Evo Morales convoca referendo na Bolívia
Desde terça-feira, movimentos sociais partidários do MAS (Movimento ao Socialismo, partido de Evo) cercavam o Congresso Nacional para exigir dos congressistas a aprovação das leis do referendo. O vice-presidente do país, Álvaro Garcia Linera, pediu uma trégua de dois meses aos movimentos sociais e aos projetos de autonomia impulsionados por Santa Cruz, para um entendimento com a oposição.
Sem acordo com o principal partido opositor (Podemos), e com a trégua rechaçada pelos dois lados, o governo rompeu ontem todas as tentativas de diálogo. Em uma sessão marcada pela ausência dos congressistas opositores (que acusa os movimentos sociais de agressões e impedimentos para entrar no Congresso), a casa parlamentar aprovou as duas leis de convocatória, promulgadas hoje pelo presidente, além de uma outra lei que impede os departamentos de convocar referendos para seus estatutos.
A crise política
A nova Constituição Política do Estado (CPE) é uma promessa política de Morales de quando era candidato a presidente. O documento foi aprovado em 9 de dezembro do ano passado, na cidade de Oruro, sem presença significativa da oposição (apenas 4 deles), que não participou das últimas sessões justificando "ilegalidades e falta de legitimidade". A Carta foi aprovada por 165 congressistas, cinco a menos do que o necessário para atingir os dois terços (de 255) estabelecidos em lei, instalando a crise política no país.
A oposição, que domina o departamento de Santa Cruz (o mais rico da Bolívia, com reservas de hidrocarbonetos e extensos cultivos de soja), decidiu à mesma época redigir o Estatuto Autônomo de Santa Cruz. Intenção que já foi demonstrada por outros quatro departamentos: Pando, Beni, Tarija e, recentemente, La Paz.
"O que fizemos foi interpretar leis vagas e convocar uma Assembléia Autônoma Provisória. Além disso, estamos respaldados por 80% da população", disse em entrevista exclusiva Javier Limpias, constituinte do partido Podemos que participou tanto da nova CPE quanto da elaboração do estatuto de Santa Cruz.
Antagonismos
A atual constituição, no entanto, não reconhece as autonomias departamentais. Estas são criadas pela nova CPE, que também criou outras autonomias: provinciais, municipais e indígenas.
Aí começa o antagonismo das duas Cartas, já que o estatuto de Santa Cruz não reconhece os outros três níveis de autonomia.
Para a vice-presidente do MAS no departamento, Florinda Juchani, esse fato colocaria em risco o reconhecimento dos indígenas na nova CPE, que é considerado uma das principais conquistas do atual processo constitucional.
"Pode surgir desses estatutos um centralismo departamental", afirmou Juchani.
De acordo com Limpias, "os outros níveis de autonomia confundem e esvaziam a administração departamental".
Além da questão das autonomias, a maior queda-de-braço entre governo e oposição centra-se no manejo dos hidrocarbonetos. Cada qual, em sua Carta, outorga para si o direito de definir os rumos das ricas jazidas de gás e petróleo e dos impostos sobre os produtos.
Ante um cenário constitucional ilógico, os tribunais do país permanecem em silêncio, tanto em nível nacional quanto departamental.
Agora, "o povo é que vai decidir", como dizem as duas partes.
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