Comércio critica proposta de restrição a demissões
O projeto de lei estudado pelo governo federal que poderá acabar com as demissões por justa causa não ajuda os trabalhadores, na visão de Marcel Solimeo, economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo. "Quanto mais se enrijece a legislação para demitir, menos se estimulam as empresas a admitir", avalia.
Anteontem, depois da marcha dos sindicalistas em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou a ratificação da Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que trata das chamadas demissões imotivadas. O Brasil já havia assinado esse documento internacional, mas o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) retirou a adesão do país à convenção.
"Vai ter resistência. Na época de FHC, antes de ele denunciar o instrumento, o empresariado entrou com uma ação no STF pedindo a inconstitucionalidade do assunto", diz o secretário de Relações do Trabalho, Luiz Antonio Medeiros. Apesar da disputa no Congresso, o Ministério do Trabalho espera que os deputados e senadores confirmem a convenção no primeiro semestre do ano que vem.
Na prática, a grande mudança será que todo trabalhador demitido no país poderá contestar sua demissão. Ou seja, um tribunal decidirá se a rescisão de contrato foi justa e se cabe indenização. "No Brasil, as empresas trabalham com um horizonte de instabilidade, se uma medida dessa for aprovada, elas irão optar por aumentar horas extras de trabalhadores em vez de fazer novas contratações", diz Solimeo.
Novos direitos
Marcelo Cordeiro, sócio do escritório Pompeu, Longo, Kignel & Cipullo e professor de direito do trabalho da PUC-SP, afirma que hoje o trabalhador demitido sem justa causa já recebe compensações. "Há uma multa de 50% do fundo de garantia, ou seja, se o trabalhador tem R$ 100 mil, ele recebe R$ 40 mil de multa, e outros R$ 10 mil vão para o governo." Também podem ser contados como benefícios ao demitido a existência do aviso prévio e o seguro-desemprego.
Arthur Cahem, advogado trabalhista do Leite, Tosto e Barros Advogados, ressalta ainda que as medidas previstas na convenção da OIT chegaram a ser aplicadas no Brasil por sete meses e isso não surtiu bons resultados.
"Enxergamos com reserva essa proposta, porque no passado já foi uma experiência negativa e está fora da dinâmica empresarial de hoje."
Já Medeiros diz que a medida será boa, pois não poderá haver uma demissão apenas "porque o patrão não gosta da cara do empregado". "Se a empresa tem problemas financeiros, perdeu encomendas, se há uma recessão, são algumas razões. Precisará haver uma justificativa econômica."
Ele acrescenta que a rotatividade é muita alta no mercado brasileiro porque a Constituição proíbe a redução de salários, e as empresas, então, demitem funcionários para contratar trabalhadores com salários mais baixos. "Isso não quer dizer que o trabalhador vai passar a ter estabilidade no emprego. Não vai virar funcionário público, no bom sentido. O empregado vai ter de mostrar produtividade e desempenho."
Para Cahem e Cordeiro, a medida tira a autonomia das empresas de gerenciar os negócios, já que permitirá que um tribunal intervenha na administração privada e possa exigir que o funcionário seja readmitido ou receba uma indenização pela demissão.
Estabilidade
A CNI (Confederação Nacional da Indústria) afirma que o sistema jurídico do país afasta a possibilidade de estabilidade plena no emprego. Segundo a advogada da entidade Sylvia Lorena Sousa, o artigo 7º da Constituição prevê indenização compensatória nas demissões sem justa causa.
"Fora essa questão, achamos que esse não é o melhor mecanismo, pois incentiva a informalidade e não estimula o profissional a buscar seu aperfeiçoamento."
Solimeo ainda diz que o melhor meio de proteger o emprego é estimular a economia e reduzir a burocracia. "Com a convenção 158 sendo aplicada, se houver um período de expansão de mercado, o empresário não se sentirá seguro para fazer uma nova contratação."
Ele ainda diz que nenhum empresário sente prazer em demitir. "Você investe tempo e em treinamento, não há demissão sem motivos. Além disso, no comércio, existe o problema da sazonalidade. Como a empresa contratará temporários se depois não poderá demitir?"
Se for aprovada pelo Congresso, a medida ainda precisará ser regulamentada via projeto de lei. O governo terá um prazo de dois anos para isso.
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