Brasil quer 'dar mais densidade' às relações com Cuba
"Desde que Fidel adoeceu, não houve muita densidade" nas relações entre os dois países, diz um diplomata brasileiro.
Lula faz a partir desta segunda-feira sua segunda visita a Cuba em seu governo.
Na primeira, em setembro de 2003, foi recebido no aeroporto por Fidel Castro, que também acompanhou o presidente na saída e declarou aos jornalistas que aquela era "a melhor visita" já recebida pelo país.
Fidel deve receber Lula na manhã de terça-feira, mas o encontro não foi confirmado pelas autoridades brasileiras porque depende do estado de saúde de Fidel.
Na opinião de diplomatas brasileiros, o encontro é certo, mas não é confirmado por precaução e porque os cubanos nunca confirmam os compromissos de Fidel com antecedência.
Chávez
Entre a primeira e a segunda visitas, Fidel adoeceu e se afastou da presidência e deixou o irmão Raúl Castro no cargo interinamente.
Neste tempo, as relações entre Brasil e Cuba não tiveram nenhum grande problema, mas, neste mesmo período, o presidente venezuelano Hugo Chávez aprofundou as relações com o líder cubano, com acordos de fornecimento de petróleo em troca de serviços médicos e de educação que ainda permitem a Cuba revender a preços de mercado parte dos 100 mil barris diários que recebe do país.
A realização ou não do encontro com Lula pode ser um indicativo do estado de saúde de Fidel e também do atual estágio das relações entre eles. Os dois líderes são amigos desde que Lula era sindicalista e foi visitado várias vezes pelo cubano quando estava na oposição.
Desde que se afastou do governo, em julho do ano passado, Fidel recebeu poucas visitas, a maioria delas de Chávez.
Investimentos
A viagem de Lula a Cuba, afirma o diplomata brasileiro, "é a primeira nesta nova circunstância". Ou seja, com a transição em curso.
Embora seja uma transição de proporções ainda indefinidas, porque foi coordenada por Fidel, o Brasil quer aproveitar a abertura da economia cubana para fomentar investimentos privados em infra-estrutura e no setor hoteleiro, de grande potencial no país, além do setor de energia, com a Petrobras.
"A economia cubana superou o período de dificuldades e tem crescido a taxas ao redor de 10%, o que abre oportunidades para desenvolvimento, investimento e parcerias", disse o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach.
"O governo brasileiro está atento ao desejo de investidores, de ampliar a sua presença em Cuba, e pretende fomentar o investimento naquele país."
Ao contrário da primeira viagem, quando os dois presidentes fizeram discursos em um fórum empresarial em Havana, desta vez a visita não será acompanhada por empresários brasileiros.
A visita é definida por integrantes do governo como "um gesto de amizade", mas o governo brasileiro também entende que "não basta falar, é preciso chegar com alguma coisa nas mãos".
Por isso, o interesse do Planalto em chegar ao país com vários acordos de cooperação e promessas de investimentos. A viagem estava inicialmente marcada para novembro e foi adiada porque os acordos que seriam assinados não estavam prontos.
Petróleo e alimentos
Agora, a viagem foi confirmada apenas na noite de terça-feira, e até o fim da semana os acordos ainda não estavam concluídos.
A Petrobras está estudando investimento em prospecção de petróleo no Golfo do México, em parceria com a estatal cubana de petróleo ou outras empresas estrangeiras, e pode também instalar uma fábrica de lubrificantes no país.
O governo brasileiro também já aumentou a linha de crédito para financiamento de exportações brasileiras de alimentos, para incentivar o comércio bilateral. Com o financiamento, o exportador tem garantia de que vai receber pelo produto vendido.
No ano passado, as exportações somaram US$ 255 milhões até outubro. Os principais produtos são açúcar, motores, óleo de soja, frango e café.
Neste mesmo período, o Brasil importou de Cuba US$ 31,6 milhões, sendo medicamentos, nafta para petroquímicas e cimento os principais produtos na lista.
Apesar das afinidades ideológicas e da amizade antiga entre Lula e Fidel, os dois estiveram em lados opostos nos últimos anos em relação ao etanol, justamente a menina dos olhos do presidente brasileiro, promovida em seus discursos no exterior como o produto capaz de tirar a África da miséria e ao mesmo tempo influir no aquecimento global.
O combustível já foi criticado por Fidel, que o considera uma ameaça à produção mundial de alimentos, inclusive em artigo na imprensa cubana. Lula respondeu que o problema da fome não é de produção de alimentos, mas de falta de renda para comprá-los e que o etanol pode ajudar justamente os países pobres a superar o problema.
Diplomatas brasileiros notam que o presidente cubano já não tem falado sobre o assunto e já esclareceu que era contra o etanol de milho – produzido nos Estados Unidos – e não contra o brasileiro, de cana-de-açúcar.
Jantar
O presidente Lula chega a Havana na noite desta segunda-feira, depois de participar na Guatemala da posse do presidente eleito Álvaro Colom, e será recebido em um jantar pelo presidente Raúl Castro.
Na terça-feira, Lula se encontra com o presidente da Assembléia Nacional, Ricardo Alarcon de Quesada, e novamente com Castro no palácio presidencial.
O encontro com Fidel ainda não tem horário confirmado, mas à tarde o presidente deve visitar o Centro de Engenharia Genética e Biotecnologia e a Escola Latino-Americana de Medicina (Elam), onde estudam ou estudaram cerca de mil brasileiros.
Viajam com o presidente o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, da Saúde, José Gomes Temporão, da Educação, Fernando Haddad, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, e o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que já chegaria ao país no fim de semana.
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