Crise afeta a soja e deve reduzir expansão do plantio
Há 30 dias, o produtor de soja de Mato Grosso tinha previsão de margem de lucro de 12% por hectare. Ontem, os números já indicavam prejuízo de 5% a 10% nas regiões norte e oeste do Estado, dependendo das condições de cada produtor.
Com isso, muitos produtores, principalmente os que ainda não fizeram um pacote de compra dos insumos, podem desistir do plantio. As consultorias que acompanham a evolução de safra já indicam a queda.
A Céleres, de Uberlândia (MG), divulgou ontem que a estimativa anterior de crescimento de 5% na área de plantio de soja não deve se confirmar mais. A consultoria prevê, agora, evolução de apenas 3%.
A Agência Rural, de Curitiba (PR), aponta para a mesma direção. Inicialmente previa evolução de 6% na área a ser semeada com a oleaginosa, mas os analistas da consultoria --que ainda não terminaram o levantamento- indicam crescimento de apenas 3%.
O plantio de milho também recua. Na primeira safra, a queda deverá ser de 3,3%, caindo para 9,3 milhões de hectares. Já a safrinha volta para 4,6 milhões de hectares, com recuo de 3,9%, segundo a Céleres.
Nelson José Vacari, de Nova Mutum (MT), diz que os produtores, sem remuneração, vão fugir da safrinha de milho.
O algodão também não passa imune a esse momento difícil do setor. Nas lavouras da Bahia, onde a produtividade e a qualidade do produto são melhores, a área deverá ser mantida. Em Mato Grosso, as indicações são de redução de 15%. Os dois Estados respondem por 80% da produção nacional de algodão.
Essa situação da agricultura brasileira foi gerada pela deterioração do sistema financeiro internacional, iniciada nos Estados Unidos. A instabilidade trouxe falta de liquidez e ameaças de profunda recessão. Com isso, os produtores, além de ficarem sem crédito, estão vendo despencar os preços das commodities.
"Vamos plantar porque não podemos parar, principalmente devido aos investimentos feitos e à estrutura montada, mas nos preocupa muito o que vem pela frente", afirma Walter Horita, um dos principais produtores de algodão do país, que também produz soja e milho no oeste baiano.
Os preços da soja e do milho estão "derretendo", na avaliação de Horita, mas ainda estão acima da média histórica, devido à forte alta no primeiro semestre. Já o algodão, que não acompanhou essa euforia na alta, está seguindo esses produtos na baixa.
"E o custo de produção do algodão é 3,5 vezes superior ao da soja", diz Horita.
"De tirar o sono"
"Esta vai ser uma safra de tirar o sono", diz Fernando Muraro, da Agência Rural. Com expectativa bastante favorável no primeiro semestre, o cenário passa a ser bastante adverso a partir de agora, diz ele.
Diferentemente de anos anteriores, esta é uma safra com pouca antecipação de vendas e custos elevados no plantio. Os produtores, animados com a possibilidade de preços melhores, não fecharam contratos de venda. Além disso, as tradings também não ficaram interessadas nessa operação devido à volatilidade dos preços.
Isso significa que o produtor assumiu custo elevado na produção, mas tem muita incerteza quanto aos preços no período da safra.
O câmbio terá efeito sobre a renda dos produtores, mas não será suficiente para cobrir margens negativas em algumas regiões produtoras, na avaliação de Muraro. No primeiro semestre, as commodities subiam, mas o câmbio caía. Agora, que o dólar se valoriza em relação ao real, os preços das commodities caem.
Crédito e incertezas quanto ao preço de venda final da nova safra também foram motivos para a Céleres prever área de 21,9 milhões de hectares para a soja, apenas 3% a mais do que em 2007/8.
A produtividade fica em 2.812 quilos por hectare e a produção deve atingir 61,7 milhões de toneladas, volume recorde, mas 3,4% inferior à estimativa do mês anterior.
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