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Nacional
Sexta - 30 de Maio de 2008 às 00:47
Por: Felipe Maia

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O aval às pesquisas científicas com células-tronco embrionárias, concedido nesta quinta-feira (29) pelo STF (Supremo Tribunal Federal), dá tranqüilidade aos cientistas para a realização desses estudos, segundo especialistas ouvidos pela Folha Online. O STF nunca chegou a proibir esses testes, mas muitos profissionais ficaram receosos em continuar com os procedimentos, em razão do impasse jurídico.

"Houve uma desaceleração. Alunos de pós-graduação, e até mesmo eu, ficamos receosos em investir em uma carreira que corria o risco de ficar ilegal", afirma o neurocientista Stevens Kastrup Rehen, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), que coordena um dos primeiros laboratórios nacionais a ter sucesso no cultivo dessas células.

As células-tronco embrionárias são consideradas esperança de cura para algumas das doenças mais mortais. Elas podem se converter em praticamente todos os tecidos do corpo humano.

Entretanto, o método de sua obtenção é polêmico, já que a maioria das técnicas implementadas nessa área exige a destruição do embrião.

Para o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, que propôs a ação contra as pesquisas com células-tronco, o embrião pode ser considerado vida humana --esse foi um dos argumentos utilizados por ele para pedir a inconstitucionalidade do artigo 5º da Lei de Biossegurança.

Na visão de Rehen, a aprovação das pesquisas também deve elevar o investimento na área, tanto pelos governos, quanto pela iniciativa privada. O grupo do pesquisador estuda, desde 2005, o uso de células-tronco embrionárias para a cura do mal de Parkinson e de lesões medulares. O objetivo é produzir neurônios que possam ajudar nessa cura.

O ministro José Gomes Temporão (Saúde) comemorou a decisão do STF. "As pesquisas de células-tronco abrem inúmeras possibilidades para encontrarmos respostas para doenças que não têm tratamento hoje. O resultado permite à ciência brasileira assumir uma nova posição no cenário internacional", afirmou, em comunicado.

Normas

Pelos termos do artigo 5º da Lei de Biossegurança, mantido pelo STF, podem ser utilizadas as células-tronco fertilizadas in vitro e não utilizadas. A regulamentação prevê que os embriões usados estejam congelados há três anos ou mais e veta a comercialização do material biológico. Também exige a autorização do casal.

Mas, mesmo na comunidade científica, há quem discorde desses procedimentos. A bioquímica Lenise Garcia, professora do departamento de biologia celular da UnB (Universidade de Brasília), classifica a liberação das pesquisas como "uma derrota para a dignidade humana", em um cenário em que o homem "perde consciência de si mesmo".

Para Garcia, as pesquisas deveriam priorizar o uso de células adultas, que segundo ela, já mostraram resultados mais efetivos. "Ninguém foi curado por célula embrionária, o que tem dado resultado são as células adultas. Você vai tirar do que dá certo, para algo que não tem comprovação", afirma a pesquisadora.

Sara Saad, professora titular de hematologia e hemoterapia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), discorda dessa avaliação. Para ela, as células-tronco embrionárias ainda não foram estudadas o suficiente.

"Precisamos ter estudos em grande escala, para obtermos resultados mais rápidos. Se ficarmos travando [as pesquisas], não vai deslanchar nunca", diz. "Sabemos que [as células-tronco embrionárias] têm um grande potencial, mas estamos apenas começando. É algo que se estuda há pouquíssimo tempo".

Apesar disso, Saad, que pesquisa a utilização de células-tronco adultas, afirma que não tem interesse em usar as embrionárias.

Religião

A CNBB (Conferência Nacional de Bispos do Brasil) lamentou a decisão do STF de liberar as pesquisas. Para a instituição, o embrião "tem direito à proteção do Estado". "Portanto, não se trata de uma questão religiosa, mas de promoção e defesa da vida humana, desde a fecundação, em qualquer circunstância em que esta se encontra", afirma, em nota.

Lenise Garcia, que afirma ser católica, também nega que apenas argumentos religiosos podem ser utilizados para reprovar esse tipo de pesquisa. "O argumento é científico. É a ciência que me diz que, quando um espermatozóide se funde com um óvulo, forma-se um ser humano", diz a professora da UnB.

Segundo Mayana Zatz, geneticista e pesquisadora da USP (Universidade de São Paulo), o próximo passo será submeter os projetos de pesquisa já existentes nessa área às comissões de ética e agências de financiamento. "Os ministros do Supremo é que tornaram possível essa vitória. Agora, estamos no mesmo barco do resto do mundo", afirmou.

Ela disse também estar otimista em relação aos resultados que serão obtidos no futuro. "Espero que, dentro de alguns anos, quando nós tivermos resultados, aqueles que votaram contra digam, 'eles tinham razão", afirmou.

Com EDUARDO CUCOLO, da Folha Online, em Brasília





Fonte: Folha Online

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