Falta de clínicas impede aplicação da Justiça Terapêutica
O Juizado Especial Criminal do Centro, cujo titular é o juiz Mário Kono de Oliveira, recebe em média 400 novos processos por mês. Destes, pelo menos 50% são de crimes em que o agente cometeu delitos por consumir algum tipo de substância entorpecente. No entanto, o juiz tem dificuldades em aplicar a Justiça Terapêutica porque em Mato Grosso, praticamente não há opções de locais para tratamento dos reeducandos dependentes químicos. A situação se agrava quando o dependente químico é do sexo feminino.
Hoje, a justiça terapêutica faz parcerias com entidades assistenciais e religiosas como Alcoólicos Anônimos, Amor Exigente, Chácara Peniel (mantida por evangélicos) e outros. Entre as entidades públicas disponíveis na capital está o Centro de Atendimento Psicossocial a Álcool e Drogas (CAPS-AD).
No entanto, a maioria destas instituições atende apenas ao público masculino. Não há em todo o Estado, segundo o magistrado Mário Kono, um único local específico, instalado e mantido pelo poder público, para a desintoxicação e recuperação de mulheres.
A preocupação do magistrado em encontrar um local com estas características no Estado de Mato Grosso se justifica porque tem aumentado, no Juizado Especial Criminal, o número de casos de mulheres envolvidas com drogas e que praticam algum tipo de delito para manter seu vício.
"Os homens dependentes químicos são 90% a mais em relação às mulheres, mas a demanda vem crescendo. Não há aparato como psicólogos, psiquiatras, enfermeiros para atender a essas pacientes. Em Cuiabá elas são encaminhadas ao Adauto Botelho e ficam junto com as que têm problemas mentais. Não é um local adequado para o tratamento", afirmou o juiz. Nos casos mais graves, o magistrado determina a internação da paciente em clínicas fora do Estado.
A preocupação do Poder Judiciário em promover a ressocialização e reinserção social dos dependentes químicos começou muito antes da aprovação da Lei 11.343/06, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad). Há muitos anos o magistrado atua junto ao Juizado Especial Criminal em busca de parcerias para recuperar os réus que são dependentes químicos.
Este mês, por exemplo, foi oferecido um curso de profissionalização para os pacientes do Anexo 3 do Ciaps Adauto Botelho, que foram encaminhados pelo magistrado. O curso foi uma parceria com o Centro Integrado de Atenção Psicossocial Adauto Botelho (Ciaps) e a Fundação de Apoio à Educação e ao Desenvolvimento Tecnológico de Mato Grosso (Fundetec).
UM ANO DA LEI DE DROGAS – A Lei no 11.343 foi promulgada em 23 de agosto de 2006 e, portanto, completa um ano nesta quinta-feira. Além de instituir o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, ela prescreve as medidas para a prevenção do uso indevido, a reinserção social dos usuários e estabelece normas para a repressão do tráfico.
Para a justiça, segundo o dr. Mário Kono, a nova norma criou 'respaldo legal', mecanismos para agilizar as ações, separando as formas de punição de usuários e traficantes, por exemplo. Ele ressaltou que o usuário que tenha cometido delito em razão da droga, pela nova legislação, deve ser advertido sobre seus efeitos e recebe medidas educativas ou penas alternativas de prestação de serviços. O que não ocorre com o acusado preso por tráfico.
Os casos de prisão pelo tráfico ilícito de drogas são atendidos especificamente pela Vara Especializada de Delitos de Tóxico, em Cuiabá, cuja titular é a juíza Maria Cristina de Oliveira Simões. E as penas previstas são privativas de liberdade, que podem chegar a quinze anos de reclusão.
Para determinar se a droga apreendida destina-se ao consumo pessoal, com a lei 11.343, caberá ao juiz observar a natureza do crime, a quantidade do entorpecente, a verificação do local e das circunstâncias da ação, bem como os antecedentes do agente (artigo 28 §2o).
O juiz Mário Kono lembra que a Lei determina que o Estado e a União realizem investimentos para o tratamento dos chamados 'drogaditos' e também o tratamento dos presidiários (aqueles condenados a cumprir pena privativa de liberdade), com local adequado para o tratamento definido pelo sistema penitenciário (artigo 26).
O artigo 22 da mesma lei determina ainda: o respeito ao usuário, independente de quaisquer condições; a reinserção social dos mesmos e seus familiares, a adoção de estratégias diferenciadas para essa reinserção, a definição de projeto terapêutico individualizado e outros.
Porém, segundo o magistrado, neste primeiro ano de vigor da nova legislação, pouca coisa foi feita em relação às melhorias da estrutura voltada para a reinserção do reeducando.
SEMANA DA RESSOCIALIZAÇÃO - O Poder Judiciário busca avançar nas questões relacionadas à ressocialização e vai realizar na próxima semana, a I semana estadual ‘Construir Cidadania’ em parceria com o Governo do Estado.
As ações fazem parte do Projeto RecuperAção da Corregedoria Geral da justiça e visam fortalecer as instituições de assistência e de recuperação, revitalizar os programas de assistência à família do reeducando e também dos agentes penitenciários até fevereiro de 2009.
O Corregedor Geral da Justiça, desembargador Orlando de Almeida Perri, as magistradas das varas criminais de Várzea Grande, Selma Rosane Arruda e Maria Erotides Kneip Baranjak, e outros juízes e autoridades participarão do seminário a ser realizado e vão proferir palestras na programação da semana da ressocialização.
O evento será aberto aos profissionais da área e a toda população. Dele deve sair uma carta de compromisso entre os poderes Judiciário, Executivo e Legislativo para a realização de ações junto ao sistema penitenciário do Estado.
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