Gravação aponta falha de pilotos em colisão aérea no Nortão
A transcrição original em inglês da caixa-preta do Legacy mostra que Lepore e Paladino não estavam confiantes no vôo inaugural do jato. Expressaram falta de familiaridade com equipamentos, 'medo' de cometer erros e desconhecimento de informações operacionais do vôo em diversos momentos do diálogo que antecedeu o acidente do dia 29 de setembro de 2006, que deixou 154 mortos.
No relatório parcial da investigação aeronáutica do acidente, o Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) anunciou como um dos próximos quatro pontos focais de apuração o 'conhecimento e preparo previstos aos pilotos do N600XL [nome do Legacy] para a realização do vôo no Brasil'.
O treinamento dos pilotos para operar o Legacy era uma obrigação contratual da Embraer. Ambos passaram pela academia americana FlightSafety no mês de agosto, em que obtiveram proficiência. E receberam instrução adicional da Embraer em setembro em São José dos Campos (SP) --inclusive no uso de um software instalado no laptop de Lepore para cálculos de desempenho de vôo, como peso e equilíbrio.
Quando o transponder parou de funcionar, às 16h02 (horário de Brasília), estavam justamente fazendo esses cálculos. Não se sabe ainda o que levou o transponder a ficar inativo, mas há consenso de que não foi proposital. Sem ele, os controladores não sabiam a altitude real do avião, e o TCAS (alerta anticolisão) não funciona.
O aviso na cabine de inoperância dessa linha de transponder também foi considerado precário, e o FAA (Administração Federal de Aviação, na sigla em inglês) nos Estados Unidos já recebeu recomendação de segurança da NTSB (National Transportation Safety Board, a agência de segurança de vôo dos EUA) para alertar todos os pilotos sobre isso e pedir mudanças no aparelho.
Ambos os pilotos são licenciados para voar em aeronaves Embraer-145 e já afirmaram --em entrevista à Folha em dezembro do ano passado-- que estavam familiarizados com o avião. Mas, nesse vôo, expressaram dificuldades com: cálculo do centro de gravidade, o uso do FMS (Flight Management System, gerenciador de dados de vôo), acesso a dados meteorológicos e cálculos de peso e queima de combustível do avião. Falam várias vezes sobre 'ler o livro' ou ter o livro, referências a manuais técnicos.
São justamente essas questões que dominam a conversa na cabine durante praticamente todo o período no qual ficaram sem se comunicar por rádio com o centro de Brasília.
Em fevereiro, a Folha publicou reportagem com trechos da tradução dos diálogos dos pilotos que foi entregue à Polícia Federal e revelou que os pilotos tiveram problemas com equipamentos, como o FMS .
A Folha obteve agora a íntegra da transcrição original em inglês feita pelo NTSB, que identifica de quem são as vozes citadas como Hot-1 e Hot-2 e mostra que há imprecisões na tradução já realizada.
A transcrição foi realizada por investigadores do NTSB e FAA, com participação da ExcelAire. Na capa, um aviso de que trechos isolados ou fora de contexto podem induzir a conclusões equivocadas.
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