% em receitas em relação a 2007- são a preocupação. Na avaliação de Mendes, além da ameaça da queda de consumo, pelo menos 50% das exportadoras trabalham com crédito de bancos internacionais, canal que foi interrompido.
Esse crédito servia de capital de giro para as empresas, que, agora, terão mais dificuldades, principalmente porque não há repasse do crédito do governo pelos bancos.
As recomendações da UBA sinalizam sobre dados concretos e são necessárias porque as grandes empresas têm acompanhamento contínuo dos mercados interno e externo, o que não ocorre com o pequeno produtor, segundo Mendes. Este não tem informações sobre o mercado e, se produzir a mais, vai amargar prejuízo, na avaliação do presidente da UBA.
Os produtores não têm um número mágico quanto ao corte de produção, mas estudo da UBA indica que os consumos interno e externo estão próximos de 935 mil toneladas por mês, mas que o alojamento de matrizes e de pintainhos já indica para uma oferta de 1,1 milhão de toneladas. Uma taxa de corte, portanto, seria de 12%, que deve ocorrer principalmente nas empresas exportadoras, já que o consumo interno cresce, embora pouco. A produção brasileira de carne de frango está próxima de 11 milhões de toneladas por ano.
Domingos Martins, do Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Paraná, líder nacional, diz que o corte deve ser de pelo menos 5%. O país atingiu produção recorde devido aos bons indicadores conquistados com as exportações em 2007 e à própria demanda interna. "A obtenção desses ganhos deu estímulos ao setor para promover uma série de investimentos visando aumentar a produção."
Oto Xavier, da Assessoria Agropecuária Jox, diz que o momento é preocupante. O mercado consumidor interno está depauperado, e o externo começa a exigir renegociação de contratos. Além da demanda mais fraca por lá, o importador quer renegociar parte da margem obtida pelo exportador com a desvalorização do real.
Para o analista José Carlos Teixeira, "o setor tem de fazer um planejamento estratégico para equilíbrio de oferta". O alojamento atual de matrizes permite maior produção de pintos que vão para a engorda.
Apesar desse cenário que se apresenta, o setor destaca que o Brasil assumiu a liderança mundial com redução de custos e um produto de qualidade.
Além disso, as exportações já se espalham por mais de mais de 150 países, o que garante um bom canal de distribuição.
Santos, da Asgav, destaca, no entanto, que essa confiabilidade foi construída com defesa sanitária, setor que o Brasil não pode descuidar. Para ele, empresas e governo devem estar atentos às condições sanitárias.
Colaborou DIMITRI DO VALLE, da Agência Folha, em Curitiba
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