Divisão do Ibama provoca paralisação dos servidores a partir de 2ª
A primeira secretária do Sindicato dos Servidores do Ibama em Mato Grosso, Almira Arruda, disse que os afazeres “essenciais” da instituição serão mantidos como se houver fogos em unidades de conservação, processos administrativos e manutenção de anilhas (controle de aves).
A paralisação já ocorria em quatros estados e no Distrito Federal. O protesto começou em Manaus, no Amazonas.
Há duas semanas, o governo anunciou a reestruturação do Ministério do Meio Ambiente, que incluiu a divisão do Ibama. A mudança deu origem ao Instituto Chico Mendes, que ficará responsável pelas unidades de conservação da natureza e por programas de pesquisa da biodiversidade. Já o Ibama ficará responsável pela concessão das licenças ambientais.
“A criação de outro instituto é cruel ditatorial”, protestou Almira Arruda, que divulgou na tarde desta sexta-feira uma carta que debate a questão.
A presidente da Asibama-DF (Associação dos Servidores do Ibama no Distrito Federal), Lindalva Cavalcanti, disse a imprensa nacional que a divisão do Ibama representa uma "quebra" da administração da gestão ambiental, conquistada em 1989 com a criação do instituto.
"O governo vem com essa conversa de que vai fortalecer [a gestão do meio ambiente], mas na verdade vai enfraquecer. Agora, a fiscalização ambiental ficará restrita ao que o Ibama licenciar", afirmou Lindalva.
Veja o comunicado divulgado nesta sexta pelo sindicato dos servidores do Ibama de Mato Grosso
CARTA ABERTA À SOCIEDADE
A gestão ambiental no Brasil iniciou-se ainda na década de 60 de maneira fragmentada, sem considerar o meio ambiente como um todo. Foi nessa época que surgiram o Código Florestal (1965), o Código de Caça, de Pesca, e de Mineração (1967).
Na década de 70, após os vários movimentos ambientalistas e populares, foi criada a Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA, subordinada ao Ministério do Interior, pelo Decreto Federal nº 73.030/73, apontada pelos pesquisadores muito mais com fins administrativos que realmente gestor.
Somente na década de 80 é aprova a Lei 6.938/81, que criou a Política Nacional do Meio Ambiente - PNMA, inaugurando uma fase holística, na qual o meio ambiente passa a ser tratado de maneira integral com autonomia valorativa (bem jurídico) e com garantias de implementação (acesso ao judiciário). Era o fim do modelo fragmentário, introduzindo instrumentos importantes no ordenamento jurídico nacional à proteção do todo. É nessa ocasião que surgem a necessidade do Estudo Prévio de Impacto Ambiental, os regimes de responsabilidade civil objetiva para o dano ambiental e, um pouco mais tarde, a legitimação do Ministério Público para agir em matéria ambiental.
Foi através dos objetivos da PNMA que se introduziu a mentalidade de compatibilização do desenvolvimento econômico social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, da definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico, do estabelecimento de critérios e padrões da qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais, do desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais, da difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, da divulgação de dados e informações ambientais e da formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico, da preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida, e, finalmente, da imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação em recuperar e/ou indenizar os danos causados, e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
É ainda sobre a égide da PNMA que é instituído o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), e são definidos os instrumentos da política (os padrões de qualidade ambiental, o zoneamento ambiental, a avaliação de impactos ambientais, o licenciamento ambiental, a criação de espaços territoriais especialmente protegidos, etc).
A proteção ambiental no Brasil só ganha acesso aos sistemas constitucionais a partir da década de 80, e tem na Constituição federal de 1988, em seu capítulo VI, Art. 225, a definição do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum a todos os cidadãos e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Com a experiência norteada na fragmentação, observou-se que a gestão ambiental só seria efetiva caso fosse tratada de forma unificada e integrada, uma vez que o meio ambiente é multidisciplinar, é complexo, e precisava de decisões conjuntas para sua execução. Nesse momento, através da Lei nº 7.804/89, a Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA é substituída pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, criado pela Lei nº 7.735/89, incorporando outras três instituições: a Superintendência da Borracha (SUDHEVEA), o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) e a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca – SUDEPE. Dessa forma, pela primeira vez, uniu-se a proteção do meio ambiente sobre a bandeira do desenvolvimento sustentável.
