Personagens de época aumentam carga de trabalho de atores

Rotina de protagonista é difícil, mas quando o trabalho é de época, a situação piora. E muito. Ao se preparar para interpretar a mocinha Nina em Eterna Magia, Maria Flor sabia que teria um longo processo de composição, mas não imaginava o quão trabalhoso seria. Além das diversas aulas de piano, equitação e dança irlandesa, a jovem dedicou várias horas por dia aos exercícios de expressão corporal e à fonoaudióloga.

Tudo para marcar as características da década de 40 e definir bem a mudança de postura da personagem na segunda fase da trama. "Além da preocupação com o registro da época, passam-se sete anos. Buscamos um tom mais grave na voz para transmitir a maturidade e a delicadeza do período", explica atriz.

Apesar de retratar períodos históricos, as produções de época muitas vezes não se preocupam tanto com pequenos detalhes. Para Paloma Riani, preparadora corporal do elenco de Amazônia - De Galvez a Chico Mendes, o objetivo é se aproximar das características do período retratado, mas não documentar. Segundo ela, uma das partes mais importantes do processo é a prosódia - estudo das variações da fala. "Não basta parecer com a época, tem que soar natural. Controlando a velocidade da voz é mais fácil controlar o corpo", opina.

Paola Oliveira concorda. Em seu segundo papel na tevê, a atriz ganhou a função de protagonizar o "remake" de O Profeta, que transcorria na década de 50. Passado o frio na barriga por causa da responsabilidade, a jovem entrou de cabeça na preparação e começou a se preocupar com algo que a afligia desde que viveu a Giovana, em Belíssima. "Precisava descer um pouco o tom da voz, ficar mais grave. Eu não queria falar como uma adolescente chata no ar", avalia, completando que os estudos deram um ar seguro à Sônia, sua personagem na história.

Na época, Paola contou com a ajuda das fonoaudiólogas Leila Mendes e Maria Sílvia Siqueira Campos. A primeira dava apoio ao elenco da novela. Já a segunda era contratada pela própria atriz. "A métrica do texto de época é diferente. Os jovens falam rápido e com gírias. Se o trabalho não fica bem feito, o resultado se torna caricato", avalia Maria Sílvia, que atualmente exerce a função com o elenco de Eterna Magia.

A fonoaudióloga trabalhou esse lado também com Irene Ravache, que interpreta a ranzinza Loreta na atual novela das seis da Globo. Além de marcar as características da época, que começa antes de Segunda Grande Guerra e continua no período pós-guerra, a intenção era dar um ar raivoso e rude à personagem. "O tom de voz da Loreta precisava ser totalmente diferente do que a Irene usava na Katina, em Belíssima", explica.

Helena Varvaki, que auxilia Maria Flor nos conceitos de movimentação de Nina, esclarece que o trabalho começa com a busca iconográfica do período e, depois, a definição de como cada personagem vai usar as mãos, sentar e até mesmo escolher a melhor posição para o cotovelo. Para determinar as características de cada época, os profissionais pesquisam filmes, fotos, revistas, livros e jornais antigos, entre outras coisas. "Os exercícios interligam as características e transformam o resultado no comportamento de cada um", explica. Bianca Comparato também precisou de Helena, mas para uma época mais próxima. A atriz interpretou a cantora Elis Regina no especial "Por Toda a Minha Vida", transmitido pela Globo. "Trabalhamos muito por cenas que ficaram poucos minutos no ar", lembra-se Helena.

A preparação muitas vezes conta com elementos especiais. Na Band, o elenco de Paixões Proibidas precisou de um detalhe a mais na hora de gravar cenas de ação. Por se passar no início do Século XIX, a espada entrou na maior parte dos conflitos entre os personagens. O professor de esgrima Renato Rocha assessorou a equipe. "Fizemos aulas voltadas para a esgrima artística. A postura durante a luta acabou ajudando na forma de agir dos personagens", diz o mestre, que também exerce o trabalho para espetáculos teatrais. Em Amazônia - De Galvez a Chico Mendes, exibida recentemente pela Globo, parte do elenco precisou aprender a lavar roupa em um rio para gravar cenas da minissérie.

Por conta própria Apesar de toda a ajuda que recebem das emissoras, muitos atores e atrizes acabam optando por meios alternativos de encontrar o melhor caminho para a interpretação de seus personagens. Juliana Baroni e Carol Castro, por exemplo, aumentaram suas coleções de filmes antigos antes de viverem a espevitada Míriam e a malvada Ruth em O Profeta, respectivamente. "Fiz aulas de dança, mas os longas antigos me ajudaram mais. Assim eu criei uma identidade da época e trabalhei as características em cima da minha personagem", diz Juliana.

Thiago Lacerda se diz um homem estudioso e, sempre que ganha um personagem de época, aproveita para pesquisar por conta própria detalhes que possam ajudar na composição. Os livros e a Internet são as maiores fontes de informação para o rapaz. "Me encantam os papéis que dependem de um interesse mínimo de costumes, comportamento e de uma série de outras coisas que eu gosto", fala. Dalton Vigh concorda, mas para ele outro fator é decisivo na hora de caracterizar personagens de eras passadas. "O figurino é minha grande arma. Quando visto aquelas roupas pesadas, me transformo em outra pessoa na mesma hora", explica.

Instantâneas

# Na época em que gravava Cabocla, a então estreante Vanessa Giácomo precisou de uma preparação especial por conta do excesso de cenas que fazia em cozinha. Para isso, a atriz teve instruções sobre como usar talheres antigos e cortar e cozinhar os alimentos em cena. # Mesmo fora do ar, Paola Oliveira continua praticando exercícios vocais para conhecer melhor seu potencial. "É como freqüentar a academia. Se você não vai, o corpo reclama de início e se acomoda depois", brinca.

# Além de todas as aulas de prosódia, postura, etiqueta e dança, Carol Castro dedicou seu tempo aos treinos de tênis em O Profeta. Na sinopse original, a jovem má praticava o esporte na década de 50. Mas, por falta de tempo e espaço, essa característica acabou esquecida na segunda versão.