Bebidas alcoólicas podem ter classificação alterada
A Casa Civil deve enviar em breve ao Congresso Nacional um projeto de lei que altera a classificação de bebidas para fins de publicidade, considerando como alcoólicas todas as que apresentarem teor de álcool maior que meio grau Gay-Lussac (GL), o que inclui cervejas e vinhos.
O projeto, que também proíbe a venda dessas bebidas nas estradas federais, é uma complementação à Lei 9294/96, que trata das restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros (cigarros), bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, e considera como bebida alcoólica apenas as que possuem teor alcoólico superior a 13 graus GL.
De acordo com a proposta elaborada pela Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), bebidas com teor de meio grau GL passariam a se sujeitar às regras da veiculação de publicidade, que só permitem a propaganda comercial de bebidas alcoólicas nas emissoras de rádio e televisão entre as 21 e as 6 horas.
"O projeto de lei está trazendo esse enfoque na definição da bebida alcoólica e uma posição do governo sobre a venda de bebidas alcoólicas nas rodovias federais", disse o secretário nacional Antidrogas, general Paulo Roberto Uchôa. Segundo ele, o abuso de álcool está por trás da maioria dos acidentes com vítimas, da violência doméstica e dos homicídios no país.
O 1º Levantamento Nacional sobre os Padrões de Consumo de Álcool da População Brasileira, elaborado pela Senad em parceria com a Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp) e divulgado em agosto, mostrou que os jovens entre 18 e 24 anos são os que mais bebem. A diferença em relação aos que têm 60 anos ou mais chega a ser 89% maior. Ainda de acordo com a pesquisa, a cerveja e o chope são responsáveis por metade das doses consumidas por adolescentes, e o vinho por 30%.
Sobre o uso de álcool ao dirigir, o levantamento mostra que dois terços da população pesquisada já dirigiram depois de consumir três doses de álcool ao menos duas ou três vezes no último ano, o que ultrapassa o limite legal permitido no Brasil, que é de 0,6 gramas de álcool por litro de sangue, de acordo com o Código de Trânsito.
O superintendente do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindcerv), Marcos Mesquita, critica o projeto de lei e diz que a restrição de horário para a publicidade das bebidas alcoólicas não funciona. Segundo Mesquita, da mesma forma que existem programas durante o dia que não são vistos por crianças e adolescentes e interessam aos anunciantes de bebidas alcoólicas, como os jornais matutinos e os programas de esporte, há outros vistos por crianças que são veiculados após as 21 horas. Mesquita deu como como exemplos os programas Casseta e Planeta e Altas Horas, da Rede Globo.
Segundo ele, seria mais "inteligente" utilizar o critério da grade de programação para definir o horário da publicidade de bebidas alcoólicas. " Se o interesse específico é a proteção a crianças e adolescentes, como tem sido dito, então a medida de restrição de horário não é a mais adequada. A medida mais adequada é ter um parâmetro voltado para a grade de programação", afirmou.
Mesquita também rebateu dados de pesquisas que apontam aumento no consumo de bebidas alcóolicas entre os jovens das escolas públicas brasileiras. Ele citou dados do 5º Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas em Estudantes do Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública de Ensino em 27 capitais brasileiras, realizada pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) em 2004. A pesquisa mostra que o nível geral de dependência de álcool foi de 12,3% da população em 2004. Em 2001, esse percentual era de 11,2%. Para Mesquita, a diferença não é relevante para afirmar que houve um aumento no consumo de bebida alcoólica.
Ele acredita que as implicações da restrição de bebidas deverão reduzir o valor de mercado dos produtos, mas não o volume de vendas. Como exemplo, citou o fim da propaganda de cigarros, que não reduziu o percentual de consumo do produto. "É falsa a informação que tenho lido, tanto do Ministério da Saúde quanto da Secretaria Nacional Antidrogas, de que se reduziu o consumo de cigarros de 2000 para cá. Os dados da Receita Federal e das próprias indústrias indicam o contrário", afirmou.
Segundo ele, o que aconteceu de fato, e pode se repetir no caso das bebidas alcoólicas, é que as marcas de cigarro que dependiam de publicidade tiveram perda de 15% do volume de vendas, mas as pequenas marcas cresceram 29%. "As grandes empresas têm folga de caixa o suficiente para conviver com marcas baratas, e as pequenas não têm. Então, essas empresas tendem a desaparecer, mas, antes disso, vão para a informalidade. Então, o Estado perde impostos, e a sociedade perde o retorno disso", enfatizou Mesquita. "A medida trará certamente prejuízos, mas, para a finalidade que se espera, é absolutamente zero o resultado", completou.
Quanto à proibição da venda de bebidas alcoólicas nas estradas federais, o representante dos empresários da cerveja disse que já há leis suficientes no Brasil para exercer um controle severo sobre o consumo abusivo de álcool, mas pouca fiscalização.
De acordo com o general Uchôa, se for aprovada, a fiscalização da nova lei será feita pela Polícia Rodoviária Federal, pelos órgãos policiais e até mesmo pelos cidadãos. "É muito importante que haja consciência da sociedade de que cada indivíduo é um fiscal em potencial. Ele deve também ajudar o governo a denunciar na hora em que perceber alguém que esteja infringindo a lei".
O general disse que, se uma pessoa estiver transitando numa estrada federal e vir o que está se passando (no caso, alguém vendendo bebida alcoólica), deverá fazer uma denúncia no primeiro posto da Polícia Rodoviária Federal que encontrar.
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