A PNMA foi fortalecida por uma série de legislações posteriores e Resoluções CONAMA com finalidade de propor medidas preventivas para garantir a real qualidade de vida a todos e a conservação do patrimônio natural. Outras políticas foram surgindo e, junto a elas, foi sendo observada a necessidade cada vez maior da integração.
Não existe fauna sem vegetação e sem água; não existe agricultura, sem solo e sem água; não existe água sem vegetação, sem solo, sem ar, que por sinal dependem das florestas. É preciso unir os diversos recursos naturais, seus usos, seus conflitos, para se obter as soluções. Não existem áreas conservadas para um entorno degradado.
As inúmeras ações de planejamento ambiental sempre resultam em necessidade de integração de seus vários sistemas: recursos vegetais, recursos faunísticos, recursos hídricos, recursos atmosféricos, uso e ocupação do solo, e vários outros.
E é com pesar que hoje, lamentavelmente andando na contramão da história, o Governo eleito DEMOCRATICAMENTE pelo POVO, decide, de forma semelhante aos velhos tempos da DITADURA, editar, com conhecimento de meia dúzia de pessoas, uma Medida Provisória (MP nº 366/07) de características retrógradas, baseadas nos princípios da economia desenvolvimentista, com objetivos tão somente políticos e econômicos.
Problemas? Todas as instituições públicas os têm. O IBAMA foi criado com a junção de 4 instituições com funcionários voltados a atividades diferentes, que “caíram de pára-quedas” numa nova estrutura, com objetivos técnicos diferentes, sem receberem instrução e treinamento adequados. A inexistência de normativas técnicas gerou erros que foram sendo sanados através dos anos, sem, entretanto, ter respaldo desse mesmo governo em investimentos em pessoal técnico (ambiental e administrativo), em tecnologia da informação, em treinamentos constantes, em recursos financeiros e em artefatos tecnológicos (laboratórios regionais, equipamentos diversos, softwares, etc).
Como darmos conta de um território tão grande como o Brasil sem carros, sem manutenção dos carros, sem combustível para os carros...? Como darmos conta em estar no norte e no sul, no leste e no oeste, se não temos servidores suficientes para as tarefas? Como darmos conta de tudo isso se não temos diárias para comer e dormir (e olha que muitos, por amor à causa, pagam do próprio bolso!)? Como enfrentarmos pistoleiros sem equipamentos de segurança, sem uma equipe de apoio? Como continuarmos a acreditar na seriedade daqueles que dirigem nosso país?
Em 18 anos de existência, essa é a segunda vez em que é realizado um concurso público para provimento de vagas. Neles entraram profissionais de competência inquestionável, mas deslocados de suas funções e subutilizados por falta de planejamento administrativo. Foram concursos sem restrições para ingresso nas áreas técnicas que geraram uma desproporcionalidade no número de profissionais de uma determinada área enquanto outras ficaram deficientes. Somando-se à inexistência de concursos para a área administrativa (a que chamamos área meio), somos obrigados, engenheiros, biólogos, oceonógrafos, geógrafos, agrônomos, entre outros, a desempenharmos funções na administração, no financeiro, no RH sem termos conhecimentos básicos para as atividades e, o que é pior, nos submetermos à frustração de entrarmos num órgão com o interesse de trabalhar com meio ambiente e acabarmos atrás de uma mesa sem nada podermos realizar de concreto, e com risco de respondermos administrativamente por erros gerados por desconhecimento da função.
Quanto às famosas acusações de demora na emissão de autorizações, o que se tem a falar quando temos empresários que, seja por ingenuidade, seja por esperteza, ora não cumprem com suas condicionantes, ora não entregam suas pendências nos prazos previstos, ora as entregam com os mesmos conteúdos já rejeitados anteriormente, ora entregam as pendências de forma ‘homeopáticas’? Visto a necessidade de vistoria desses empreendimentos para liberação de autorizações, como ir a campo sem termos recursos?
São anos de sucateamento da instituição, porque ‘florzinhas’ e ‘bichinhos’ não são de interesse para a economia, são apenas empecilhos ao desenvolvimento do país. Porque bom é produzir soja, criar boi, liberar indústrias poluentes, hidrelétricas caducas e aumentar nosso PIB, fazendo vistas grossas para parte dessas áreas ocupadas resultante de ações lesivas.
Não se pode (nem se deve) esconder os inúmeros casos de corrupção tão questionados por vários segmentos da sociedade, mas a questão é que atire a primeira pedra aquele órgão público que nunca teve em seus quadros funcionários que tenham pecado contra o bem público. Infelizmente, temos que dar nossas “mãos à palmatória” porque não conseguimos nos ver livre de indivíduos sem escrúpulos. Temos muito a agradecer pela ação da Polícia Federal e do Ministério Públicos na tentativa de bloquear as atividades ‘lesivas ao nosso meio ambiente’. E contaremos sempre com esses nobres colegas na tentativa de obtermos respeito e credibilidade junto à sociedade.
Ao invés de desejar acabar com o IBAMA (como foi expresso), por que não reconhecer os inúmeros projetos idealizados e tão bem sucedidos? As ações do nosso grupo do Núcleo de Educação Ambiental junto às comunidades, a repressão conta os crimes pelos nossos fiscais, os cuidados e as licenças emitidas para inúmeros empreendimentos importantes para o país pelos nossos técnicos do licenciamento ambiental? São anos de ‘cabeças quebrando’ para definir se esse ou aquele é o melhor meio de ação, se essa ou aquela é a melhor forma de procedimento, para que, depois de quase 1 ano e meio de discussão, de apontamento de problemas e soluções na elaboração de uma proposta de um regimento interno, sem qualquer RESPEITO sermos surpreendidos por uma MP que só resultará na multiplicação dos problemas em 2 versões, no inchaço da máquina pública, no gasto desnecessário com novas aquisições patrimoniais, instalações prediais, pessoal, etc.
O que é detectado no IBAMA como seu principal problema é a falta de planejamento, de investimento em novas tecnologias e em aperfeiçoamento pessoal, em recursos financeiros e humanos. A reestruturação da instituição deveria ser prioridade para qualquer saneamento de problemas, de vícios funcionais e administrativos, mas, ao contrário da lógica, preferiram criar mais um Instituto (por ironia à memória daquele que sempre respeitou as vias democráticas – Chico Mendes) mantendo a mesma estrutura (ou melhor, desestrutura) falida, viciada.
Ao contrário do que vem divulgando, essas duas instituições não têm como tomar decisões de forma individual, exigindo acordos de cooperação, grupos técnicos de discussões interinstitucionais, etc. Onde está a dinamização e a maior eficiência da gestão ambiental? Isso só vai servir para um propósito: o aumento na demora das análises e da burocracia do Estado.
A fragmentação do órgão ambiental federal nada mais é do que uma primeira etapa para impedir que a ação de controle ambiental empeça a liberação de empreendimentos altamente nocivos ao meio ambiente e ao bem-estar da população, daquilo que se consideram obras prioritárias para o governo e grandes empreiteiras. É prudente destacar que tais medidas só tende a diminuir cada vez mais a força que hoje o IBAMA ainda possui em preservar nossos já escassos recursos naturais, que só continuarão ‘renováveis’ se unirmos forças para barrar aquilo que consideramos a DECADÊNCIA da Política Nacional de Meio Ambiente.
A segunda etapa dessa DECADÊNCIA poderá ser a fragmentação da gestão ambiental dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
Portanto, nós, servidores do IBAMA, convictos do futuro sombrio que se profetiza para nosso meio ambiente, convidamos a população e os diversos segmentos da sociedade civil organizada a combaterem conosco esse ACIDENTE DE PERCURSO, referendando nossa manifestação de repúdio à MP nº 366/07, dizendo não à fragmentação da PNMA e enfraquecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente, e por uma gestão ambiental integrada e forte em nosso país.
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